Portugal prepara-se para atingir já em 2025 a meta de 2% do PIB em investimento em Defesa - cerca de 5,9 mil milhões, mais mil milhões do que o orçamentado - compromisso assumido com a NATO e sucessivamente adiado desde a cimeira de Gales, em 2014, com o nosso país a ficar entre o grupo dos mais atrasados no cumprimento desse objetivo. Em declarações exclusivas ao DN, o ministro da Defesa Nacional garante que o governo tem agora um “plano detalhado” desenhado por um grupo de trabalho onde diferentes entidades da Defesa Nacional interagiram para o desenhar, com uma cronologia “que tem de ser cumprida ao milímetro para que em 2025 os números também possam bater certo”. “Está feito o plano”, garante o governante, sublinhando que existe “uma forte esperança de concretizar o objetivo dos 2% em 2025”.Esse plano envolve representantes do ministério, dos três ramos das Forças Armadas e da indústria, e definiu para cada aquisição os prazos, valores e retorno económico. “Grande parte dos bens e equipamentos que estão previstos na Lei de Programação Militar (LPM) serão adquiridos de forma acelerada. Falo de fragatas para a Marinha, de navios que já estão a ser construídos em Viana do Castelo, da modernização das viaturas Pandur - que será feita 100% ou praticamente 100% por indústrias nacionais - e da entrega dos aviões Super Tucano ainda este ano”, descreve.. O ministro acrescenta ainda “defesas antiaéreas de baixo e de médio alcance” e outros equipamentos cujos detalhes não podem ser revelados “porque estas aquisições são reservadas”. Cada uma destas aquisições tem associada uma percentagem de retorno para a economia nacional, com vários projetos a atingir os 100% de participação portuguesa. “As indústrias nacionais têm de estar lá, não apenas a pedido”, afirma, lembrando que este ciclo de investimento “pode ser um motor de reindustrialização para o país”. Contabilidade criativa? “Isso é conversa”A execução do plano será acompanhada pela NATO, que define regras claras: 70% do investimento tem de ser feito em equipamentos, infraestruturas e bens de Defesa, enquanto apenas 30% pode incluir outras áreas de soberania, como a GNR. “Isso é conversa. O investimento terá efeito real nas capacidades das Forças Armadas”, responde o ministro às críticas de alegada “contabilidade criativa”. “Este esforço é um esforço que é verificado pela NATO. Há um valor neste crescimento de 20% que tem de ser aplicado em bens, infraestruturas e equipamentos. A NATO aceita uma proporção de 30% de outras áreas, mas 70% tem de ser Defesa pura e dura. As coisas são como são e quanto a isso não há muito que inventar.”Além de refutar a ideia de artifícios orçamentais, o ministro reforça: “Não basta apenas comprar equipamentos para que digamos que em 2025 atingimos 2%.” E acrescenta que o objetivo exige “um profissionalismo absoluto” e “rigor” para ser concretizado. Recorde-se que o governo anunciou que em 2024 Portugal tinha superado a percentagem do PIB gasto em defesa em relação aquilo que estava previsto. O ano fechou com 1,58% quando a previsão que constava no último relatório da NATO, estimava 1,46%, de acordo com o Ministério da Defesa. Estes 1,58% do PIB em 2024 significaram um total de despesa de 4.481 milhões €, dos quais 3.069 milhões são dos serviços sob tutela direta do Ministério da Defesa com as Forças Armadas.Ou seja, 31% desta despesa que não é investimento direto nas Forças Armadas. É o caso, por exemplo, de 253 milhões que são para a GNR e forças do Ministério da Administração Interna.Outro dado interessante sobre Portugal é que 58,6% da despesa é com pessoal, pagamentos de salários. Este valor é só superado pela Itália, com 59,4%. Desde 2014 a queda do número de efetivos militares caiu 21%, uma tendência que sucedeu também noutros 11 países da NATO, mas só a Bélgica ultrapassou Portugal, com 30% menos militares em 2024 do que em 2014.Defesa como motor económicoAlém do cumprimento imediato da meta dos 2%, o ministro sublinha que este esforço é apenas o início de uma estratégia de longo prazo: “Temos de aproveitar este ciclo de investimento não só para modernizar as Forças Armadas, mas também para dinamizar a indústria nacional, atrair fundos europeus e criar emprego altamente qualificado.”Para o governante, “o objetivo dos 5% até 2035 não é apenas um número, é a oportunidade de colocar Portugal num patamar de soberania tecnológica e industrial compatível com as exigências do nosso tempo.”Com a execução orçamental recorde de 2024 como base e a nova orgânica já em funcionamento, o