Já foi eurodeputado, secretário de Estado e também deputado à Assembleia da República. Aos 66 anos, candidata-se à Câmara Municipal de Évora. Achou que era altura de voltar a casa e de se aventurar no poder local?Ao longo da minha vida, nunca fui de fazer planos ou de fazer escolhas. Fiz a minha vida académica em Évora, licenciei-me em Gestão, depois fiz a carreira universitária e sou professor catedrático. Acho que a minha dimensão académica me facilita a tarefa política, o meu gosto pela política potencia as minhas capacidades académicas e as coisas foram acontecendo com alguma naturalidade. Primeiro, fui gestor de um grande programa regional, o Pro Alentejo, que investiu 2.500 milhões de euros no Alqueva, entre outras coisas. Com alguma naturalidade fui deputado à Assembleia da República e fui exercer funções no Governo. Depois, fui para o Parlamento Europeu e agora voltei a Évora. Não era nada premeditado, mas tendo chegado à cidade e à minha universidade e ver que Évora está numa situação de alguma resignação, paragem, indignação, porque não se sente valorizada, não se sente à dimensão e no patamar que deveria ter… Senti que ainda tinha força, que ainda tinha energia para poder dar o meu contributo e criar um movimento, apoiado pelo PS, que me deu carta branca para escolher a equipa que eu entendesse e poder avançar com uma candidatura. Fui das primeiras candidaturas lançadas, a 14 de dezembro. Foi tão cedo exatamente porque queria pôr em prática um modelo de que falamos muito e não praticamos, que é o de ouvir as pessoas e as instituições. Conhecer mesmo a realidade e fazer propostas que adiram a essa realidade. O nosso programa, hoje, é o resultado de todo esse trabalho que fizemos em conjunto.A que acha que se deve essa resignação de que falou? A Câmara de Évora tem sido tipicamente CDU, só houve três mandatos do PS pelo meio destes 1976, acha-se capaz de apelar a um eleitorado que pode não ser exatamente o seu?Acho que é uma questão de quadro mental subjacente à própria gestão da câmara, que tem uma visão sufragada pela maioria dos eborenses. Mas é uma visão de manter Évora relativamente fechada e pequena. Uma cidade, enfim, relativamente calminha, porque o seu desenvolvimento e a atratividade mudariam o ecossistema, criando dinâmicas que depois não seriam controladas pelo partido no poder. Esse princípio é aplicado em muitas outras autarquias. Depois, e sobretudo neste último mandato, a fragmentação política em Évora é muito má. Temos uma câmara que é gerida por dois vereadores da CDU, depois tem dois vereadores do PS, dois do PSD e um vereador de um grupo independente. Essa fragmentação política transmite-se ao tecido económico, empresarial e associativo. Évora está muito fragmentada e isso faz com que acredite pouco em si. Está tudo muito dividido, tudo numa lógica muito defensiva. É preciso combinar duas coisas. Por um lado, retomar a ambição, mas isso por si só não resolve os problemas. Depois, há que ser muito pragmático e atacar de forma muito direta o que as pessoas sentem ser inaceitável, como o estado de limpeza que neste momento a cidade e o concelho têm, ou o trânsito, que é caótico. Além disso, o tempo que leva a licenciar-se alguma coisa na câmara ou a conseguir tratar qualquer processo é, de facto, muito limitativo. É fundamental cruzar estas coisas. Há que reposicionar Évora com a ambição de ser uma grande capital europeia ao sul, porque pode e deve sê-lo. E há também que resolver os problemas concretos das pessoas. . Falou na fragmentação. Há quatro anos, o PS ficou a 273 votos de vencer a câmara, mas ganhou a Assembleia Municipal, ainda que por apenas 345 votos. Caso isto se repita, como se consegue governar desta maneira?A minha mensagem aos eborenses é no sentido de que é fundamental para o concelho e para a cidade que isso não se repita. É fundamental que não haja fragmentação. E digo mesmo: se os eborenses entenderem que a maioria estável está num outro protagonista que não eu, então que se dê essa maioria estável a outro. Quando concebi as listas fi-lo de uma forma muito aberta, com muita gente independente e constituí mesmo um governo forte para a cidade. As quatro primeiras pessoas que são candidatas na minha lista foram escolhidas e pensadas para as funções fundamentais da reorganização e modernização da autarquia, no desenvolvimento sustentável, no associativismo e educação. O que proponho é um Governo para a cidade de Évora. Gostaria que os outros candidatos propusessem também, e que depois se escolhesse um governo. No nosso caso, temos um programa que tem um manifesto político, depois tem medidas de emergência, visíveis a 10 meses, e um programa de