Preferia entrar na Convenção Nacional sabendo que teria à sua espera alguém para lhe disputar a liderança da Iniciativa Liberal (IL)?É óbvio que seria sempre mais interessante para o debate, para ajudar a trazer ideias novas e para os desafios que a IL tem pela frente, que houvesse uma candidatura alternativa. É sempre saudável que isso aconteça nos partidos. Mas estou à espera de que, mesmo que sendo só uma candidatura, haja abertura por parte dos membros de irem ao púlpito e darem as suas sugestões e fazerem as suas críticas, porque isso é óbvio que acaba sempre por ser muito proveitoso para quem está na posição de contar com esses contributos e tentar aproveitá-los ao máximo. Portanto, uma coisa pode não condicionar a outra.Não teme que alguém lhe venha a dizer que foi uma vitória por falta de comparência?Não, não temo. A Convenção tem 900 e muitos inscritos, e isso é um ótimo sinal. Espero que as pessoas que estão lá, ou participam remotamente, participem o mais possível, deixem os seus contributos e tenho a certeza que sairemos todos bastante mais enriquecidos.Pegando numa frase que é muito cara ao partido, o que é que é preciso fazer diferente para não obter resultados iguais? A IL elegeu oito deputados em 2022, oito deputados em 2024, e nove deputados em 2025.É preciso voltar aos princípios fundacionais da IL, com uma comunicação um pouco mais disruptiva, irreverente e combativa. Temos propostas muito boas para mudar o país, mas são tecnicamente densas e, muitas vezes, nos órgãos de comunicação social nem sempre se consegue explicar as coisas em detalhe. Esse trabalho já tem vindo a ser feito, mas temos de continuar a insistir em conseguir transformar as nossas propostas numa comunicação simples, de entendimento fácil, que toda a gente consiga perceber. E que nos ajude a desmistificar algumas das ideias que foram criadas, algumas profundamente erradas, sobre aquilo que a IL defende. É inacreditável que em 2025 ainda se continue a dizer que quer privatizar tudo e mais alguma coisa, ou quer acabar com o Serviço Nacional de Saúde.É fácil traduzir isso, por exemplo, num vídeo de TikTok?É óbvio que temos de o conseguir fazer. Não podemos abandonar os fundamentos técnicos, todo o trabalho por detrás do desenvolvimento de uma proposta, mas temos de conseguir comunicá-la de forma simples, adaptada aos vários formatos, quer órgãos de comunicação social, quer as plataformas nas redes sociais, quer as intervenções na Assembleia da República. E isso também vai ajudar a que esses papões liberais, que lhes costumamos chamar, se desmistifiquem. Na verdade, a IL tem um programa muito concreto, uma ambição muito clara do que quer para o país e de como lá chegar. Isso implica o rigor técnico das propostas, mas também a coragem de defender coisas que nem sempre são mensagens fáceis de passar e que podem criar alguma resistência por parte das pessoas. Mas essa lógica muito concreta na fiscalidade e na reforma do Estado, na saúde, em temas que a IL trouxe inicialmente, hoje em dia não há um ator político que não refira isso. Isso pode ser um risco. Ninguém se lembra de quem são as lebres quenianas que fazem com que se batam os recordes mundiais.Mas tenho a certeza que as pessoas sabem que há um partido que defende acerrimamente um conjunto de coisas. Depois pode haver quem veja isso com algumas reservas, nomeadamente por causa das insinuações de que queremos privatizar tudo e coisas do género. E é preciso garantir que, mesmo as pessoas que olham com alguma reserva, conseguem perceber que não é isso que está em causa. Enquanto os governos estiverem preocupados em ganhar as eleições seguintes, em vez de ser em mudar o que está de mal no país, os resultados vão ser sempre os mesmos e vão ser sempre maus, ou aquém daquilo que é preciso. Temos pessoas a viver cada vez pior, serviços públicos que não funcionam, que a despesa do Estado continua a disparar e os governos não fazem as reformas necessárias. Na última campanha eleitoral, o que o Governo da AD tinha para anunciar eram aumentos em diversas carreiras na função pública. Isso é atirar problemas mais para a frente e garantir uma certa acalmia social. Mas os problemas estruturais mantêm-se. Pelo contrário, alguns até se calhar agravaram, nomeadamente na Saúde. Continuamos a ter perspectiva de um verão muito complicado, com inúmeras urgências fechadas e os problemas todos na reestruturação do INEM, a que a ministra da Saúde disse, em novembro, que iria dedicar 70% do seu tempo. Estamos em julho e não se fez absolutamente nada. Houve um período de gestão, mas não assim tão longo e muito poderia ter sido