Dois médicos, o empresário e a mulher que os une. Quem são os suspeitos da Teia de corrupção

Laranja Pontes tem 30 anos de serviço no IPO do Porto. Os socialistas Joaquim Couto e Miguel Costa Gomes têm vários mandatos cumpridos nas autarquias. O elo é Manuela Couto, mulher de Joaquim e dona de várias empresas de comunicação que estão no centro das suspeitas.
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Uma verdadeira surpresa, foi como caiu esta manhã a notícia da detenção de Laranja Pontes nos meios ligados à saúde no Porto. O médico que há 30 anos está ligado ao Instituto Português de Oncologia do Porto, como presidente do Conselho de Administração nos últimos 15 anos, é uma figura respeitada e, apesar de ser alvo de criticas à forma como gere a organização, estas prendem-se mais com a forma como se relaciona com os médicos, por exemplo, do que propriamente por suspeitas de participação em negócios ilícitos. Mas foi detido e está indiciado por corrupção passiva.

Laranja Pontes nasceu em Vila do Conde, em 29 de novembro de 1951, filho de um ferroviário, sendo o mais novo de seis irmãos. Na cidade a norte do Porto tem família e continua ligado ao concelho. Tem uma casa em Mindelo, freguesia do litoral onde existem várias moradias de segunda habitação, para os passeios à beira-mar, com a mulher, Maria da Graça, professora do Ensino Básico. Tem três filhas, revela um perfil publicado pela Notícias Magazine este ano.

Em 1976, licenciou-se em Medicina pela Universidade do Porto e tornou-se especialista em Cirurgia Plástica, Reconstrutiva e Estética. Mais de uma década depois chegou ao IPO, em 1989, para ser diretor de serviço. Acabou por chegar a presidente num percurso que levou 15 anos. No total já conta com mais de 30 anos ao serviço desta instituição.

É visto como uma pessoa teimosa e persistente. Por isso ganhou adversários como o atual bastonário da Ordem dos Médicos que, no passado, criticou o escasso diálogo que tinha com os médicos no IPO. Outro médico, Manuel Pizarro, que também é político - foi secretário de Estado da Saúde, é vereador da Câmara do Porto e foi agora eleito eurodeputado, não poupou elogios e no mesmo artigo da Noticias Magazine, referia a existência de "um IPO antes de Laranja Pontes e um IPO depois de Laranja Pontes". Descreveu Laranja Pontes como um amigo "meticuloso, austero, mas também muito cuidadoso com a família e com os amigos". O patologista Sobrinho Simões foi mais longe: "Graças a si e à sua equipa fez do IPO-Porto uma instituição excecional."

Este trajeto - que não se apaga com a investigação judicial - sai agora beliscado, embora não se conheça com pormenor as suspeitas de que é alvo. A empresa de comunicação de Manuela Couto, outra das detidas, tem contratos com o IPO que estão sob suspeita nesta operação.

O casal de Santo Tirso

Outros detidos são o autarca de Santo Tirso, Joaquim Couto, e a sua mulher Manuela, esta já arguida no processo similar que atingiu o Turismo do Porto e Norte de Portugal (Melchior Moreira permanece em prisão preventiva) em que foi detida pela PJ e ficou em liberdade com proibição de contactos com os outros arguidos e sob uma caução económica de 40 mil euros.

Figura com experiência na política, o socialista Joaquim Couto destacou-se como presidente da Câmara de Santo Tirso de 1982 a 2000, tendo regressado ao cargo em 2013. Após ter sido autarca, foi governador civil do Porto e deputado pelo PS. Chegou ainda a concorrer à Câmara de Gaia, onde foi vereador de 2009 a 2011. Nasceu em 1 de maio de 1951 e tem quatro filhos.

É igualmente licenciado em medicina e exerceu até 2001, segundo diz o seu curriculum vitae publicitado no site da Câmara de Santo Tirso. É o atual presidente do Conselho Diretivo da AMAVE- Associação dos Municípios do Vale do Ave, cargo que exerce desde 2016, e a nível político é presidente da Mesa da Comissão Política da Federação do Porto. Passou em diversas ocasiões pelos órgãos nacionais do PS.

