Buscas na TAP. Foram constituídos quatro arguidos, entre os quais o dono da Barraqueiro e o filho
Paulo Spranger / Global Imagens

Buscas na TAP. Foram constituídos quatro arguidos, entre os quais o dono da Barraqueiro e o filho

Sociedades de advogados e o Grupo Barraqueiro visados nas 25 buscas em curso. Em causa suspeitas da prática de crimes como participação económica em negócio e fraude fiscal qualificada, entre outros.
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Foram constituídos quatro arguidos na sequência das 25 buscas realizadas esta terça-feira, 18 de novembro, na TAP, relacionadas com o processo de privatização da transportadora aérea de 2015.

“No âmbito de inquérito dirigido pelo Ministério Público do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), informa-se que, na sequência das buscas realizadas hoje, foram constituídos quatro arguidos: duas pessoas singulares e duas pessoas coletivas”, pode ler-se na página do DCIAP na Internet, onde é referido ainda que não foi feita qualquer detenção.

De acordo com uma notícia avançada pelo Correio da Manhã, os arguidos são duas pessoas: Humberto Pedrosa, o dono da Barraqueiro, e o seu filho David Pedrosa. Já uma das empresas que foi constituída arguida é a sociedade HPGB.

Estas diligências decorreram durante todo o dia no âmbito de um inquérito do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), dirigido pelo Ministério Público (MP). Estão em causa suspeitas da prática de crimes de administração danosa, participação económica em negócio, corrupção passiva no setor privado e fraude fiscal qualificada e fraude à Segurança Social qualificada.

"Estão em curso buscas residenciais e não residenciais em 25 locais, incluindo empresas, sociedades de advogados e sociedades de revisor oficial de contas", referia o MP, em comunicado, durante a manhã dando conta que "não está prevista qualquer detenção", o que veio a confirmar-se.

Nesta operação, denominada “Voo TP789”, os inspetores da PJ "visam a obtenção de prova" em relação aos "factos participados ao Ministério Público em dezembro de 2022 e relacionados com a aquisição pelo agrupamento Atlantic Gateway, à Parpública, de 61% do capital social da TAP, SGPS e da subsequente capitalização daquela entidade com fundos provenientes de um financiamento acordado, em momento prévio à aquisição, entre a Airbus e a sociedade DGN Corporation (acionista da Atlantic Gateway)", explica a nota.

Estão também a ser investigadas as "decisões contratuais tomadas por acordo entre a Aierbus e a DGN Corporation, em data anterior à da venda direta, com vista à aquisição pela TAP, S.A. de 53 novas aeronaves, e ao cancelamento de encomendas formalizadas em 2005". Isto insere-se "no contexto de suspeitas de que estas opções contratuais possibilitaram aquisição da participação social da companhia pelo consórcio Atlantic Gateway, e a respetiva capitalização, com recurso a financiamento externo, a pagar pela própria companhia e com prejuízos para a mesma".

"Investigam-se ainda custos suportados pela TAP, S.A. com entidades ligadas à Atlantic Gateway, em momento prévio à venda direta, no contexto daquele processo, bem como fatualidade respeitante ao período em que a gestão da TAP, S.A. esteve a cargo dos acionistas privados, envolvendo a situação fiscal de pessoas singulares e sociedades ligados a essa gestão", adianta o MP.

Em alguns dos locais visados, presidem às buscas dez procuradores e sete juízes, é ainda adiantado.

Visado nas buscas, Grupo Barraqueiro manifesta "total confiança e tranquilidade na sua intervenção no processo de privatização da TAP"

As mais de duas dezenas de buscas visam a TAP, mas também, segundo o JN, o Grupo Barraqueiro, de Humberto Pedrosa, que, entretanto, confirmou as diligências das autoridades.

“O Grupo Barraqueiro manifesta total confiança e tranquilidade na sua intervenção no processo de privatização da TAP, não existindo qualquer motivo de preocupação relativamente às diligências em curso”, informou em comunicado o grupo liderado por Humberto Pedrosa, acionista da Atlantic Gateway (juntamente com David Neeleman), que venceu a privatização da TAP no Governo PSD/CDS-PP liderado por Pedro Passos Coelho.

