Este é o primeiro texto de uma colaboração quinzenal e o último deste ano. Entre um começo e um fim, há um tema que se impôs à Europa e lhe devolveu a consciência do essencial: a Defesa.Durante décadas, o projecto europeu viveu confortavelmente ancorado numa ilusão. A de que a guerra pertencia ao passado, a de que a segurança era um dado adquirido. A invasão da Ucrânia, em 2022, depois de um aviso claro em 2014, destruiu essa fantasia. Foi o regresso da ameaça imperial e da guerra como instrumento político. A Rússia mostra que não aceita fronteiras quando estas não coincidem com a sua ambição histórica e que vê a força militar como instrumento legítimo de política externa. Não estamos perante um mal-entendido geopolítico, mas perante um projeto de poder.A Europa reencontrou-se precisamente porque percebeu que a paz não se garante com boas intenções, mas com capacidade de dissuasão.A Europa está hoje mais lúcida. Sabe que não pode terceirizar eternamente a sua segurança. Sabe que a paz se defende. Sabe que gastar mais em Defesa não é escolher a guerra. É escolher a liberdade. É decidir que queremos continuar a viver em sociedades abertas, democráticas e seguras. A União reagiu primeiro com sanções económicas à Rússia e, finalmente, com aquilo que durante demasiado tempo evitou: uma reflexão séria sobre a sua própria capacidade de defesa. O apoio militar à Ucrânia, o reforço da NATO, o aumento coordenado do investimento em Defesa e o desenvolvimento de uma base industrial europeia deixaram de ser tabus. A dissuasão voltou ao centro do pensamento estratégico europeu.Também a relação transatlântica entrou numa nova fase. Os Estados Unidos continuam a ser aliados centrais, mas a imprevisibilidade eleitoral, o foco crescente no Indo-Pacífico e as prioridades divergentes obrigam a Europa a assumir responsabilidades e a reconhecer a menoridade estratégica confortável que adiou durante décadas. Não por hostilidade, mas por realismo.Fala-se hoje de dissuasão como condição da paz, de capacidade militar como garante da diplomacia, de indústria de defesa como ativo estratégico. Não por belicismo, mas por lucidez. E a lucidez começa por não confundir o agressor com o agredido. Na Sala Oval ensaiou-se a equidistância, no Alasca procurou-se a neutralidade. A realidade em Kyiv encarregou-se de expor o erro dessa opção.Também em Portugal, pela primeira vez em muitos anos, investir nas Forças Armadas deixou de ser visto como um capricho ou uma extravagância ideológica. O Governo PSD/CDS reafirmou a Defesa como uma política de Estado, colocando-a no centro das prioridades estratégicas nacionais. O trabalho do Ministro da Defesa Nacional tem sido decisivo neste percurso, ao articular investimento, estratégia e responsabilidade internacional. A modernização das capacidades, o respeito pelos compromissos assumidos e a valorização dos militares sinalizam uma transformação estrutural. Trata-se de uma mudança de mentalidade e de política pública, não de um mero ajustamento orçamental ditado pela conjuntura.A Europa termina 2025 a olhar para a Defesa não como um desvio do seu projecto político, mas como a sua prova de maturidade. Não como uma excepção ditada pela urgência, mas como uma condição da liberdade e do reconhecimento de que sem força credível não há diplomacia eficaz.