Bispo de Setúbal quer campanhas eleitorais centradas nos "problemas reais" e apela à “participação política"
"Não votemos nos mais simpáticos ou nos mais ruidosos, apenas porque parecem mais simpáticos ou porque revelam maior capacidade na luta verbal dos debates… sejamos mais exigentes com as candidaturas e connosco próprios". O apelo é do bispo de Setúbal, que pede, esta quarta-feira, "uma participação política de todos", tendo em conta o preenchido calendário de eleições (legislativas, autárquicas e as presidenciais de janeiro).
Numa nota episcopal, divulgada esta quarta-feira, Américo Aguiar espera ver os protagonistas políticos a falar do que realmente preocupa os portugueses nas campanhas eleitorais. "Mais que slogans vazios e ocos, procuremos escutar e dialogar com quem fale dos problemas reais e das respetivas soluções", considera, referindo-se, por exemplo, às dificuldades sentidas na saúde, educação ou na habitação.
"Exijamos saber o que cada candidato pensa, o que propõe, o que quer efetivamente fazer. Exijamos respostas aos problemas reais dos cidadãos e das nossas comunidades", lê-se na nota episcopal.
Américo Aguiar salienta a "política que escuta a realidade, que está ao serviço dos pobres, não da que está escondida em grandes edifícios com longos corredores".
"Falo da política que se preocupa com os desempregados e sabe muito bem como pode ser triste um domingo quando a segunda-feira é um dia a mais sem poder ir trabalhar".
O cardeal apela ainda, "com humildade, mas também com veemência", à participação neste preenchido período eleitoral. Em todas as eleições, prossegue, "os católicos têm a obrigação de participar, mas não só."
"É necessário, eu diria mesmo, é urgente que os princípios e valores cristãos se vejam de forma clara e assumida na vida dos partidos e dos movimentos políticos", diz Américo Aguiar, acrescentando: "Já lá vai o tempo em que era normal ouvir referências à ala católica da bancada A ou B, do partido C ou D, ou ainda dos movimentos aos sindicatos e em tantas outras estruturas de representação política e ou partidária".
O Bispo de Setúbal pede que não se alimente “'assassinatos de caráter', de destruição de pessoas e famílias com base em boatos, denúncias que apenas servem para retirar do caminho os concorrentes adversários".
Para o cardeal, é necessário "escutar aqueles" que "não embarcam em soluções mágicas, fantasiosas e imediatas". "Na verdade, escutar aqueles para quem cada pessoa é o centro e a razão primeira do tão nobre exercício da política."
A República arrisca-se, isto é, arriscamo-nos a não poder contar com a disponibilidade de concidadãos com capacidades de excelência para servirem a res pública
Américo Aguiar
Sem especificar, chama a atenção para a necessidade de se "desenvolver mecanismos de defesa dos eleitos, quando infelizmente caem e/ou são arrastados para a lama, sendo inocentes". Defende, por isso, que "a presunção de inocência tem de ser aplicada sempre e a todos".
"Com tudo o que temos vivido e testemunhado em prol de tantos casos, nas últimas décadas, a República arrisca-se, isto é, arriscamo-nos a não poder contar com a disponibilidade de concidadãos com capacidades de excelência para servirem a res pública, porque naturalmente não estão dispostos aos riscos da forma atual de fazer política, nem as suas famílias", analisa.
Conclui ao referir que é necessário "um debate profundo, sem populismos, em torno do Estatuto dos eleitos, das remunerações, das incompatibilidades, penalizações e defesa". "Se não o fizermos, todos perderemos direitos enquanto cidadãos com deveres cívicos", afirma o cardeal na nota episcopal.