A realidade no próximo ano letivo será semelhante à dos anos anteriores: milhares de alunos começarão as aulas sem professor. As listas de mobilidade e de contratação inicial [concurso de docentes] revelam um dado preocupante: em várias regiões já não há professores disponíveis nas reservas de recrutamento”. É desta forma que a Missão Escola Pública (MEP) - um movimento apartidário de professores - antecipa o arranque do ano letivo 2025-2026. Para Cristina Mota, porta-voz do movimento, esta falta de docentes acarreta outros problemas para a escola pública, pois “significa que os horários em falta serão entregues a recursos sem qualificação pedagógica ou absorvidos por horas extraordinárias, sobrecarregando ainda mais os docentes que fazem parte do sistema”.Segundo o Ministério da Educação, Ciência e Inovação, dos 22.051 horários colocados a concurso, e cujo resultado foi conhecido na semana passada, foram colocados 18.899 docentes. Ficaram assim 3152 horários por preencher. Contudo, trata-se de uma realidade semelhante à de anos anteriores. “Já no ano passado, em algumas zonas de Lisboa e Algarve, no mês de agosto já se tinham esgotado a lista de professores em muitos grupos de recrutamento [disciplinas]”, recorda Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP). Questionado pelo DN sobre qual o maior desafio das escolas no próximo ano letivo, o responsável não tem dúvidas: “a escassez de docentes será a maior dificuldade, principalmente nas zonas de Lisboa e Algarve”. Arlindo Ferreira, diretor do agrupamento de escolas Cego do Maio, Póvoa de Varzim, e autor do blogue «ArLindo» (dedicado à Educação), partilha as mesmas preocupações e não encontra grandes diferenças entre o arranque deste ano letivo e o anterior. “Será muito idêntico, com falta de professores a Sul do país, principalmente”, refere.Filinto Lima volta a pedir ao MECI, e ao Ministério das Finanças, um esforço conjunto para atribuir um apoio à estadia, uma medida que, defende, resolveria o problema da falta de professores na zona Sul do país. “O MECI daria um passo de gigante se acrescentasse às 17 medidas que já estão no terreno o apoio na estadia. Quem vai de Norte para Sul para pagar 800 euros por um quarto?”, questiona. O presidente da ANDAEP ilustra a eficácia dessa medida com o exemplo de Oeiras, “onde a câmara disponibiliza casas e quartos por 150 euros para professores”. “O apoio na estadia ajudaria bastante a resolver o problema. Há concelhos em que já não há professores nas reservas de recrutamento e o apoio na estadia deveria ser implementado”, conclui .Falta de recursos pode comprometer qualidadeA MEP alerta ainda para a escassez de outros profissionais nos estabelecimentos escolares no arranque do novo ano letivo. “Não esperamos que as escolas contem logo em setembro com os mediadores linguísticos e os psicólogos que fazem manchetes de jornais. No ano passado, os mediadores foram anunciados em janeiro e apenas no 3.º período alguns contratos foram assinados - houve escolas com dezenas de alunos sem domínio da língua portuguesa que não tiveram qualquer mediador”, defende. Cristina Mota acredita ainda que as escolas não terão psicólogos suficientes para atender as necessidades dos alunos. “Estão prometidos 830 - cerca de um por agrupamento. Mas muitos agrupamentos integram quase uma dezena de escolas e milhares de alunos”, explica.Para a MEP, a falta de recursos pode comprometer a qualidade do ensino e afirma que a redução do crédito horário para transformar todos os tempos do professor em tempos letivos vai pôr em causa projetos pedagógicos como clubes de teatro, rádio, escrita criativa ou oficinas de artes. “Este ano, até modalidades como aulas por turnos - que permitiam dividir turmas para trabalhar em grupos menores - e os apoios às disciplinas com exame estão em risco”, sublinha.A MEP espera ainda que o ministro escolha uma escola da Área Metropolitana de Lisboa para assinalar o arranque oficial do ano letivo, “ao contrário do que aconteceu no ano passado, quando optou por uma escola a Norte, onde os constrangimentos iniciais não são tão significativos”. “É fundamental que o ano comece num contexto que espelhe os problemas reais da Educação, em vez de num cenário que mascara as dificuldades estruturais”, conclui Cristina Mota..Escolas degradadas e obras por iniciarO Governo anunciou que vai disponibilizar seis milhões de euros para obras urgentes em 28 escolas. Para além destas, foram identificadas 600 escolas a precisar de obras, um aumento face às 451 identificadas em 2023. Filinto Lima pede ao Governo que “as escolas todas entrem em obras no mais curto espaço de tempo possível”. “Estas obras são muito necessárias e há falta de equidade, há escolas com todas as condições e outras em que os alunos precisam de uma manta na sala de aula”, lamenta. Já para Cristina Mota, “o que é anunciado está muito longe da realidade”. São apresentados valores ambiciosos no âmbito do PRR, mas a execução fica muito aquém e os números reais não são divulgados, o que revela uma preocupante falta de transparência”..Governo vai financiar a totalidade dos custos de formação de novos professores em Lisboa, Setúbal e Algarve.Maioria dos professores contra telemóveis no recreio até ao 12.º ano