EB 2/3 na Póvoa do Varzim: "Implementamos todas as medidas, mas contamos com o fator sorte"

No primeiro dia de "escola a sério", na Cego do Maio, pais e alunos encontravam-se num misto de alegria pelo regresso e de ansiedade provocada por mais um ano letivo atípico, com muitas regras a seguir neste "novo normal".
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À porta da escola EB 2/3 Cego do Maio (Póvoa do Varzim), os pais ficaram até perderem os filhos de vista. Seguindo as indicações à risca, que incluem higienização à entrada, circuitos de circulação delimitados, zonas de recreio específicas para cada turma, entre outras, os alunos entraram na escola em fila indiana, com livros e algum nervosismo "na mochila".

"O meu filho mudou de escola porque entrou para o 5º ano. Ontem foi a apresentação e hoje (18 de setembro) é que é a escola a sério. Ainda está um pouco desorientado porque tudo é novo. Ontem nem tomou pequeno-almoço. Hoje também foi difícil. Estava nervoso e agitado, mas com muita vontade de voltar para a escola depois tanto tempo em casa", conta ao DN, Cátia Lima, enquanto observa o filho ao longe. A encarregada de educação não esconde o medo, mas ressalva que o filho tem de voltar. "É preciso regressar ao normal e a escola faz muita falta, mas não há como não ter medo e acho que estes miúdos terão uma parte da infância mais limitada", conclui. No decorrer da conversa da encarregada de educação com o DN, no recreio amplo da escola, os alunos mais velhos punham a conversa em dia, numa clara alegria por rever amigos. As regras já tinham sido explicadas no dia da apresentação (ontem) e tudo decorreu como previsto. "Os alunos estão a cumprir com as medidas e tudo foi preparado "ao pormenor", afirma o diretor do Agrupamento de Escolas Cego do Maio, Arlindo Ferreira. "Em julho, preparamos o plano e enviamos toda a informação aos encarregados de educação", explica o responsável.

Com um máximo de 22 alunos por turma e o horário alargado até à 18.10 (no ano letivo anterior as aulas terminavam às 16.00) sobraram centenas de cadeiras. "Os alunos estão a 1,5 metros de distância uns dos outros, temos turnos desfasados entre o 2º e o 3º ciclo e zonas específicas para as turmas no recreio", explica Arlindo Ferreira. Nas salas, os lugares que podem ser ocupados estão assinalados com um ponto verde e o horário de entrada nas salas passou a ser "mais rigoroso": "Tivemos de fazer contas a tudo. Algumas salas, as mais pequenas, ficaram vazias e sem mesas que usamos para outras salas. Os intervalos, de 15 minutos, passaram de quatro a dois de manhã e de tarde. A sala de convívio conta agora com um limite de duas turmas (44 alunos) e os almoços também sofreram alterações. Começam às 11h50 e terminam às 13.55), com turnos. Contudo, ao contrário de anos anteriores, pedimos aos pais para que, se possível, levem os filhos para casa à hora de almoço", refere o responsável do agrupamento.

Esta sexta-feira, num universo de 600 alunos na EB 2/3 Cego do Maio, menos de uma centena comprou senha para a almoçar na cantina. "Aqui não temos rede de transportes. Os alunos fazem o percurso a pé ou vêm com os pais. Já era assim antes da pandemia e é menos um risco que se corre", explica. Contudo, ainda nem tudo está a funcionar em pleno. O bar dos alunos e o pavilhão polidesportivo estão fechados por falta de funcionários. "Precisamos de mais cinco assistentes operacionais e temos feito esse pedido diariamente", confessa Arlindo Ferreira. Além da escassez de assistentes operacionais há ainda um problema de falta de meios tecnológicos. "Se tivermos de dar aulas à distância, não temos forma de o fazer. Os computadores da escola não têm câmara e não temos condições para ter os professores na escola a dar aulas aos alunos que estejam em casa", sublinha. No entanto, quando as escolas encerraram, em março, "a escola conseguiu manter as aulas, pois os professores usaram os seus computadores, bem como os alunos".