Na nota, o grupo adiantou que, “de uma forma voluntária, já tinha sido entregue no Ministério Público um dossier com toda a informação relevante sobre o processo de privatização da TAP, incluindo extensa prova de não ter realizado qualquer ato menos claro ou suspeito de irregularidade”.

Também a Parpública confirmou as buscas nas suas instalações, disse à Lusa fonte oficial da sociedade gestora de participações sociais do Estado, optando por não fazer comentários.

Já a TAP já fez saber que “não comenta processos judiciais”, referindo que colabora "sempre com as autoridades em todas e quaisquer investigações”.

"Estamos a dar apoio e suporte ao DCIAP com muitos meios da instituição", disse o diretor da PJ, Luís Neves, escusando-se a dar mais detalhes sobre esta operação, uma vez que "ainda estão a realizar-se diligências". "São muitos meios humanos que nós alocámos a uma solicitação do diretor do DCIAP", referiu aos jornalistas.

As diligências visam o negócio em que o consórcio Atlantic Gateway, de David Neeleman e Humberto Pedrosa, adquiriu 61% do capital da TAP. Um processo de aquisição em que terão sido usados fundos da própria companhia aérea. A TAP terá tido, depois, um alegado prejuízo de centenas de milhões de euros com a aquisição de 53 novos aviões.

Em outubro de 2022, foi aberto um inquérito pelo DCIAP, após uma denúncia de Pedro Nuno Santos, na altura ministro das Infraestruturas, na sequência de uma auditoria interna à TAP depois da renacionalização da companhia aérea.

"A investigação encontra-se a cargo de uma equipa mista constituída por duas magistradas do Ministério Público, dois inspetores da Polícia Judiciária (PJ), um inspetor da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), uma inspetora da Segurança Social e dois especialistas do Núcleo de Assessoria Técnica (NAT) da PGR", refere o Ministério Público.

Processos judiciais encarados com "normalidade" pelo Governo. Pinto Luz "tranquilo"

Referindo que “não compete” ao Governo “comentar processos ou diligências judiciais”, o Ministério das Infraestruturas e Habitação afirmou, ainda assim, que os encara "com normalidade”.

O ministério tutelado por Miguel Pinto Luz disse, em comunicado, estar "absolutamente concentrado no corrente processo de privatização da TAP, cujo prazo para a apresentação de Propostas de Intenção de Compra finda no próximo dia 22 de novembro”.

“O anterior processo de privatização da TAP, recorde-se, foi escrutinado pelo Tribunal de Contas e pela Assembleia da República, através de uma Comissão Parlamentar de Inquérito. O escrutínio é essencial num Estado de Direito e devemos encará-lo como elemento essencial de uma democracia saudável e moderna”, lê-se ainda na nota do do Ministério das Infraestruturas.

O executivo liderado por Luís Montenegro assegura “toda a colaboração com as autoridades competentes" e garante que “o Estado português continuará a assegurar que o processo decorra com integridade”.

O próprio Miguel Pinto Luz, já depois de conhecido o comunicado do seu ministério, disse estar “absolutamente tranquilo” com as buscas à TAP. “Estou absolutamente tranquilo. Este é dos processos mais escrutinados na vida pública portuguesa. Já teve escrutínio do Tribunal de Contas, já teve escrutínio da Justiça até, porque como já sabemos, já teve um processo que incidiu sobre todo o processo de privatização, já teve uma comissão parlamentar de inquérito”, afirmou Miguel Pinto Luz, em Leiria.

“Durante meses todos nós tivemos a oportunidade, fomos brindados com horas e horas infindáveis de escrutínio público, saudável na Assembleia da República e, portanto, estamos absolutamente tranquilos, o Governo, eu próprio, todos os intervenientes”, declarou Miguel Pinto Luz.

O governante adiantou que “o Governo está a acompanhar com enorme tranquilidade”.