transformação para 10 anos. Só com um governo é que ao fim de quatro anos podemos fazer bem a avaliação democrática: se estamos a cumprir ou não estamos, e podemos fazer um caminho. Évora está de tal maneira num ponto de dificuldade que precisa de um tratamento democrático forte.Essas dificuldades são em que aspetos?Se falar com as pessoas na cidade, percebe que há uma grande desmotivação e há mesmo alguma tristeza com a situação em que Évora está, naquelas questões mais práticas que já referi. A câmara municipal tem um papel muito importante, mas está desestruturada e descapitalizada. É das câmaras com maior dívida no país. Isto conduz à desmotivação. A verdade é que em Évora é muito normal as pessoas perguntarem: “Como é que isto se pode fazer sem passar pela câmara?”. Ora, não se desenvolve um concelho quando o seu principal órgão democrático e representativo é um obstáculo e não é parte da solução. Há duas propostas-chave no meu programa que penso que são fundamentais. A primeira é criar um gabinete de projetos da câmara municipal, porque é das que menos aproveita os fundos estruturais e tem uma situação financeira muito periclitante. Neste momento, com a Capital Europeia da Cultura, perdemos a oportunidade de ter um pavilhão cultural multiúsos com o PRR. Perdemos a possibilidade de ter uma escola de dança porque não há um projeto com maturidade. No fundo, sinto que em Évora, se foi desenvolvendo uma cultura de fragmentação, de cada um por si. Uma cultura de salve-se quem puder. Évora perde imensos financiamentos porque não tem projetos. Évora não perderá mais nenhum financiamento por não ter um projeto preparado. O novo hospital central, por exemplo, é uma enorme oportunidade para Évora e para a região, mas não pode ser apenas um hospital central. Se o for, vai ter muita dificuldade em atrair, como já hoje tem, os profissionais de saúde. . E como se resolve essa questão? Há possibilidade com esses fundos estruturais, por exemplo, de se construir mais uma residência de estudantes na cidade?Temos uma vontade forte de protocolar com a Universidade de Évora soluções robustas para um problema que é, de facto, muito complicado. Este ano, mais uma vez, haverá um número de estudantes colocado que não corresponderá aos estudantes inscritos, porque não vão ter condições para se fixar em Évora. A curto prazo, temos também de apostar muito no reforço das redes viárias, e em particular na acessibilidade ferroviária.. Recentemente, houve uma questão que levantou muita polémica, que foi a das automotoras no Intercidades, em que devido a um incidente, o material circulante era escasso, e então a CP teve de fazer essas trocas. Como está a situação?O que aconteceu com as automotoras é um sinal do abandono, em termos ferroviários, de muitos anos em Portugal. No fundo, a partir do momento em que houve um acidente, foi necessário um comboio passar para outro sítio, e aquelas automotoras foram uma solução de recurso. Acho que não se pode repetir e tem de se minimizar ao máximo o risco disso voltar a acontecer. Mas a verdadeira solução não é essa, mas sim a integração de Évora na rede de acessibilidades. Os IP estão a ser constituídos, e isso também nos vai ajudar a fazer circulares à cidade, que vão dar outra dinâmica de acessibilidade, e a ligação Sines-Badajoz, que é agora mercadorias, mas tenderá também a ser passageiros até Lisboa. Uma cidade que é capital europeia ao sul, património mundial, que vai ser Capital Europeia da Cultura, e que ficará próxima do novo aeroporto, só pode ser uma cidade e um concelho com enorme potencial. E é por isso que Évora Viva, como eu costumo dizer, é o slogan da nossa campanha, mas é, de facto, dar vida a uma ambição, de algo que é possível, de algo que nos deve mobilizar, e que, ao mesmo tempo, também nos vai ajudar a resolver os problemas. Essa é toda a diferença. Porque esta visão é ambiciosa, não de cidade-museu, não de cidade-conservação, mas cidade que tem orgulho em ser museu e da sua história. Tem orgulho daquilo que foi, mas sabe que pode ser muito mais.Que apelo deixaria, então, aos eborenses para o dia 12 de outubro?Um apelo muito forte que votem, porque é muito importante que o façam, que falem entre eles, que olhem para aquilo que é o potencial do concelho em que vivem e aquilo que pode acontecer. E que nessas conversas de cidadania percebam que Évora precisa de um governo forte. A minha mensagem é esta: Évora precisa de um governo forte e deve escolher quem está melhor preparado para o exercer..Autárquicas. João Oliveira: “Não queremos uma maioria absoluta para enfeitar a lapela".Évora. Com o PS a apanhar a CDU, o resultado é incógnita no concelho alentejano