feito entretanto, tanto na altura como agora. E é essa urgência que nós temos de querer mesmo fazer as coisas e não estarmos preocupados tanto com o resultado eleitoral, mas sim com aquilo de que o país precisa, o que nos diferencia bastante dos outros partidos.Muitos analistas dizem que o falhou para a IL não ter tido um maior crescimento eleitoral nas legislativas não foi tanto a mensagem, e sim o posicionamento da liderança em relação à AD.Consigo perceber que possa mesmo ter contribuído para o resultado, que não foi o que esperávamos. Mas a IL quer mudar o país. Isso faz-se com políticas liberais a serem implementadas e a forma mais direta é conseguir fazer parte de soluções governativas. Também se exige à AD, e ao Governo, que faça muito mais do que tem feito. E esse deve ser o nível de exigência que temos de pôr. Mesmo estando na oposição, ser uma oposição construtiva a apresentar soluções de futuro. E fazer pressão junto do Governo pela urgência das reformas. Agora temos um Ministério da Reforma do Estado, que é algo muito querido para a IL, como imaginam. É preciso reformar o Estado para conseguir baixar impostos às pessoas, investir em Defesa e reformar outras áreas essenciais, como a Saúde e a Educação. Tudo isto está interligado. O Governo agora tem um Ministério da Reforma do Estado. E é óbvio que vamos fazer uma fiscalização profunda ao trabalho que será desenvolvido, sempre com a lógica de que é preciso tomar decisões difíceis. Muitas vezes é combater o clientelismo, as nomeações partidárias que não são assentes em mérito, mas nas relações partidárias, ou que mesmo assentes em mérito deixam as pessoas sempre condicionadas. Era importantíssimo que houvesse concursos abertos para as pessoas se poderem candidatar. E é preciso fechar organismos. Ficamos na expectativa de ver se, de facto, a AD vai ter essa coragem ou não. A IL teria sempre, porque tem a visão de um Estado mais eficiente, que, para funcionar melhor ao serviço das pessoas, não pode estar em todo o lado.."Tem de haver um combate muito predominante à extrema-direita e ao populismo, para garantir que direitos, liberdades e garantias nunca são postos em causa, pois muitas vezes o discurso e algumas das propostas infelizmente vão nesse sentido, mas também de combate ao conformismo crónico do lado do PSD e do PS."Mariana Leitão.Compreende que haja quem ponha em causa que a pessoa indicada para fazer melhor do que Rui Rocha seja uma das suas vice-presidentes, que ele escolheu para líder parlamentar e cabeça de lista no principal círculo eleitoral do país?Parece-me que uma coisa não está relacionada com a outra. A decisão de me candidatar à liderança é minha, no sentido de que acho que consigo acrescentar valor à IL. Não o faço nem por comparação nem por oposição com os meus antecessores. E fiz parte da equipa do Rui Rocha com muito orgulho. Agora é o momento de a liderança ser aquilo que a IL deve ser, face às alterações todas a que temos assistido no ciclo político. O crescimento dos populismos, e o resultado eleitoral francamente mau para a esquerda, criaram alterações profundas. Já não temos o bipartidarismo, uma luta de 50 anos entre PS e PSD. Agora temos outro partido líder da oposição e isso faz com que a IL tenha de se posicionar de forma diferente. Tem de haver um combate muito predominante à extrema-direita e ao populismo, para garantir que direitos, liberdades e garantias nunca são postos em causa, pois muitas vezes o discurso e algumas das propostas infelizmente vão nesse sentido, mas também de combate ao conformismo crónico do lado do PSD e do PS, de nunca mexer muito porque querem ganhar as eleições seguintes. É nestes dois combates que a IL tem de estar focada daqui para a frente, mantendo as propostas liberais que funcionam noutros países, que podiam ser determinantes para o futuro do país ser diferente e para as pessoas viverem melhor, que é aquilo que todos queremos.Ao suceder a João Cotrim de Figueiredo, Rui Rocha apontou a fasquia dos 15% para as eleições legislativas seguintes, que supostamente seriam em 2026. Planeia também estabelecer uma meta? Impor, depois do tripartidarismo, o quadripartidarismo?Eu quero que a IL cresça muito. Quando chegarmos ao momento vou estabelecer objetivos concretos. Para já, é prematuro estar a fazê-lo. É preciso reforçar algumas das nossas mensagens, a forma como as comunicamos e perceber bem as dinâmicas em nosso redor. Ainda há relativamente pouco tempo a AD dizia não é não. Agora há sinais de que afinal há disponibilidade para fazer acordos e governar, de ter apoio dos partidos com quem se dizia não é não. Tudo isto