Maria Manuela Couto, sua mulher , é administradora da W Global Communication (antiga Mediana), empresa de comunicação e organização de eventos, e de outras sociedades, com os mesmo fins, de que é sócia maioritária - sendo Luís Couto, filho de Joaquim Couto, outro sócio - como a My Press, Smart Win e Make It Happen, empresas que estão na mira dos investigadores devido aos contratos alegadamente viciados que realizaram com entidades e autarquias. A Câmara de Barcelos é uma das principais clientes da My Press e da Make It Happen.

As mesmas empresas são suspeitas de terem faturado serviços ao Turismo do Porto e Norte de Portugal, de forma fraudulenta. Manuela Couto, 48 anos, é arguida na Operação Éter, que investiga os negócios no turismo, e agora irá ter de defender-se em novo processo.

O autarca que a direção do PS segurou

Miguel Costa Gomes é presidente da Câmara de Barcelos desde 2009, estando a cumprir o terceiro e último mandato à frente da autarquia minhota. Nas últimas eleições autárquicas houve uma cisão no partido em Barcelos com o vice-presidente e líder da concelhia, Domingos Pereira, a divergir e lançar uma candidatura. Este chegou a ser indicado como candidato pela concelhia, apoiado pelo distrital de Braga, mas a Comissão Política Nacional do PS acabou por confirmar que seria Costa Gomes o candidato, sustentando-se na orientação definida por António Costa que os autarcas em funções seriam de novo candidatos. Pereira avançou como independente mas perdeu. Costa Gomes foi reeleito mas agora sem maioria.

Natural de Arcozelo, Barcelos, onde nasceu a 25 de novembro de 1957, Costa Gomes é ainda membro do Conselho Diretivo da Associação Nacional de Municípios Portugueses. Presidiu à Associação Comercial e Industrial de Barcelos antes de se candidatar em 2009 à Câmara Municipal de Barcelos pelo PS. É empresário e vai no terceiro mandato, com várias polémicas pelo meio que não impediram a sua reeleição por duas vezes.

Ao longo dos 10 anos, Miguel Costa Gomes teve várias frentes de batalha e é também alvo de algumas investigações judiciais. O processo da concessão da Águas de Barcelos foi um dos principais, com acusações ao seu antecessor Fernando Reis que chegou mesmo a ser julgado e absolvido do crime prevaricação de titular de cargo político. Contudo, Costa Gomes teve de enfrentar a decisão de um tribunal arbitral que condenou o município a pagar 217 milhões de euros à Água de Barcelos. Chegou a acordo extrajudicial e já este ano anunciou a intenção de contrair um empréstimo de 50 milhões de euros para o município ficar com 49% da empresa.

Mas há outros casos. Miguel Costa Gomes é arguido, tal como a vice-presidente da Câmara, Armandina Saleiro, num processo por alegado favorecimento de uma empresa de segurança. Houve buscas da PJ na câmara e em domicílios der arguidos, que serão mais de duas dezenas. Noutra investigação da PJ de Braga, o autarca é visado no licenciamento de um posto de abastecimento de combustíveis, na freguesia de Arcozelo.

Miguel Costa Gomes assumiu protagonismo autárquico com José Sócrates na liderança do PS. Sempre foi um seu apoiante e mesmo depois da Operação Marquês não deixou de elogiar o antigo líder socialista. "José Sócrates foi um grande primeiro-ministro e foi trucidado de uma forma injusta", afirmou, em 2017, numa entrevista ao jornal Sol.

O seu advogado, Pedro Marinho Falcão, já reagiu à detenção. "É inadmissível que um autarca deste país seja detido por um crime que não conhece, depois de terem sido feitas buscas de onde não foi retirado nenhum documento, nenhuma informação", disse, junto ao edifício da Polícia Judiciária do Porto.

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