Ihor Homeniuk. Médico que denunciou homicídio à PJ readmitido no INML

O médico legista que autopsiou Ihor Homeniuk tinha sido demitido do Instituto de Medicina Legal, a 26 de novembro, por ter violado o contrato numa publicação científica relativa a outro caso
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O médico Carlos Durão que autopsiou Ihor Homeniuk e denunciou as suspeitas de homicídio à Polícia Judiciária (PJ), vai voltar a ser contratado pelo Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses (INMLCF), depois de ter visto o contrato antecipadamente rescindido, a 26 de novembro, quando publicou numa revista científica fotografias de um cadáver que podia ser identificado, violando regras estabelecidas.

Fonte oficial do INMLCF confirmou ao DN que o legista "foi admitido". Neste momento, explicou o mesmo interlocutor, "terminou o prazo de 10 dias para a reclamação dos candidatos e prevê-se que o júri entregue a lista para homologação nos próximos dias".

Confrontado pelo DN com esta informação, Carlos Durão, ouvido esta quarta-feira em Tribunal no julgamento dos três inspetores do SEF acusados por homicídio qualificado, afirmou desconhecer ainda esse desfecho.

A demissão de Durão, recorde-se, causou acesa polémica quando veio a público o final do ano passado, noticiada, designadamente pelo Correio da Manhã, como estando relacionada com a denúncia de crime no caso Ihor, afirmando o matutino que a Polícia Judiciária estaria a investigar "pressões" sobre Carlos Durão em resultado dessa mesma denúncia.

Houve até quem - caso do jurista e ex-ministro Miguel Poiares Maduro, no Twitter - perante a notícia da rescisão invocasse o estatuto de denunciante previsto em diretiva europeia: "Nos regimes de proteção de denunciantes estas questões são protegidas e qualquer alteração contratual exige normalmente um escrutínio muito apertado para evitar riscos de penalização de denunciantes."

O médico tinha um contrato de prestação de serviços de três anos que terminava em dezembro, mas foi rescindido a 26 de novembro. O motivo da rescisão, de acordo com o INMLCF, foi "uma clara violação do contrato estabelecido" - a publicação, num artigo científico em coautoria, de fotografias de um cadáver "com imagens do rosto que permitem a sua identificação" (na revista Forensic Science, Medicine and Pathology).

Carlos Durão trabalha para o INMLCF, em regime de prestação de serviços, desde 2007. Chegado à ribalta através do caso Ihor, no qual a sua atuação foi louvada quer pelo Ministério Público quer pela Inspeção-Geral da Administração Interna - que sublinham que a sua intervenção levou à investigação de uma morte que o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras estava a tentar fazer passar como "devida a doença súbita".

O INMLCF refutou qualquer relação entre o caso Ihor e a rescisão do contrato, sublinhando que o médico fez a sua estrita obrigação ao transmitir à PJ aquilo que tinha descoberto na autópsia.

Com 41 anos, Carlos Henrique da Silva Durão está inscrito na Ordem dos Médicos portuguesa desde 2006. Tem uma pós-graduação em Antropologia Forense pela Universidade de Coimbra e outra em Avaliação do Dano Corporal pela Universidade do Porto e trabalha como ortopedista no Hospital de Vila Franca de Xira. Esteve no exército português de 2006 a 2013 como oficial médico, tendo sido destacado para a missão da NATO no Kosovo.

Antes de chegar a Portugal, teve a sua residência médica de especialização em ortopedia e traumatologia no Hospital Central do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro; tirou o curso de Medicina na Universidade Souza Marques, na mesma cidade.

É a um ex-presidente do INMLCF, o professor catedrático da Universidade de Coimbra Duarte Nuno Vieira, presidente do Conselho Europeu de Medicina Legal e consultor forense temporário do Alto-Comissariado de Direitos Humanos da ONU, que Carlos Durão atribuiu o principal impulso para vir para Portugal trabalhar em medicina legal - especialidade que já tinha no Brasil.

Este parece retribuir a estima, certificando que a autópsia feita por Durão a Ihor Homeniuk "está muito bem feita, seguindo todos os standards internacionais". Fez até uma carta a pedido daquele para juntar ao seu pedido de reconhecimento de especialização na Ordem dos Médicos, de cujo colégio da especialidade de Medicina Legal foi presidente.

Na carta, cuja data é agosto de 2019, refere o facto de o médico luso-brasileiro colaborar "continuamente com o Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses desde o tempo em que presidi a este instituto", para concluir: "Trata-se de um profissional empenhado e dinâmico, com substancial interesse pela área pericial médico-legal, área na qual sempre evidenciou competência e uma contínua preocupação com a sua atualização técnico-científica. Considero que o Dr. Carlos Henrique da Silva Durão reúne os requisitos necessários para a obtenção do título de especialista em Medicina Legal também pela Ordem dos Médicos de Portugal, pretensão que apoio inteiramente."

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