O novo ano judicial começa hoje, mas os problemas do setor já são antigos. Os discursos na cerimónia às 15:00 tendem a ser semelhantes aos do ano passado, assim como os protestos do lado de fora do prédio do Supremo Tribunal de Justiça. Haverá novamente uma manifestação silenciosa convocada pelo Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ). “O problema é o mesmo de há 20 anos. Há discursos infinitos, há promessas, há inclusive documentos aprovados na Assembleia da República, mas depois, quando vamos a ver na prática nada se faz. Vamos aproveitar a sessão para manifestarmos a nossa indignação pelo pronuncio de morte da carreira”, diz ao DN António Marçal, presidente do SFJ. Para esta abertura do novo ano judicial, além do sindicato dos funcionários judiciais, o DN ouviu outras quatro entidades sindicais do setor da justiça. Cada classe tem os seus próprios problemas e exigências, mas todos concordam que, ano após ano, os desafios são os mesmos e passam por questões como falta de recursos humanos e materiais, que acabam por interferir no resultado do trabalho, como a celeridade da justiça e o atendimento aos cidadãos. . Nuno Matos, presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP), afirma que 2025 será um ano “decisivo em vários casos mediáticos”, em que o tempo de resolução dos casos é sempre um assunto na opinião pública. “O sistema de justiça terá o desafio de conseguir dar resposta adequada a estes casos/processos, não esquecendo que a desejável velocidade de resolução dos megaprocessos encontra obstáculos inevitáveis (por ex., a complexidade da realidade que lhes está subjacente), não existindo fórmulas mágicas para alcançar tal resolução, embora seja possível ponderar a adoção de medidas de gestão processual e a introdução de pontuais alterações legislativas, para conferir celeridade e eficácia ao sistema de justiça e, nessa medida, ajudar à resolução de tais casos/processos”, explica o juiz desembargador, referindo-se à celeridade. Segundo Matos, é necessária a intervenção de recrutamento de magistrados, implementação das assessorias e estatuto socioprofissional dos juízes e autonomia administrativa e financeira dos tribunais.Esta mesma autonomia financeira é citada por Paulo Lona, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP). “A nossa autonomia financeira é muito limitada”, frisa, o que leva à limitação de serviços, além da já conhecida falta de profissionais. “Preocupam-nos as faltas de magistrados, a falta de oficiais de justiça, que é tremenda atualmente, e que está a causar graves transtornos no funcionamento do sistema de justiça” analisa. Paulo Loma ainda cita “questões básicas” no ambiente de trabalho, como sistemas informáticos, necessidade de redes de internet estáveis nos tribunais. “Na era da inteligência artificial ainda temos coisas básicas que falham em Portugal”, argumenta.No caso dos oficiais de justiça, o novo ano judicial começa com a continuação da greve iniciada a 10 de janeiro de 2023. Em causa está a negociação do estatuto desta classe profissional. “Se calhar é uma das greves com mais tempo dentro do tecido social do país”, sintetiza Carlos Almeida, presidente do Sindicato dos Oficiais de Justiça (SOJ). Um dos reflexos desta paralisação é o aumento no número de pendências, que tende a agravar-se caso não se chegue a um acordo com o Ministério da Justiça. “É preciso colocar termo a isto. E, colocado o termo a isto, é necessário criar as condições para que os oficiais de justiça possam desenvolver a sua atividade. Se isto for possível, nós vamos ter um ano de muito trabalho obviamente, mas que vamos poder recuperar”, argumenta. Dados oficiais do fim de outubro mostram que há 582.252 processos pendentes, número superior ao dos anos de 2023 e 2022, por exemplo. A justiça cível é a mais prejudicada, com 481.715 processos pendentes. Se a negociação não tiver uma solução (a próxima reunião está agendada para 16 de janeiro, acordada no encontro anterior a 17 de dezembro), o oficial de justiça antevê “um problema muito grave” no país. “Seguramente, Portugal vai ter de ser chamado em termos de responsabilidades pela própria comunidade europeia”, ressalta. Também reivindicam melhorias na carreira os advogados. De acordo com Fernanda de Almeida Pinheiro, bastonária da Ordem dos Advogados (OA), o facto de os profissionais não terem previdência “é um problema muito grave que afeta milhares de profissionais todos os dias que necessitam do sistema de presidência, porque estão doentes, porque tiveram os seus filhos, porque não conseguem prestar os seus serviços de forma regular e continua, infelizmente, sem ser resolvido”, detalha a bastonária.A entrada na profissão, com mudanças na lei de estágio e o financiamento das ordens profissionais são outros entraves, na análise de Fernanda de Almeida Pinheiro, que espera ver solução neste novo ano que se inicia. A bastonária também acredita ser fundamental a discussão sobre o acesso ao uso de tecnologias por parte dos advogados, em especial as de inteligência artificial.amanda.lima@dn.pt."Desta vez é para cumprir". Ministra garante construção do novo Palácio da Justiça de Coimbra.Governo sobe proposta aos oficiais de justiça com aumentos anuais entre 449 e 1194 euros