se vai alterando. Claro que quero estabelecer objetivos concretos e mensuráveis, mas nesta fase não faz sentido, com a instabilidade que ainda se está a viver, estar já a dizer que quero x ou y daqui a não sei quanto tempo. Conforme as circunstâncias da altura, será muito mais lógico e possível fazer essa determinação de objetivos. O caminho da IL é convencer eleitores da AD ou convencer eleitores do Chega?Eu acho que são os dois combates. Os eleitores têm atualmente os partidos em que votam, mas a certa altura vão estar desiludidos com a sua atuação, quer pela ausência de reformas e de mudança efetiva no país, que os eleitores da AD certamente terão. Quer, pelo outro lado, com o excesso de socialismo das propostas do Chega, e por ganharem a noção de que aquilo, não só em muitas matérias é atentatório de direitos, liberdades e garantias, mas nas matérias económicas, se fossemos pôr em prática um programa eleitoral do Chega, o país entrava em bancarrota passado muito pouco tempo. É a lógica de dar tudo a todos, sem saber bem como, nem onde se vai cortar. As pessoas vão perceber que nem de um lado nem do outro vai haver mudança efetiva. O Governo já está em funções há algum tempo - não muito, eu sei -, mas a grande alteração era a reforma do Estado, portanto fizeram um ministério para isso, mas não saiu ainda nem uma proposta, nem uma ideia, nada. Falou-se de digitalização, mas uma reforma do Estado é muito mais que isso. Quais são os organismos que vão cortar? Onde? Como? Quando? Quantas pessoas estão a trabalhar na função pública? Quantas é que fazem falta? Como justificamos que nos últimos 10 anos, se não me engano, o número de funcionários públicos tenha aumentado em mais de 100 mil, e os serviços públicos estejam no estado em que estão?Haverá quem diga que ainda era preciso contratar mais pessoas. Mas se calhar eram precisas pessoas numas áreas e não noutras. Neste momento não há informação - e duvido muito que o Governo sequer a tenha - que nos diga onde é que estas pessoas estão a trabalhar, o que fazem, e avaliar onde há falta de profissionais ou onde se calhar há funcionários a mais, que estão subaproveitados. Como se consegue fazer uma reforma do Estado se nem sequer as coisas mais básicas se sabe? Quantos imóveis é que o Estado tem? Quantos organismos há? Quantas empresas públicas ou com participação de capital público têm as contas em dia? Quantas foram encerradas por não cumprirem com esses requisitos? Duvido que alguém esteja sequer a garantir sequer o cumprimento de regras legais. A nossa visão é muito mais incisiva. Queremos perceber exatamente o que existe para sabermos onde precisamos de reforçar, onde precisamos de reduzir e o que podemos extinguir, nomeadamente observatórios, conselhos consultivos e uma panóplia de organismos.Esses observatórios acabam por ser os suspeitos do costume, sempre que se fala em reduzir o Estado. Vou dar um exemplo de algo que ainda há bem pouco tempo reparei. Estava em Coimbra, e vi no cartaz de uma exposição que eram sete os organismos públicos que estavam a ajudar ou colaborar na organização, Isto acontece em inúmeros setores, não tem nada a ver com a cultura em si. Na luta contra a corrupção há sete ou oito observatórios e conselhos consultivos e continuamos a não ter uma agenda concreta ou específica para um combate efetivo. Criam-se esses organismos para dar a ilusão de que se vai fazer alguma coisa diferente. Na prática não se faz, mas os organismos estão lá, têm pessoas a trabalhar, custam dinheiro e há dúvidas sobre o real benefício que têm, o que fazem, e o contributo que dão de facto, quer para o Estado, quer para as pessoas. O que é supérfluo ou que é repetido, tem de se cortar. E também no sector empresarial do Estado. Temos uma panóplia de empresas com capital do Estado que não têm benefício nenhum para as pessoas.Enquanto ex-candidata presidencial, até que ponto considera essencial que a IL apoie uma candidatura ao Palácio de Belém?Tenho esta convicção ainda antes de ter tomado a decisão de ser candidata à Presidência da República, porque para mim é mesmo muito importante e acho que a IL tem de apoiar um candidato liberal e que represente as ideias liberais, que faça a defesa acérrima da necessidade da reforma do Estado e de dar melhores condições às pessoas e às empresas, baixando impostos. A IL não pode estar de fora dessa corrida, e mantenho a minha convicção de que a IL tem de apoiar um candidato que defenda os valores liberais, que acredite profundamente neles e que faça essa defesa nesse campo de batalha eleitoral.Daqueles que já se apresentaram há algum que se aproxime