Joana Pereira: "Não quero seguir exemplos, quero ser exemplar"
Depois de 14 anos na mesma empresa, a licenciada em Engenharia Física decidiu arriscar e abraçar o empreendedorismo. Na pele de CEO tem agora um sonho: ajudar outros a investir e a transformar o mundo, um passo de cada vez.
Habituada a ser uma mulher num mundo de homens, Joana Pereira recorda, em conversa com o Diário de Notícias, que esta já era a sua realidade nos tempos em que frequentava a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Foi ali que estudou Engenharia Física, mas aquilo que poderia ter encarado como uma desvantagem foi, na verdade, uma mais-valia. "Na faculdade nunca senti desvantagem [por ser mulher]. Senti o que é a força de ter uma equipa diversa", aponta, referindo-se à complementaridade da "descontração" dos colegas rapazes com a sua própria "organização". Contudo, a igualdade que encontrou na universidade não se manteve ao longo de todo o percurso profissional, em que sentiu "desvantagens várias vezes". O problema da falta de paridade entre géneros está, defende, na educação de base.
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"Sinto que nós, mulheres, não arriscamos tanto. As filhas são educadas para serem perfeitas e os filhos para serem corajosos", esclarece. Joana Pereira acredita que esta visão condiciona a forma como as mulheres enfrentam desafios pessoais e profissionais, nesta última dimensão dificultando, por exemplo, a candidatura a oportunidades de emprego. "Há sempre homens mais preparados do que mulheres, porque historicamente fomos preparando mais os homens para a liderança do que nos preparámos a nós próprias", afirma. Para a atual CEO e cofundadora da In-Vest, sempre foi importante contrariar esta tendência. "Quando havia uma posição de liderança, concorria porque optei sempre por ser corajosa", diz, reconhecendo, no entanto, que também tem medos.
O primeiro salto de coragem foi trocar os dois anos que dedicou à investigação científica na área do solar fotovoltaico para entrar na indústria da saúde, em particular na área dos equipamentos e dispositivos médicos. Passou pela Siemens Medical Solutions onde descobriu que, afinal, é "uma pessoa de vendas". Mais tarde, em 2007, juntou-se à Medtronic e aí fez um caminho "muito interessante e cheio de desafios", nomeadamente por ter experienciado, ao longo de 14 anos, diferentes funções - do marketing à gestão de negócio, passando pela gestão de equipas e direção empresarial. "Fui a primeira e única mulher na direção de negócio. Durante estes anos, fui mãe de dois filhos e isso obrigou-me a desenvolver muito foco e organização", recorda. Apesar de sublinhar a satisfação, pessoal e profissional, que teve ao longo de todo esse período, Joana Pereira acabaria por, em 2021, trocar o emprego certo por uma aventura a longo-prazo no empreendedorismo.
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A tomada dessa decisão aos 42 anos tem diferentes raízes, desde logo na forma como encara a vida. "Não quero seguir exemplos, quero ser exemplar. E a seguir, atrás de mim, outras virão e copiarão o meu exemplo", diz, com orgulho na voz e o entusiasmo de quem segue um sonho. Antes de criar, com o seu parceiro de negócio, uma sociedade de investimento imobiliário, Joana já se dedicava, desde os 27 anos, a testar esta área, mas foi a participação numa formação para a liderança no feminino que a fez lançar-se no mercado. "Tudo começou pelo programa Promova [da CIP e da Nova SBE] que tinha um módulo de autoconhecimento e marca pessoal muito interessante. Isso fez a diferença", explica. A partilha desta experiência com outras 30 mulheres, bem como as competências que foi adquirindo ao longo da carreira, deu-lhe a força que procurava para criar a In-Vest, um projeto que pretende "democratizar o investimento e a sustentabilidade".
Hoje, enquanto CEO, assume que uma das suas grandes preocupações é garantir diversidade de candidatos na altura de selecionar um novo funcionário. "É preciso pensar-se na marca da empresa, na cultura e naquela que queremos que seja a estratégia para aquela posição. Depois é ter candidatos diversos. Mais importante que escolher uma mulher, é dar oportunidade a um conjunto diverso de candidatos e isso protege homens e mulheres", defende. Porém, acrescenta ainda que, ao nível corporativo, é importante alterar mentalidades para que a paridade nas organizações passe da miragem à realidade. "Enquanto continuarmos a trabalhar muitas horas e isso for sinónimo de sermos bons trabalhadores, vai limitar o acesso das mulheres à liderança", afirma. "Gostava que as empresas em Portugal trabalhassem mais a produtividade e se focassem menos no tempo de trabalho. Aí começávamos a ter mais paridade", remata.
dnot@dn.pt
Com o apoio CIP/CGD/Fidelidade/Luz Saúde/Randstad