Quem chega ao Rossio, em Lisboa, junto à estátua de D. Pedro IV, não encontra qualquer vestígio arqueológico do grande circo romano que ali existiu. No entanto, este local será um dos 44 sítios que fazem parte do programa do Open House Arqueologia, que vai decorrer na capital no fim de semana de 14 e 15 deste mês. “Não há vestígios, não há pedras, não há nada”, admite Lídia Fernandes, coordenadora do Museu de Lisboa – Teatro Romano, que organiza a iniciativa, e que, entre 1995 e 1997, integrou a equipa de arqueólogos que escavou ali aquele que foi este grande achado..Estava a proceder-se a obras da expansão do Metro de Lisboa e era necessário abrir um poço na praça D. Pedro IV para que a máquina Maria Lisboa, “uma toupeira gigante”, abrisse o túnel. Foi aí, a sete metros de profundidade, que se encontraram vestígios da spina, parte central da arena do circo romano que ali foi edificado muito provavelmente no século II. “O que foi escavado justifica a ida a um local onde não se encontra nenhum vestígio”, diz Lídia Fernandes. Aliás, após estudada, fotografada, registada e arquivada, “essa parte teve de ser destruída”. Houve receios de que os participantes na Open House Arqueologia se sentissem defraudados mas a importância deste local para aquilo que Lisboa é atualmente justificou a sua inclusão no programa. “A cidade atual deve a sua fisionomia ao circo romano”, explica a arqueóloga..Este será o único local da terceira edição do Open House Arqueologia sem qualquer vestígio arqueológico. “Tudo o resto são estuturas que, em maior ou menor quantidade, têm vestígios”, garante Lídia Fernandes. Com o programa anunciado há poucos dias, há espaços para os quais as visitas já estão esgotadas. “Queremos tornar a arqueologia inclusiva”, realça a responsável, lembrando que as visitas são guiadas, em muitos casos, pelos próprios arqueólogos que as escavaram e realçando que estes, apesar de serem muitas vezes considerados “uns empata-obras”, darão um testemunho muito profundo e rico acerca do que resistiu à passagem do tempo e à necessidade de modernização da cidade..E “há exemplos muito curiosos” na programação, que inclui visitas a hotéis, museus, lojas, chafarizes, casas particulares e até parques de estacionamento. Na Praça Luís de Camões, quando se construiu o parque que agora lá existe, foram postas a descoberto as ruínas dos Casebres do Loreto, do século XIX, e as estruturas do Palácio do Marquês de Marialva, de meados do século XVII. No Campo das Cebolas, na reabilitação realizada em 2016, encontraram-se um cais pombalino e duas embarcações do século XIX. “É um dos parques de estacionamento mais bonitos da cidade”, opina a arqueóloga, garantindo que esta é uma visita “absolutamente extraordinária”..Imagem de 2017, de quando se descobriu um cais e uma embarcação no subsolo do Campo das Cebolas. Reinaldo Rodrigues/Global Imagens.Imagem de 2018, aquando da inauguração do Campo das Cebolas após requalificação. Diana Quintela/Global Imagens.A visita guiada ao parque de estacionamento do Campo das Cebolas explica tudo o que existia e que foi preservado ao detalhe. EGEAC/José Frade.No Corpo Santo Hotel, há um troço da Muralha Fernandina e vestígios da Torre de João Bretão e do Palácio Corte Real, “uma coisa fantástica”. Já no Memmo Alfama, existem vestígios de fornos do século XIX, de uma antiga vila operária e de estruturas de um palácio. No Museu do Dinheiro, encontra-se um troço da muralha de D. Dinis e deste mesmo palácio. Numa garrafeira, poderá ser visto um tanque romano de salga de peixe e, numa casa particular da Rua de São Mamede aquilo que resta do edifício pombalino ali erguido..Casa particular na Rua de São Mamede. EGEAC - Museu de Lisboa/ José Avelar.Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática. Gerardo Santos / Global Imagens.No próprio Museu de Lisboa – Teatro Romano, a visita mostra uma habitação do século XVII/XVIII, danificada pelo terramoto de 1755, mas com algumas estruturas ainda visíveis, às quais, excecionalmente, será possível aceder..Vestígios de uma casa Pré-Pombalina no Museu de Lisboa - Teatro Romano, EGEAC/ José Frade.O Museu Nacional de Arqueologia, que atualmente se encontra encerrado para obras, oferece a oportunidade única de conhecer a ala do Mosteiro dos Jerónimos onde se instalou em 1903 e compreender a evolução do monumento do século XVI até ao século XX. O Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática, equipamento que guarda materiais arqueológicos recolhidos em meio aquático, também integra o programa do Open House Arqueologia, iniciativa que tem vindo a conquistar cada vez mais participantes e a agregar mais visitas. Este ano, são 111 no total. “Há pessoas que andam num virote a tentar percorrer os sítios todos”, comenta Lídia Fernandes. Mas para isso é necessário efetuar inscrição por mail através do endereço openhousearqueologia@museudelisboa.pt.