Novo ciclo político

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O nível de participação eleitoral e a boa organização das eleições presidenciais foram revigorantes. O compromisso dos portugueses com a democracia é sólido e, mesmo em pandemia e com a mais que previsível vitória de Marcelo, mais de quatro milhões de portugueses foram às urnas.

A expressiva vitória de Marcelo Rebelo de Sousa reforça a legitimidade da sua opção por uma forte cooperação institucional com o governo, que tanto incomodou os dirigentes dos partidos da direita, mas que é apoiada pela grande maioria dos eleitores.

Apesar da crise pandémica, a oposição deverá intensificar as críticas às medidas de combate à pandemia, mas o Presidente sabe que, na situação crítica que vivemos, o sentido de Estado tem de estar acima da luta política. Ao horror destas semanas poderá seguir-se a esperança numa primavera muito melhor, mas para tal é preciso não abrir brechas na estratégia definida.

Ao mesmo tempo, é preciso salvar a economia e os empregos. A dimensão da crise é tal que só as medidas de apoio às empresas e ao emprego, que precisam de ser mantidas, têm evitado uma catástrofe social. O que seria se a receita austeritária da direita estivesse agora a ser aplicada...

Entretanto, a estratégia de recuperação está a ser preparada, com uma forte componente de fundos europeus. É essencial que esses fundos cheguem depressa à economia, o que infelizmente depende mais de outros países e da burocracia de Bruxelas do que da iniciativa do governo. Mas a recuperação requer também um esforço significativo do Orçamento do Estado (OE), temendo-se que os falcões da direita europeia tentem impor a reposição de regras orçamentais que limitam o tão necessário investimento público. Seria não apenas inaceitável, mas a demonstração de que nada se tinha aprendido com os falhanços da última crise.

O próximo Orçamento tem de ser de recuperação, ou seja, de investimento; mas tem também de ser aprovado. E um OE de investimento só pode ser aprovado à esquerda, o que deixa um desafio ao BE.

A ilusão de que capitalizariam com o voto contra o Orçamento saiu gorada e Marisa Matias foi a sua vítima na noite eleitoral, vendo os seus votos reduzir-se em quase dois terços, pois o eleitorado do BE quer que este puxe o governo para a esquerda, não que se alie à direita. Uma direita em confronto interno entre quem, como Rui Rio, aceita a aproximação à extrema-direita e quem considera isso fatal para a direita e para a democracia.

Umas eleições autárquicas marcadas pela pandemia serão uma prova de fogo para o PSD. Os eleitores avaliarão os presidentes de câmara pela forma como agiram enquanto líderes da proteção civil municipal e as respostas que procuraram para que as famílias não caíssem na pobreza nem os negócios na falência.

Mas os líderes dos partidos estarão também em avaliação. Se o PS mantiver o maior número de câmaras, o PSD poderá, por isso, entrar em ebulição. Não sei se Rui Rio segurará o partido. Terá cometido talvez já o maior dos erros, ao normalizar a extrema-direita. Terá chegado já a um ponto sem retorno?

Reeleito de forma inequívoca, o Presidente irá exercer um segundo mandato num quadro de extrema exigência, onde o equilíbrio, a proximidade com os portugueses e a cooperação com os restantes órgãos de soberania se vão revelar (ainda mais) fundamentais.

Eurodeputado

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