Morte de Ihor. Ex-diretora nacional do SEF faltou a julgamento. Vai ser ameaçada de detenção
Era o depoimento mais aguardado desta terça-feira, mas não aconteceu: Ana Cristina Batista Gatões, ex-diretora nacional do extinto Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), arrolada como testemunha da acusação, não compareceu no Juízo Criminal de Lisboa nem deu qualquer justificação para a ausência.
A juíza Hortense Martins, que preside a este segundo julgamento sobre a morte de Ihor Homeniuk - no primeiro, que se iniciou em 2021, foram condenados a nove anos de prisão três inspetores do SEF, por terem agredido e deixado algemado durante oito horas o cidadão ucraniano - ordenou que a testemunha faltosa seja agora notificada por órgão de polícia criminal para se apresentar no tribunal. A magistrada determinou ainda que a ex-diretora do SEF seja expressamente advertida de que se voltar a faltar serão emitidos “os competentes mandados de detenção” - ou seja, que será procurada para ser detida e conduzida ao tribunal.
Como o DN noticiou, o Ministério Público (MP) ponderou acusar Gatões do crime de denegação de justiça e prevaricação pelo facto de não ter, como era sua obrigação, comunicado a morte de Ihor à Inspeção Geral da Administração Interna (IGAI) mal teve dela conhecimento. Quando ocorre uma morte em custódia, os responsáveis policiais têm de avisar de imediato a autoridade judiciária (MP), a IGAI e a família (neste caso a Embaixada da Ucrânia). Tanto o MP como a representação diplomática foram notificados por um inspetor do SEF no dia do óbito, mas a IGAI só seria avisada oficialmente a 17 de março (Gatões diz que a 16 de março ligou à inspetora geral da Administração Interna, Anabela Cabral Teixeira, e lhe comunicou o facto).
A justificação da ex-diretora nacional para só ter notificado a IGAI cinco dias depois é que quereria perceber se tinha havido “maus-tratos ou violência”. No entanto, não ordenou qualquer averiguação interna; limitou-se a pedir ao responsável pelo SEF do aeroporto de Lisboa, o diretor de Fronteiras de Lisboa António Sérgio Henriques - um dos cinco arguidos neste processo, acusado de ter agido de modo a encobrir o crime -, que fosse ver o que se tinha passado e lhe reportasse.
O MP acabou por considerar que não se justificava acusar Gatões. Porém há grande expectativa em relação ao seu testemunho, nomeadamente por ter afirmado que só a 30 de março, quando os três inspetores foram presos por se suspeitar de que tinham matado Ihor, teve conhecimento do que qualificou como “um caso de tortura”. Gatões declarou-se “enganada” - responsabilizando assim Sérgio Henriques, que até agora não depôs no julgamento.
Além de Gatões, deveria ter sido ouvido na sessão desta terça o ex-responsável pelo departamento de Inspeção do SEF, o inspetor coordenador João Ataíde, a quem a então diretora terá pedido para visionar as imagens de videovigilância do centro de detenção do SEF no aeroporto de Lisboa (onde Ihor morreu).