O rés-do-chão era, na verdade, uma garagem, na Amadora, Lisboa, transformada em casa-biblioteca. Amplo, cheio de estantes, livros, discos de vinil, era onde Ruben de Carvalho conservava a coluna de som que comprou quando ainda era jovem e, há anos, ainda ligava para ouvir a música de que gostava, do fado ao jazz, passando pelos blues, género musical americano em que era especialista..Lá estavam coleções de jornais - foi jornalista, chefe de redação da Vida Mundial, do Avante! -, alguns posters a anunciar acontecimentos do PCP ou concertos. Foi, desde a primeira edição, em 1976, um dos organizadores da Festa do Avante!..Ruben era o único membro do atual Comité Central do PCP que tinha estado preso nas prisões da PIDE, a polícia política do regime ditatorial derrubado pelo 25 de Abril de 1974. "Tiveram a fineza de me apresentar todas as prisões do fascismo", ironizou, em entrevista ao Observador, em 2016..Politicamente, foi um defensor da solução governativa em que o PCP apoiou, no Parlamento, com o PEV e o BE, o governo minoritário do PS, e tinha tido a experiência autárquica na Câmara de Lisboa, como vereador da CDU, durante os anos em que António Costa foi presidente do município (2007-2013), que conheceu bem - "andei com ele ao colo" - por os pais serem amigos.."Votei favoravelmente esta solução que não marca nenhuma alteração particular da parte do PCP. Sempre defendemos a necessidade de uma alternativa de esquerda para a governação. Não tiramos nenhum coelho do chapéu", afirmou ainda ao Observador, recordando que em 2015 "criaram-se condições objetivas", os resultados eleitorais, "e subjetivas para que isso acontecesse"..Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva nasceu em Lisboa a 21 de julho de 1944 e aderiu ao PCP em 1970, depois de ter passado pela direção da comissão pró-associação dos estudantes do ensino liceal e da Faculdade de Letras, ainda na década de 1960..Foi preso pela PIDE seis vezes (esteve em Caxias e no Aljube), a primeira das quais em 1961 e a última a 7 de abril, 18 dias antes do golpe de Estado..Antes de ser militante comunista, foi também membro das comissões juvenis de apoio à candidatura de Humberto Delgado (1958) e da Comissão Democrática Eleitoral (CDE), nos anos 1960 e 1970..Após a Revolução dos Cravos, pertenceu ao MDP/CDE e, no I Governo Provisório, foi chefe de gabinete do ministro Pereira de Moura e deputado à Assembleia da República eleito em 1995..Jornalista de profissão, Ruben de Carvalho foi redator coordenador no jornal O Século, chefe de redação na revista Vida Mundial, na década de 1960, e também chefe de redação do semanário Avante!, órgão central do PCP, entre abril de 1974 e 1995. E foi depois cronista em vários jornais, como o Diário de Notícias..Numa altura em que eram poucos ou nenhuns os festivais de música em Portugal, a Festa do Avante!, da qual Ruben de Carvalho foi um dos organizadores, foi cartaz para muitas novidades. Num mundo dividido pela Guerra Fria, entre EUA e URSS, o festival mostrou, em palco, o Coro dos Cossacos de Kuban, mas também o rock dos Dexy's Midgnight Runners, o folk de Judy Collins, e ainda assistiu à estreia, em Portugal, de Chico Buarque..Ruben de Carvalho foi, além de jornalista, autor de vários livros, uns mais políticos, como o Dossier Carlucci-CIA, sobre o primeiro embaixador dos EUA em Lisboa após a revolução, e outros mais culturais, como As Músicas do Fado ou As Palavras das Cantigas, em que organizou um livro póstumo de José Carlos Ary dos Santos..Nos últimos tempos, tinha na Antena 1 o programa Radicais Livres, em que debatia com Jaime Nogueira Pinto temas da atualidade..Um à esquerda e outro à direita, recordou Nogueira Pinto hoje ao Público, se uma discussão chegasse a um impasse, havia solução: "Uma piada punha tudo no sítio."