ministro sublinha que Portugal está a dar um sinal claro aos seus parceiros: “Nós reforçamos as estruturas da Defesa para estarmos à altura dos momentos históricos que vivemos e damos também um sinal aos nossos aliados, quando o que se nos pede não é coisa pouca.”Para o governante, o caminho até aos 5% do PIB definidos pela NATO para 2035 “não pode ser visto como uma imposição externa”. Pelo contrário: “Temos de estar à altura dos tempos - e não tenho dúvidas de que vamos estar.”Reforma estrutural para uma Defesa “mais ágil”Nuno Melo falou ao DN à margem da cerimónia de tomada de posse dos dois diretores-gerais, em regime de substituição, das novas Direção-Geral de Armamento e Património da Defesa Nacional (DGAPDN) e Direção-Geral de Recursos Humanos da Defesa Nacional (DGRHDN), respetivamente António José de Morais Batista e o major-general piloto aviador Rui Pedro Matos Tendeiro. . “Para garantir que o plano de investimento se traduz em resultados”, o Governo procedeu a uma reforma estrutural no Ministério da Defesa, extinguindo a Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional e criando duas novas estruturas: uma dedicada aos recursos humanos e outra ao armamento e património, explicou o ministro.“Separa-se o que é distinto para que se possa dedicar melhor atenção ao que é diferente, tornando o Ministério da Defesa Nacional mais ágil e dotando-o com mais capacidade de resposta no desempenho da sua missão ao serviço do interesse nacional”, afirmou. Esta mudança, acrescenta, “vai dar resposta a problemas há muito identificados” e “adaptará o Ministério aos novos ciclos e oportunidades que são determinados pelas novas exigências geopolíticas”.O governante detalhou os objetivos da reforma: “o que se espera é maior eficácia e foco, melhor motivação das pessoas, reforço da transparência, rastreabilidade dos processos administrativos e aumento dos investimentos na Defesa Nacional.” Para o ministro, “estas mudanças são sinais de renovação em toda a linha”, permitindo “reforçar a evidência de que as Forças Armadas são feitas de militares, mas também de civis.”.Defesa. General da Força Aérea comanda Recursos Humanos e ex-chefe de gabinete dirige Armamento e Património. Essa nova orgânica também é vista como essencial para acelerar a execução dos projetos e aproveitar fundos europeus. “Temos de estar à altura do ritmo dos tempos, e o ritmo dos tempos não é compatível com esperas de meses para aquilo que precisa de resposta para ontem”, sublinha.A reestruturação também terá impacto direto na evolução dos efetivos, que em 2024, pela primeira vez em vários anos, mostraram uma inversão na tendência de queda: “Temos de recrutar mais. Temos de continuar a melhorar a retenção. Temos também de reafirmar o compromisso com os antigos combatentes e com os deficientes das Forças Armadas”, afirma.Rentabilizar o património militar para servir as Forças ArmadasOutro pilar da reforma é a gestão do património militar. Durante décadas, imóveis das Forças Armadas foram alienados sem retorno significativo para a instituição. De acordo com Nuno Melo, essa prática vai terminar. “As Forças Armadas não podem ser descapitalizadas no seu património. Se o património sai e o dinheiro não entra, isto não é bom para as Forças Armadas. Se não serve, prejudica a soberania nacional e, portanto, se as coisas não resultam, têm de se alterar os procedimentos”, defende.Já estão em curso projetos para reabilitar 15 edifícios destinados a habitação militar. “Podiam ter sido rentabilizados através da alienação ou da concessão a outras entidades, mas a minha opção foi a de aproveitar edifícios que eram do Exército para os modernizar e entregar à habitação, rentabilizando-os dentro das Forças Armadas”, afirma..General Vieira Borges: reforço na Defesa é oportunidade para reindustrializar o país. Além disso, está a ser criado um Arquivo Geral da Defesa Nacional. “Estou a preparar a criação de um Arquivo Geral da Defesa Nacional para condensar num espaço de grande qualidade e condigno os arquivos dos três ramos das Forças Armadas e também da Defesa Nacional, criando um centro de digitalização que permitirá colocar esse acervo ao serviço de trabalhos académicos.”O ministro acrescenta ainda uma aposta no turismo militar: “As Forças Armadas são detentoras de edifícios históricos de caráter religioso e militar, espaços que foram baterias de costa impressionantes pela sua localização e beleza. Estes espaços podem ser colocados ao serviço das pessoas, gerando receita para a sua recuperação e manutenção.”