"Não serei candidato presidencial nem nas próximas eleições nem noutras"
O primeiro-ministro, António Costa diz estar "100% disponível" para continuar a liderar o Governo até 2023, se vencer as eleições de 6 de outubro, garantindo que não será candidato a Belém nem nas próximas nem noutras eleições presidenciais.
"Seguramente, pode ficar já claro, para não alimentar qualquer tabu, que não pretendo ser candidato presidencial nem nas próximas nem noutras [eleições]. Cada um tem vocação para o que tem e a minha vocação não é essa", assinalou o líder socialista em entrevista à Lusa, depois de abordar a recusa de um convite para um cargo de topo ao nível europeu e o seu futuro político após deixar São Bento.
Costa explicitou que, no momento em que foi convidado para um cargo europeu (presidência do Conselho Europeu, segundo notícias veiculadas em jornais nacionais e estrangeiros), "não o podia aceitar" porque tinha "um compromisso com o país".
"Não gostaria de deixar a meio este trabalho", disse, apontando a "Agenda para a Década", com que o PS se apresentou às eleições em 2015, e que "exige ser prosseguida".
"A minha concentração é a 100% no país. É para esta função que estou 100% disponível para a cumprir até 2023", acentuou, embora assinalando que é preciso esperar pelo resultado das legislativas para saber se continuará à frente do executivo.
Quanto a um cargo na Europa, Costa não fechou completamente a porta, limitando-se a afirmar que não sabe se receberá outro convite.
"Veremos o que acontece a seguir. Nunca organizei a minha vida a pensar no que vou fazer a seguir, organizei sempre concentrando-me a 100 por cento naquilo que estou a fazer a cada momento. E o que estou a fazer é ser primeiro-ministro do XXI Governo Constitucional e candidato a deputado e a primeiro-ministro do próximo governo" concluiu.
O primeiro-ministro adverte que Portugal poderá cair numa "situação de impasse à espanhola" caso não saia "um PS forte" das eleições de 6 de outubro, ficando assim comprometida a estabilidade necessária à prossecução das políticas seguidas na atual legislatura.
"Seria um pouco incompreensível que nós deitássemos pela janela uma solução que tem funcionado bem para irmos cair numa situação de impasse à espanhola que, manifestamente, creio que não pode ser o futuro que cada um de nós deseja", dramatizou o líder do PS e do Executivo na entrevista à Lusa.
Costa defende que "a solução de estabilidade assenta na existência de um PS forte" e recorda que numa altura em que "todos procuram uma solução à portuguesa", seria "incompreensível" que se pusesse em causa um equilíbrio "absolutamente essencial" à prossecução das políticas atuais, deixando recados à esquerda e à direita.
"Se tivéssemos prosseguido a trajetória 'austericida' que estava a ser seguida, continuaríamos no percurso com uma taxa de desemprego acima dos 12%, continuaríamos a divergir da União Europeia e não estávamos a reduzir sustentadamente o défice", argumenta, num recado para a direita e evocando o período da 'troika'.
Para a esquerda, o líder socialista não esquece também as indiretas: "Se estivéssemos a entrar na lógica de renegociar a dívida, de não olhar ao défice, não teríamos recuperado a credibilidade internacional e estaríamos a pagar juros que asfixiariam quer a capacidade de recuperação de rendimentos, quer a capacidade de investimento nos serviços públicos, quer a capacidade de termos agora um programa de 10 mil milhões de investimento público".
"Foi o PS que conseguiu a garantia de estabilidade entre a recuperação de rendimentos e a redução de défice, entre um crescimento económico forte e a recuperação da credibilidade internacional, entre o desagravamento fiscal e a redução de dívida, uma maioria de esquerda na Assembleia da República, mas uma boa relação com o Presidente da República eleito por uma maioria distinta", assinala.
Comentando o período eleitoral, o secretário-geral do PS verifica a existência de "uma campanha de todos contra um", a oposição à direita (PSD e CDS), mas também os partidos que formaram a base parlamentar de apoio do Governo no parlamento (BE, PCP e PEV), e que "todos os dias procuram demarcar-se da solução de Governo".
O primeiro-ministro respondeu à "paciência revolucionária" que o secretário-geral do PCP disse ter tido consigo e com o PS com a sua própria "paciência reformista", e admite que essa foi uma das "grandes conjugações desta legislatura".
"Isso foi uma das grandes conjugações desta legislatura: a 'paciência revolucionária' do Jerónimo de Sousa com a 'paciência reformista' do António Costa", brinca, quando confrontado com o desabafo do líder comunista.
Questionado se com a coordenadora do BE, Catarina Martins, também se passou o mesmo, ou seja, se foi também preciso paciência, António Costa, responde: "Temos todos. A política é necessariamente um exercício de paciência, porque tem de ser um esforço contínuo de compromisso para encontrar soluções para problemas que são complexos".
A greve os motoristas de matérias perigosas - que levou o Governo a decretar a requisição civil - foi outra das matérias abordadas na entrevista. Sobre a paralisação, António Costa considerou que revelou uma "instrumentalização" de trabalhadores em prol de um candidato e, simultaneamente, uma "ingenuidade" por parte da comunicação social - Pardal Henriques, vice-presidente do Sindicato Nacional de Matérias Perigosas é candidato às legislativas pelo PDR.
"Manifestamente tivemos aqui um caso onde houve uma instrumentalização de um conjunto de trabalhadores para a promoção eleitoral de um candidato", diz António Costa, que concedeu uma entrevista à Lusa na sua residência oficial, rodeado dos quadros da nova coleção de arte contemporânea e que será aberta ao público na próxima terça-feira.
Quando questionado se poderá haver objetivos políticos por trás desses movimentos ditos inorgânicos, o líder do executivo concorda: "Se retirar o ponto de interrogação que é inútil na sua pergunta, tem a resposta".
Costa não deixa, contudo, de criticar a comunicação social, a qual acusa de "ingenuidade" no tratamento do tema: "Acho absolutamente extraordinário, se me permitem, a ingenuidade com que a comunicação social se dedicou a promover e levar ao colo alguém que tem um currículo, quer junto dos nossos emigrantes em França, quer junto das empresas que dirigiu, quer da publicidade ilícita que faz à sua atividade".
"Isso é que a mim me deixou perplexo, mas acho que seguramente a autorregulação da comunicação social há de ter tempo para refletir sobre a forma como tratou deste assunto", destaca.
Quanto à greve em si, Costa afirma que "a atividade sindical é essencial a qualquer sociedade democrática", e que não lhe compete a si dizer aos sindicatos como se orientam: "o Estado corporativo já está enterrado há muitos anos, e bem", sublinhou.
O primeiro-ministro também considera que os acontecimentos demonstraram que "o país tem uma notável maturidade para poder viver conflitos que poderiam ter sido de enorme dramaticidade, com uma grande civilidade".