“Vivemos num Estado de Direito, é bom que este escrutínio seja feito, que os portugueses sejam esclarecidos e que a Justiça também possa fazer o seu trabalho, com toda a tranquilidade”, insistiu.

Destacando que se está a viver “um momento especial na companhia”, pois “a TAP está no meio de um processo de privatização”, o ministro referiu que “daqui a três dias, menos de quatro dias”, se esperam as primeiras propostas.

“Sabemos que há muita vontade de muitos investidores, muitos grupos internacionais, de poderem adquirir a TAP neste processo de privatização. Portanto, o Governo está absolutamente comprometido, focado com este processo de privatização”, garantiu.

O governante assegurou ainda que o executivo será colaborante “com tudo o que as autoridades precisarem e esta é a posição que o Governo tem neste momento”.

Marcelo diz que é "vantajoso" para a privatização da TAP que tudo seja investigado "rapidamente"

Questionado sobre se as buscas e o negócio em causa podem representar um problema para o futuro comprador da TAP, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, disse que é benéfico para a privatização da companhia aérea que tudo seja investigado "rapidamente".

"Eu vi que há investigação relativamente à decisão de 2015. É um tema que já tinha sido falado. Depois, durante muito tempo, deixou de ser falado. É vantajoso para a privatização da TAP, em geral, que tudo que houver para investigar seja investigado cabalmente, mas também rapidamente", defendeu.

Até porque, segundo Marcelo, "uma operação como a privatização da TAP implica candidaturas, interesse de vários candidatos". "Quanto menor for a dúvida sobre o que se passou, sobretudo há muito tempo, melhor é para a posição de Portugal. Quando se fala na TAP o que importa é a posição de Portugal", sublinhou.

Paulo Raimundo: “Que há crime político e económico na privatização de 2015 não há dúvida”

O secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, defendeu não haver “nenhuma dúvida” de que foi cometido “crime político e económico” na privatização da TAP em 2015 e sugeriu que as buscas demonstram que houve “mais do que isso”.

“Que há crime político e que há crime económico naquela falcatrua de 2015, que foi a privatização da TAP, não há nenhuma dúvida sobre isso. Pelos vistos, há mais do que crime político e económico e vamos esperar”, disse.

O comunista falava à margem de uma ação de contacto com os trabalhadores da Salvador Caetano, em Vila Nova de Gaia, e recordou os contornos da privatização da companhia aérea.

“Que se faça as buscas, que se identifique, porque nós já tínhamos constatado que a TAP foi comprada com o dinheiro da TAP, os aviões da TAP foram comprados com o património da TAP, [não houve] nenhum investimento de quem supostamente comprou a TAP. E, portanto, investigue-se o que é para investigar”, declarou.

Ventura alerta que “suspeitas de corrupção” não devem significar recuo na privatização

André Ventura, candidato presidencial e líder do Chega, considerou que “suspeitas de corrupção” relacionadas com a privatização da TAP em 2015 não podem significar que os portugueses “continuam a pagar” e a companhia se transforma “num saco sem fundo”.

“Haver suspeitas de corrupção não pode querer dizer que os portugueses continuam a pagar, a pagar, a pagar e a pagar, só gastam dinheiro com a TAP e nunca têm nada de volta: uma coisa não significa a outra”, alertou, à margem de uma ação de campanha na Universidade Lusíada, em Lisboa.

O candidato presidencial defendeu que todas as investigações devem ser feitas, mas realçou que “os portugueses também têm direito a que a TAP não se transforme num saco sem fundo”.

“Estamos lá a gastar dinheiro indefinidamente e nunca mais somos ressarcidos. Os melhores países do mundo, quando os Estados tiveram que pôr dinheiro nas companhias aéreas, devolveram aos utentes esse dinheiro. Na TAP o que nós temos é «paga, paga, paga», e não tens nada de volta”, criticou.

Ventura defendeu uma TAP que “privilegie o contacto com as comunidades” e defenda “as rotas tradicionais”, mas onde “a corrupção seja combatida a sério”.

O candidato a Belém defendeu "uma justiça forte, capaz, interventiva e independente, capaz de fazer o que tem que ser feito".

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