"Trabalhei em equipas maioritariamente masculinas, mas nunca me senti em desvantagem"
As palavras são de Ana Rita Gomes, atual Board Member da Multicare, que vê nas medidas de equilíbrio entre vida pessoal e profissional uma das ferramentas para atingir a paridade de género nas empresas.
Desde 2014 que não pára de aumentar o número de comunicações de não-renovação de contratos a mulheres grávidas ou a pais em licença parental, que atingiu o recorde em 2020 - foram 2107 episódios, um aumento de 20% em relação ao ano anterior. Os dados são da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE) e espelham as dificuldades económicas causadas pela pandemia, mas também o obstáculo adicional que é, muitas vezes, colocado às trabalhadoras na sua vida profissional. "Creio que [o equilíbrio entre vida pessoal e profissional] é cada vez mais transversal a homens e mulheres, mas, como sabemos, é algo mais associado às mulheres", observa Ana Rita Gomes em conversa com o DN.
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Atualmente ocupa o cargo de Board Member da Multicare, do grupo Fidelidade, e diz nunca se ter sentido prejudicada, a nível laboral, com base no seu género. "Trabalhei em equipas maioritariamente masculinas, mas nunca me senti em desvantagem", afirma. Ainda assim, reconhece, existem melhorias a fazer quando o assunto é a paridade de género nas organizações. "Quando estive a trabalhar fora de Portugal por dois anos e o meu marido estava em Portugal, queria ter um bebé e, obviamente, esse equilíbrio trabalho-família foi complicado", recorda. E aponta que, por várias vezes, a questão da gravidez foi abordada em entrevistas de emprego. "Achei muito despropositado perguntarem-me logo se queria ter filhos e como iria gerir essa situação. Questionava-me se também perguntariam o mesmo a um homem", lamenta.
O destino acabaria por encaminhá-la para a Multicare, onde a natalidade era vista como uma conquista pessoal e um passo natural na vida de qualquer trabalhador. "Expus a minha situação e disse que a gravidez podia ocorrer a qualquer momento e que não queria que isso pudesse ser mal interpretado se ocorresse pouco depois da minha entrada", conta. A resposta, diz, "não podia ter sido mais convincente": "Responderam-me que eram grandes defensores da natalidade, que iria trabalhar com uma administradora que teve cinco filhos e que ia adorar." Entretanto passaram cinco anos, a gravidez aconteceu e, ainda assim, Ana Rita Gomes continuou a subir na hierarquia da seguradora. Começou como Business Development Manager Healthcare, tendo sido promovida, quatro meses mais tarde, a responsável máxima por essa área. Assumiu a atual posição em dezembro.
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Para a especialista em gestão, as organizações devem ter em conta duas medidas essenciais para apoiar a progressão profissional de todos os seus colaboradores: garantir o equilíbrio entre família e trabalho e "dar ferramentas que impulsionem a autoconfiança das mulheres". "Acho muito importante capacitar as mulheres para terem essa autoconfiança e poderem atingir a gestão de topo", defende. A este propósito lembra a sua participação na primeira edição do projeto Promova, criado pela CIP com a Nova SBE, "onde existe um coach profissional, mas também um mentor", que dão "um boost de confiança" às formandas. "O programa [de formação] tinha mulheres com experiências incríveis e com grande formação. Essa riqueza de discussão é superimportante", sublinha.
Ana Rita Gomes acredita que o exemplo é importante para as jovens raparigas poderem ambicionar atingir cargos de liderança, pelo que olha "com tristeza" para o facto de existirem apenas 60 mulheres entre os 174 cabeças de lista às próximas eleições legislativas. "Mostra o caminho que ainda temos de percorrer", diz. Apesar da falta de representatividade no Parlamento - casa onde foi aprovada a lei de quotas -, a gestora defende que "as mulheres têm de querer participar na vida ativa cívica" e que "os bons exemplos atrairão, depois, outras".
Continuar a progredir na inclusão
A diversidade é, muitas vezes, apontada como um ativo importante para as organizações e a Multicare é uma dessas empresas. De acordo com Ana Rita Gomes, a seguradora terminou, recentemente, um diagnóstico de diversidade e inclusão para avaliar o seu desempenho nesta matéria e a conclusão foi a de que não existem "problemas de diversidade de género". "Fui ver os últimos dados e em três anos aumentámos o peso das mulheres de 35% para 42% em cargos de gestão de topo no grupo", confirma ao DN. Apesar de ainda não ter sido atingida a paridade, o grupo de seguradoras acredita que será possível atingi-la "em breve" com uma "evolução sustentada".
Um dos próximos passos do grupo será a inauguração de uma nova sede que juntará todos os colaboradores no mesmo espaço, que será também inclusivo. "Uma das coisas que vai ser incluída é uma sala de amamentação", adianta a gestora. Passo a passo, o caminho rumo à paridade vai sendo percorrido para que a empresa reflita "esta diversidade que queremos ter" e que não se esgota no género.