Cerca de 8% das crianças e jovens, desde o Pré-escolar ao Ensino Secundário, estão abran- gidos pelo denominado Ensino Inclusivo, beneficiando de medidas seletivas e/ou adicionais de suporte à aprendizagem e à inclusão. Contudo, nem sempre usufruem dos apoios previstos por falta de recursos nas escolas. Uma situação que, segundo diretores escolares e pais, tem vindo a agravar-se e impede a progressão das aprendizagens dos alunos. “Em comparação com o ano letivo anterior, o panorama piorou, pois temos mais alunos sinalizados com os mesmos recursos”, afirma Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP)..Os últimos dados da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC), referentes ao ano letivo passado, apontam para quase 90 mil alunos com medidas seletivas e/ou adicionais (ver caixa). Muitos desses alunos deveriam ter apoio de um professor de Ensino Especial em sala de aula. Contudo, tal não se verifica em todas as escolas. Uma mãe de um aluno do 9º ano, que não quis identificar-se por temer represálias contra o filho, garante que a lei nem sempre é cumprida. O filho, aluno numa escola do Grande Porto, sempre teve esse apoio até ao final do 2º ciclo. “Quando passou para o 7º ano, deixou de ter professor para acompanhá-lo em sala de aula”, conta. O jovem, com transtorno do espetro do autismo, tem, por isso, enfrentado muitas dificuldades nos últimos anos..A justificação da direção da escola, conta, prende-se com o facto de não ter recursos suficientes disponíveis e ter de alocá-los onde são mais necessários. .“Como o meu filho é autista verbal com autonomia, não é prioridade. Entendo que haja alunos em situação mais grave, mas o meu filho, sem apoio, não consegue concentrar-se por causa dos estímulos, barulho e até luzes na sala. Só com um professor ao lado dele consegue estabilizar e aprender. Caso contrário, fica perdido”, sublinha. Devido à falta de apoio que se arrasta desde o 7º ano, o filho, diz, “passou de bom aluno a um aluno com dificuldades”..Para Filinto Lima, “é preocupante haver alunos sem o devido acompanhamento ao nível da Educação Especial”. “Devemos evitar que tal suceda, mas a chegada às escolas de mais profissionais é muito necessária”, afirma. .O presidente da ANDAEP garante que “a Educação Especial carece de recursos humanos, professores, terapeutas e assistentes operacionais”. “É uma espécie de parente pobre da Educação a necessitar de um forte impulso capaz de catapultar a melhoria do atendimento e das atividades proporcionadas aos alunos sinalizados”, lamenta..Contudo, clarifica, “a contratação dos recursos humanos não depende das escolas, mas sim da tutela e, no caso dos assistentes operacionais, das autarquias locais, atendendo ao rácio de funcionários”. As câmaras municipais cumprem o número de assistentes técnicos e operacionais previsto na lei, diz, “mas a portaria em causa deverá ser urgentemente revista - a última vez foi há mais de 3 anos-, pois temos novos desafios nas escolas (mais alunos com necessidades específicas, alunos filhos de imigrantes…) que convocam um aumento desses recursos”, explica..Segundo Filinto Lima, “a inclusão é primordial nas escolas e estas fazem o melhor possível com os parcos recursos de que dispõem”. E só com mais recursos - professores, técnicos e AO - se poderá aumentar “a qualidade do trabalho diário efetuado pelos professores, necessário para um crescimento o mais harmonioso possível”..O presidente da ANDAEP alerta ainda para o aumento sucessivo de alunos sinalizados com medidas seletivas e/ou adicionais, muitos oriundos do estrangeiro..Inclusão em causa.“A falta generalizada de docentes, a carência de apoios, as barreiras arquitetónicas e a falta de uma cultura de inclusão impedem que os alunos de Educação Inclusiva estejam, de facto, a beneficiar das medidas previstas na lei.”.A análise é de Júlia Serpa Pimentel, presidente da direção nacional da associação Pais em Rede, que adianta ainda tratar-se de um problema que se arrasta “há vários anos” e que leva as famílias ao desespero..“Há queixas generalizadas de que os apoios não chegam. As escolas tentam, mas é fazer omeletes sem ovos. É preciso que os alunos possam estar na escola para haver inclusão, mas é preciso que os alunos possam participar ativamente nas atividades do seu grupo e, para isso, é preciso haver os apoios necessários de Educação Inclusiva”, afirma..A responsável lamenta a existência de muitas escolas que “continuam a ter barreiras arquitetónicas que impedem o acesso às crianças” e alerta que as várias dificuldades dos alunos que precisam de medidas levam, muitas vezes, a que sejam “colocados em salas à parte”. “Estão entregues às escolas, mas não estão incluídas”, sublinha..Júlia Serpa Pimentel afirma mesmo haver um problema estrutural no país, pois “embora exista uma legislação excelente, a verdadeira cultura da inclusão não existe”. O cenário, conta, tem piorado ao longo dos anos, “não por falta de investimento do ME”, mas pelo “envelhecimento da classe docente e as consequentes aposentações”..As famílias recorrem à associação com pedidos de ajuda, mas o apoio é cada vez mais difícil. “A Educação foi municipalizada e são as câmaras que têm a faca e o queijo na mão. A alocação de auxiliares de apoios passa pelas autarquias e estamos numa altura complicada, porque no próximo ano há eleições autárquicas”, explica. “Os miúdos não estão incluídos. É um drama. Têm necessidades específicas às quais as escolas devem responder, mas a verdade é que a Educação Inclusiva é o parente pobre da Educação”, conclui..Um dos problemas, avança, reside na sinalização dos alunos, pois “aqueles que ainda não estavam no sistema no ano letivo anterior não são contemplados”. “Devem colmatar-se as necessidades das escolas e atempadamente. No ano escolar anterior, há uma projeção que os diretores das escolas fazem da necessidade de professores e auxiliares, que contemplam as crianças que já existem no sistema. Qualquer criança que não esteja nos números não vai ter apoio, porque não foi contabilizada. Assim, criamos condições para que haja menos professores do que os necessários”, justifica..Uma das soluções, defende, deveria passar pela formação dos docentes de outros grupos disciplinares.