Maria Heitor leva justiça aos cidadãos e aos campos de râguebi
Trabalhar na Polícia Judiciária (PJ), treinar e arbitrar jogos de râguebi. Esta é a rotina de Maria Heitor, a primeira portuguesa a chegar ao topo do desporto internacional na modalidade: arbitrar no Mundial Feminino, agendado para o final de agosto. À partida parece que uma coisa nada tem a ver com a outra, mas há pontos em comum. “Há sim, coisas em comum entre ser árbitro e ser um polícia, não é? A questão da justiça é sempre essencial nas duas profissões, uma complementa a outra”, explica ao DN, acrescentando que, nos dois trabalhos, ter organização e disciplina é “essencial”.
Maria Heitor, nascida e criada em Lisboa, tem ligação ao desporto desde criança. Já praticou diversas modalidades, por exemplo, vólei, futebol, judo, ginástica. Conta que sempre gostou de fazer exercício e teve apoio da família para se dedicar ao desporto. Quando tinha 15 anos, estava à procura de uma nova modalidade para praticar. “Uma amiga disse-me: ‘Anda para o râguebi, porque precisamos de gordinhas como tu’, porque na altura era muito gordinha. Então, como o râguebi é um desporto que dá para toda a gente, foi um bocadinho assim... Estava à procura de um novo desporto e, pronto, surgiu o râguebi na minha vida dessa maneira”, recorda. Foi uma paixão duradoura, que já passa de 21 anos e hoje é uma parte essencial da vida de Maria Heitor.
A agora árbitra jogou durante oito anos nas equipas do Benfica e do Sporting. Nos últimos três dedicou-se à arbitragem. Desde então, realizou uma série de formações para chegar ao topo: ser a principal árbitra deste desporto em Portugal — e agora do mundo. Este caminho fez-se com sacrifícios, dedicação pessoal, apoios e disciplina — que realmente faz parte da vida da profissional.
O horário de almoço no trabalho, de hora e meia, é utilizado para treino no ginásio, localizado no próprio edifício da Judiciária. O almoço é na secretária — e preparado aos domingos para toda a semana. “Eu treino de seis a sete vezes por semana, tem de ser”, conta. Mas, às vezes, também almoça com os colegas, porque valoriza o convívio e gosta dos companheiros de trabalho.
Aliás, destaca que o apoio dos outros inspetores e inspetoras faz a diferença na vida de Maria Heitor. “Eles são muito entusiastas, estão muito contentes com esta nomeação para o Mundial. São os primeiros a apoiar-me, a dizer que se eu precisar de alguma coisa estão comigo. A minha brigada é cinco estrelas e sem eles, se calhar, não tinha conseguido atingir estes objetivos”, sublinha a inspetora, que trabalha na Unidade de Informação Criminal.
O objetivo máximo, de chegar ao Mundial, foi alcançado na mesma semana em que outro feito a deixou feliz: ter duas mulheres ao seu lado para apitar um jogo. “Conseguimos fazer, pela primeira vez, um trio feminino no escalão máximo do râguebi português masculino. Era um dos meus objetivos da época e dos últimos anos e conseguimos na mesma semana em que soube que ia ao Mundial, ou seja, foram dois objetivos alcançados numa semana”, explica. No entanto, são apenas três mulheres – e Maria Heitor quer que mais mulheres se dediquem ao desporto.
A árbitra observa que, noutros países, esta realidade está mais consolidada, como em Inglaterra, França e Espanha. Apesar de ter alcançado o maior sonho e o topo da modalidade, Maria Heitor não quer parar. Ainda vai pensar em voos mais altos, mas, para já, o foco está no mundial, o que vai exigir ainda mais treinos e formações, presenciais e online, sempre a conciliar com o trabalho na PJ. Aliás, Maria Heitor recorda que há outra semelhança no desporto que pratica com o trabalho: o râguebi é democrático, assim como é a justiça, para todos. “Há oportunidades para toda a gente — gordinhos, magrinhos, altos, baixos para todo o tipo de pessoas, rápidos, lentos, mas é para todos, assim como a justiça.”
amanda.lima@dn.pt