Na sala de Ensino Especial da EB 2/3 Cego do Maio há apenas cinco alunos, aqueles que não conseguem usar a máscara, por terem deficiências graves. O espaço conta com tapete de higienização à entrada, distância social, materiais individuais e lugares próprios para cada mochila. Tudo está associado a uma cor, aquela que pertencerá ao aluno até ao final do ano. "Os alunos mudam de atividade a cada meia hora para se proceder a medidas de higiene. As casas de banho desses discentes é usada apenas por eles, não havendo partilha com os restantes grupos", explica a professora responsável pelo Ensino Especial. A escola tem muitos alunos de Educação Inclusiva, mas estão integrados nas turmas todos aqueles que podem usar a máscara de proteção.

"Vamos vendo se temos de ajustar medidas e como podemos melhorar a cada dia. Estamos preparados, mas contamos com o fator sorte. Mesmo com o cumprimento de todas as medidas, o risco existe", afirma Arlindo Ferreira. Um sentimento partilhado por Maria Graboswki, que sabe que não existe risco zero. "O meu filho tem nove anos e estava a precisar de conviver com os amigos, depois de ter passado seis meses com os pais", conta. O que mais preocupa a encarregada de educação é a utilização das máscaras várias horas consecutivas. "Não se como vai aguentar porque se sente aflito, mas é a única coisa de que se queixa. Foi muito animado para a escola, já o meu coração de mãe não está bem. Sou doente oncológica e estive resguardada até agora", confessa.

Maria Graboswki acredita que a maior preocupação do filho, conhecedor do problema de saúde da mãe, é a de levar "o vírus para casa". A mãe acrescenta ainda ter receio de voltar ao regime de aulas à distância, porque o filho não se adaptou muito bem e ela não o conseguiu acompanhar "em todas as matérias". Além do contágio, o medo de "voltar para casa" é o que mais causa perturbação. "O maior receio é ter de fechar portas. Não é ter um ou outro caso pontual, mas de que a pandemia escale e que tenhamos de voltar para casa", sublinha Arlindo Ferreira. O presidente do Cego do Maio é também autor do "Blog de Arlindo", um dos mais conhecidos na comunidade docente. "O blogue facilita muito o meu trabalho, pois consigo obter muitas opiniões e ter feedback. É um exercício de reflexão que me ajuda neste processo", conta.

Na EB 2/3 Cego do Maio, há três professores na biblioteca em permanência para substituir colegas que possam faltar. Contudo, se quatro turmas precisarem de substituição, "poderá já não haver solução". O mesmo se passa se o tempo não ajudar. "Com chuva, os alunos terão de passar os intervalos nas salas de aula", explica. Contudo, Arlindo Ferreira acredita que "as escolas estão mais preparadas" e tem esperança de que vá mesmo "correr tudo bem".

Emerson Fernandes foi hoje matricular a filha no 2º ano, no Agrupamento de Escolas Cego do Maio. A família veio viver para Portugal há três semanas "à procura se um lugar mais calmo". "A pandemia pesou na decisão, mas com tantos problemas que o Brasil tem, é quase um problema secundário", explica. A gestão da pandemia em Portugal e as regras implementadas no combate à covid 19 tranquilizam Emerson Fernandes. "Estou tranquilo quanto ao regresso à escola da minha filha. Viemos de um país tão descontrolado, que não há como que ter medo aqui", conclui. Já a pequena Maria, de sete anos, está "ansiosa para voltar a brincar com amigos". "Tenho saudades dos meus amigos e agora quero fazer muitos novos. Quero muito ir para a escola", conclui entre saltos de alegria. Recorde-se que o Brasil, um dos países mais afetados pela pandemia, permitiu a reabertura de escolas privadas ainda em agosto, mas a maioria dos estabelecimentos retoma este mês. O país soma 3,1 milhões de casos e mais de 134 mil mortes, o que o faz ocupar o segundo lugar a nível mundial em vítimas mortais, atrás dos Estados Unidos.

A Póvoa de Varzim foi um dos 18 municípios com mais de 50 infeções numa semana (entre os dias 6 e 13 de setembro).

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