Não cessa de me surpreender a indiferença dos nossos eleitos políticos, do Governo e da oposição, mergulhados em trivialidades, perante a questão existencial da paz e da guerra. A maior ameaça à nossa existência coletiva reside no silêncio e cumplicidade de quem nos governa e representa, perante aqueles, ao nosso lado, que alimentam o rastilho aceso à espera de explodir em todo o Velho Continente. O atentado contra Robert Fico - PM eslovaco e uma voz dissidente no consenso belicista da NATO -, ou a repetição na Geórgia dos protestos ao estilo de Kiev em 2013, são sintomas da catástrofe em marcha..A Rússia domina o campo de batalha. Contudo, como sempre escrevi, num conflito em que estão envolvidas quatro potências nucleares, a paz só poderá nascer do primado da política sobre as armas. Em cima da mesa deveria estar a necessidade de travar a escalada, cessar os combates, e assinar tréguas duradouras..Contudo, do lado ocidental prevalece um desordenado belicismo. Na Suíça vai realizar-se, sem a Rússia, uma provocação disfarçada de Conferência de Paz. Os EUA conseguiram desbloquear um novo e enorme empréstimo. Mais armas vêm a caminho. A “ambiguidade estratégica” de Macron parece traduzir-se no envio de efetivos da Legião Estrangeira para a frente ucraniana. Há dias, num lapsus linguae, o general norte-americano Bryan Fenton confirmou a presença de tropas especiais britânicas no campo de batalha. Cameron, encorajou Kiev a usar os mísseis britânicos contra alvos no interior da Rússia. Na Alemanha, o chanceler Scholz parece ser o único obstáculo ao recuperar da incendiária ideia de Zelensky, que colocaria a NATO a fechar o espaço aéreo ucraniano. No dia 13, falando para jovens, Jens Stoltenberg, SG da NATO, condicionou, num exercício de chantagem cruel, o apoio do Ocidente à reconstrução da Ucrânia, à exigência de este país “prevalecer” sobre a Rússia..Em síntese, os aliados portugueses da NATO, têm como política a intensificação da guerra. Será que o PR, o PM e a AR não compreendem a loucura onde isto nos irá conduzir? A Ucrânia está a ser destruída, desde fevereiro de 2022, porque os EUA e a UE pensaram que a Rússia fazia bluff quando advertia que Kiev na NATO era uma linha vermelha. Se essa lição não foi aprendida e, em vez da diplomacia, insistirmos em guerrear a Rússia diretamente, não tenho dúvidas de que 2024 poderá ser o último ano da vida de muitos nós..Portugal podia e deveria ser uma voz de moderação dentro da NATO. O que nos resta de soberania alimenta-se da capacidade de não cortarmos laços com um mundo, que fomos pioneiros a construir. O Governo e o Parlamento portugueses não têm nada a dizer sobre esta estulta estratégia da NATO? Apoiamos uma via de ação que, a ter sucesso, poderá fazer do nosso país um dos alvos mais prováveis de um ataque (não teríamos, ao contrário de Paris e Londres, meios de retaliação)? Será que a nossa democracia, nascida da coragem dos militares, irá perecer pela cobardia do poder civil?.Talvez fosse bom meditar nas palavras do presidente colombiano, Juan Manuel Santos, que em 2016 acabou com a longa Guerra Civil que opunha o Estado às FARC. Reagindo às críticas dos que o acusavam de não levar a julgamento os líderes dos guerrilheiros, ele afirmou: “A paz perfeita não existe, porque a paz perfeita implica a justiça perfeita e a justiça perfeita torna impossível a paz. É uma paz imperfeita, mas sempre é melhor uma paz imperfeita que uma guerra perfeita.”