Foram menos de 50 segundos desde a ruptura do cabo até a colisão final, a cerca 60 km/h. Quando o cabo partiu, o sistema de emergência cortou a energia conforme previsto, mas não foi suficiente para imobilizar o veículo. Estas são algumas das primeiras conclusões do relatório preliminar do Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e de Acidentes Ferroviários (GPIAAF) sobre o acidente do elevador da Glória.O relatório estava previsto para ser divulgado na sexta-feira, mas foi adiado para este sábado, 06 de setembro. O documento aponta que os freios pneumáticos e manuais não conseguiram travar a cabina 1 após a ruptura do cabo, "pois dependem do equilíbrio entre as cabinas".. É confirmada a informação de que o plano de manutenção estava em dia, com uma inspeção visual realizada ainda na manhã do acidente. No entanto, a zona de ruptura do cabo "não era acessível a inspeção sem desmontagem" do veículo. Mais se sabe que o cabo rompido "estava dentro da vida útil", nomeadamente 337 dias usados dos 600 previstos. Portanto, ainda tinha uma vida útil de 263 dias até à sua substituição. Este modelo é usado há seis anos neste ascensor.Até o momento, a investigação constatou que não conseguiu confirmar de quem é a obrigação "de supervisionar o funcionamento e segurança" este transporte. "O ascensor não está na alçada da supervisão do Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P., não detendo neste momento a investigação informação fidedigna e confirmada sobre qual é o enquadramento legal do ascensor da Glória nem sobre qual é a entidade pública que tem a obrigação de supervisionar o funcionamento e segurança deste sistema de transporte público". Netse sentido, a única informação confirmada é a "intervenção de uma entidade acreditada que, por iniciativa da empresa operadora, inspeciona o equipamento aquando das grandes reparações a cada quatro anos"..Próximos passosA investigação do GPIAAF vai concentrar-se agora nos seguintes pontos chave:― Mecanismo de desligamento entre o cabo e o trambolho, com análise da condição da fixação do cabo nos trambolhos e da sua execução; ― Projeto inicial do ascensor, suas sucessivas alterações e pressupostos dos sistemas de segurança; ― Verificação do funcionamento dos sistemas de freio, sua composição e eficácia; ― Definição do tipo de cabo e sua fixação nos trambolhos, controlos de qualidade da execução e receção; ― Procedimentos de manutenção dos componentes críticos para a segurança e sua execução e verificação; ― Condições e exequibilidade de realização das operações de inspeção e manutenção; ― Formação, experiência e proficiência dos técnicos envolvidos nas operações de manutenção; ― Fiscalização da execução da prestação de serviços pela entidade contratante, incluindo meios e fre quência; ― Critérios de seleção do prestador de serviços; ― Formação, treino e proficiência do pessoal de condução para lidar com situações de emergência; ― Aspetos de sobrevivência; ― Enquadramento legal do ascensor da Glória e da sua supervisão; ― Desenvolvimento das operações de socorro.Novo relatório em 45 diasO GPIAAF afirma que publicará um relatório preliminar "previsivelmente no prazo de 45 dias dando conta dos trabalhos de investigação realizados e das conclusões que estejam disponíveis nessa data". Será levado em conta "as eventuais restrições que decorram das obrigações decorrentes do segredo de justiça do processo judicial paralelo em curso".Somente após a conclusão da investigação e do procedimento de audição das partes relevantes, que será publicado pelo GPIAAF o relatório final "contendo os factos apurados, a sua análise, as conclusões sobre as causas do acidente e, se aplicável, recomendações de segurança". O prazo legal nos termos da legislação nacional e europeia para o efeito é de um ano.No entanto, ao antecipar que possa não ser possível atender a este prazo, o GPIAAF afirma que "publicará nesse momento um relatório intercalar, descrevendo o andamento da investigação e os problemas de segurança eventualmente detetados até então". O documento pontua que "dos factos expressos nesta nota não se deve presumir culpa ou responsabilidade de qualquer organização ou pessoa envolvida na ocorrência".Leia abaixo, na íntegra, a nota informativa..Cronologia da investigaçãoNa conferência de imprensa conjunta com os responsáveis da Polícia Judiciária (PJ), da direção executiva do SNS e do Instituto de Medicina Legal, realizada na quinta-feira na sede da PJ, o diretor do GPPIAF tinha adiantado que este gabinete esteve no local do acidente na manhã desse dia a identificar indícios, os quais se encontravam "em fase de processamento", afirmando ainda que os destroços do elevador acidentado e do elevador que ficou praticamente intacto serão "transportados para local seguro onde serão sujeitos a peritagens técnicas", que, envolvendo várias entidades, vão ser feitas sob coordenação do gabinete.Conforme o DN noticiou, o GPIAAF está a trabalhar com a PJ na investigação criminal. Este Gabinete já tinha também participado no inquérito da PJ ao helicóptero de combate a incêndios que se despenhou no Douro causando a morte a cinco militares da GNR.O que é o GPIAAF?O GPIAAF é a estrutura tecnicamente especializada na investigação de acidentes aéreos e ferroviários, contudo, tem apenas dois investigadores - o próprio diretor Nelson Oliveira e outro perito. Na conferência de imprensa, o responsável do GPIAAF reconheceu que espera desde março por uma autorização do governo para admitir mais um investigador, ainda que tenha sublinhado que, mesmo que tal acontecesse rapidamente, isso não resolveria o problema “no imediato”."Um investigador, para ser formado, necessita de dois anos. [Mas] tenho a convicção de que, seguramente, o Estado português irá dotar muito brevemente o GPIAAF com os meios que necessita, porque o respeito às vítimas que houve este incidente assim o exige”, sublinhou Nelson Oliveira..Casal com ligações ao teatro entre as três vítimas britânicas no descarrilamento do Elevador da Glória.Explicou Oliveira que o objetivo do GPIAAF é "identificar as causas relevantes com vista à melhoria da segurança deste modo de transporte e nunca a procura ou atribuição de responsabilidades, a qual compete ao Ministério Público, através da ação da PJ", ainda que as diferentes investigações sejam feitas "em perfeita coordenação" em que é necessário "partilhar a mesma prova". "Existe um manancial bastante grande de documentação relativo a tudo o que diz respeito à manutenção, procedimentos e tudo mais que são relevantes serem estudadas e isto é um processo longo", disse o responsável."Preparam-se também as entrevistas que iremos realizar às pessoas diretamente envolvidas e às pessoas envolvidas com a parte de manutenção, gestão e tudo mais daquele modo de transporte e que são relevantes para o cabal esclarecimento, quer dos factos imediatos, quer, mais importante, dos factos remotos, ou seja, os fatores subjacentes que resultaram neste infeliz acidente de ontem", acrescentou.Nelson Oliveira garantiu ainda o empenho do GPIAAF para evitar que acidentes como o de quarta-feira se repitam. "Tudo faremos para que deste trágico evento sejam retirados todos os ensinamentos de segurança necessários para evitar outros acidentes similares, por forma a que pelo menos o sacrifício destas vítimas não tenha sido em vão. Eu sei que isto é uma pequena consolação, mas é para isso que nós trabalhamos, é para que com estes infelizes eventos se tirem lições para que tal não volte a acontecer", disse.valentina.marcelino@dn.ptamanda.lima@dn.pt.Presidente da Carris colocou o lugar à disposição, mas Moedas travou demissão.Desastre do elevador da Glória: PJ tem manutenção na mira. Destroços foram apreendidos e estão em local seguro