do perfil traçado na moção da sua lista?Não. Até hoje a IL não elegeu nenhum vereador em listas próprias, tendo apenas o Ricardo Valente nas listas do movimento do Rui Moreira. Será uma derrota se não conseguir eleger sequer um vereador em listas próprias? Falamos de nomes como, por exemplo, Simões Almeida em Cascais, Bruno Mourão Martins em Oeiras, e Rui Rocha em Braga.Não, não acho que seja uma derrota. Há vários municípios em que nós sabemos perfeitamente que é muito complicado eleger um vereador. Importante é continuarmos a fazer esse combate, como temos feito nos últimos quatro anos, nas assembleias municipais e nas assembleias de freguesia. Aliás, revelou-se no combate a Isaltino Morais na Assembleia Municipal de Oeiras...São candidaturas feitas para conseguir alcançar esse objetivo de eleger vereadores. Agora, se isso não se verificar, não acho que seja uma derrota. Muito importante nas autárquicas é conseguirmos fazer o combate por coisas tão importantes como a transparência, a verdadeira reforma do funcionamento das câmaras municipais, nas quais existe alguma opacidade na contratação. E desburocratizar as questões do licenciamento e relacionadas com o urbanismo, com as exigências feitas às pessoas para conseguirem algo tão simples como fazer uma casa e ter uma licença para abrir um restaurante, uma loja ou o que quer que seja. Tenho a certeza de que os candidatos às câmaras municipais, às assembleias municipais e às assembleias de freguesia vão fazer esse combate, no caso de serem eleitos, e mesmo que não o sejam, pois continuam a ter uma voz.Em 2021 a IL já integrou algumas listas conjuntas com os partidos da AD e vai voltar a acontecer, o que já gerou alguma polémica no partido. É igual apoiar uma lista encabeçada por Luís Felipe Menezes ou uma lista encabeçada por Carlos Moedas?Há uma certeza nesses municípios e onde quer que haja coligações que sejam vencedoras: vamos ter pessoas da IL no executivo e ideias da IL a serem implementadas e a fazerem a diferença na vida das pessoas. A exigência de transparência, de garantir menos burocracia, processos mais ágeis e transparentes, menos compadrio e amiguismo, isso é aquilo que a IL conseguirá fazer. Não é igual em todos os sítios, mas onde se decidiu, e isso começa em primeira instância com as estruturas locais, que fazem esta avaliação, que havia a possibilidade de ter uma candidatura vencedora. Havendo possibilidade de termos as nossas pessoas a executar políticas liberais, é preciso assumir essa responsabilidade e coragem de fazer essas coligações, com grande potencial de serem vencedoras, para começar de facto a implementar políticas liberais. Isso vai ser determinante, acima de tudo, para quem está a viver nesses sítios e vai beneficiar dessas políticas e desse rigor que impomos em tudo. Portanto, não se trata de Luís Filipe Menezes ou de Carlos Moedas, mas do vereador ou dos vereadores da IL que vão executar políticas liberais. Termos políticas liberais a começarem a ser implementadas, um pouco por todo o país, e tenho a certeza de que com muito sucesso, vai obrigar também a AD a garantir que segue essas políticas, a garantir que esse rigor e transparência que exigimos, e que estará sempre a ser escrutinada por nós. Não é por estarmos numa coligação que deixaremos de o fazer. Muito pelo contrário, vai estar a ser medido, dia após dia, o que o Executivo está a fazer, se está a cumprir com os acordos de coligação, se está a tomar as medidas certas para benefício das populações.No limite poderá ser um laboratório para a governação de Portugal?São realidades muito diferentes, mas não tenho dúvidas de que será um ótimo laboratório para as pessoas verem o que é a aplicação de políticas liberais. A grande mais-valia destas coligações é as pessoas sentirem, no seu dia-a-dia, o que um programa liberal faz de diferente pela sua vida. Muitos membros do partido disseram que a Convenção Nacional se poderia realizar depois das autárquicas. Sente-se confortável com a responsabilidade pelo resultado da IL nestas eleições?Mais do que isso, acho mesmo que para o partido não havia melhor solução do que fazer já a Convenção, até mesmo por respeito a todos esses putativos autarcas que vão andar a trabalhar no terreno, afincadamente, durante um conjunto alargado de semanas, e também merecem ter uma liderança que os suporte, que os apoie, que lhes dê as condições de fazerem o seu trabalho e este combate político com todas as armas que for possível terem à sua disposição. Esse é também o meu compromisso, e estou muitíssimo confortável com a responsabilidade e muito motivada para este novo desafio.