Os diretores de turma (DT) têm excesso de trabalho burocrático e muitas responsabilidades. O próprio Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) assim o reconheceu ao avançar com uma medida de apoio aos DT, ainda em junho de 2024, prometendo a contratação de 140 técnicos superiores (um investimento de 2,5 milhões/ano). A medida foi aplaudida pela comunidade escolar, mas acabou por não sair do papel. Esses técnicos deveriam ter chegado às escolas em setembro do ano passado, para assumir algumas tarefas que, muitas vezes, não são diretamente ligadas às escolas, como contactos com Segurança Social, CPCJ e Tribunal de Menores. Segundo Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), à data de hoje “não houve qualquer avanço da medida”, que “foi anunciada e desapareceu. É uma medida que seria bem acolhida pelas escolas, pelos DTs. É uma função muito exigente, que dá muito trabalho aos professores e deve ser valorizada”, lamenta. O atraso, adianta, podia ser colmatado com outras medidas, como “a atribuição de mais horas letivas no horário dos DT ou até uma compensação monetária”. Contudo, frisa, o ideal “era mesmo que esses técnicos fossem contratados e estivessem em todos os agrupamentos”. Isto porque, explica, “o número de técnicos anunciado não chegará para os 811 agrupamentos escolares que existem no país”. Filinto Lima acredita que a causa do atraso possa estar ligada à falta de investimento em recursos humanos. “Por isso, dirijo aqui palavras ao ministro das Finanças, nesta altura em que se discute o Orçamento do Estado”, para que não se esqueça desta medida tão importante para os diretores de turma e as escolas”, sublinha. O diretor da ANDAEP destaca o “cansaço extremo” dos docentes, uma classe envelhecida, aliada a uma função de grande desgaste como é a Direção de Turma. “É uma carga de trabalho muito grande, que implica muitas horas de dedicação fora do horário laboral e os professores já estão esgotados com aulas para preparar e testes para corrigir”, frisa. Filinto Lima exemplifica com o número cada vez maior de docentes que, após consulta de Medicina do Trabalho, veem essa função ser retirada. Professores recusam horários quando sabem que terão Direção de TurmaCristina Mota, porta-voz da Missão Escola Pública (MEP), um movimento apartidário de professores, diz não estar surpreendida com o atraso da medida anunciada pelo MECI. “Este incumprimento confirma o retrato que a MEP tem vindo a identificar: uma tutela que privilegia anúncios mediáticos e promessas que soam bem à opinião pública, mas que raramente se traduzem em ações reais no terreno. É um padrão político já demasiado evidente: proclama-se mudança, mas nada muda; anunciam-se apoios, mas que ficam no papel ou se arrastam indefinidamente - como o apoio à deslocação, que foi aprovado, mas continua por pagar em muitas escolas”, explica. Apesar de entender que a chegada dos técnicos especializados “não iria resolver os problemas estruturais do trabalho de DT”, acredita que seriam uma ajuda. “A função de Diretor de Turma exige conhecimento profundo dos alunos, das famílias, dos contextos sociais e das dinâmicas da escola - nenhum técnico externo substitui isso. O que estava em causa não era transformar a função, mas aliviar tarefas burocráticas que consomem tempo e energia, necessários ao trabalho pedagógico e de acompanhamento dos alunos”, conta.Cristina Mota alerta para a exigência e trabalho do cargo de DT, uma realidade que, afirma, leva “candidatos à docência, a recusarem horários com Direção de Turma, precisamente devido ao desgaste, responsabilidade e volume de trabalho associados à função”. “O cargo está a ser entregue frequentemente a professores sem experiência ou sem formação, o que tem levado a erros processuais, reuniões repetidas, classificações revistas e uma pressão adicional sobre os restantes docentes”, denuncia. A porta-voz da MEP garante que, “outrora, os professores mais experientes conseguiam orientar os mais novos; hoje, a sobrecarga é de tal ordem que ninguém tem tempo para apoiar quem chega”. Cristina Mota vai mais longe e afirma que, “ao contrário do passado, muitos recursos humanos entram nas escolas sem qualquer noção do que é ser DT, sem formação e sem acompanhamento”.A professora entende haver, por parte do Governo, uma “falta de consciência do trabalho fulcral, mas extenuante, dos DT”, pois se assim fosse, “há muito que atribuiria mais horas para o cargo, ou acrescentaria um suplemento remuneratório”. “Como temos vindo a alertar, há um desconhecimento do terreno por parte da tutela”, acusa.A MEP exige que o Governo “assuma a responsabilidade pelos anúncios que faz e que, em vez de multiplicar promessas, comece finalmente a garantir condições reais para quem trabalha no terreno”. “Os DT não precisam de slogans políticos: precisam de tempo, condições, estabilidade e respeito pelo trabalho essencial que desempenham nas escolas”, conclui.O DN contactou o MECI, mas até à hora do fecho desta edição não obteve esclarecimentos.