Nobel da Paz: a advertência contra a ameaça nuclear

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O Prémio Nobel da Paz de 2024, concedido ao grupo japonês Nihon Hidankyo, é um poderoso lembrete da ameaça persistente das armas nucleares no cenário internacional. Representando os Hibakusha - sobreviventes dos bombardeamentos atómicos de Hiroxima e Nagasáqui -, o grupo foi reconhecido pelos seus esforços contínuos para alcançar um mundo livre de armas nucleares e pelo seu compromisso em testemunhar as terríveis consequências dessas armas.

A escolha deste ano não se pode dissociar do clima de grande tensão geopolítica, marcado pelo conflito entre Rússia e Ucrânia, que agora também envolve a Coreia do Norte, outro país detentor de armas nucleares. Ambos permanecem fora das normas internacionais de controle de armas, levantando preocupações de uma escalada nuclear que lembra os piores momentos da Guerra Fria.

Desde o início da invasão da Ucrânia, em 2022, a Rússia levantou repetidamente o espetro de um possível uso de armas nucleares táticas, enviando um recado claro de que a sua posição de força está respaldada pelo arsenal que detêm. Por seu lado, a Coreia do Norte, que mantém um ameaçador programa de testes de mísseis balísticos, parece ter encontrado em Moscovo o aliado perfeito para ascender a outro patamar de relevância geopolítica, abrindo uma via de cooperação militar que chegou ao ponto de colocar algo como 12 mil tropas em solo russo, junto da linha da frente do conflito.

O cenário que esta nova aliança configura poderá ter consequências impensáveis. Não se trata de um exercício militar conjunto, mas sim de uma cooperação em contexto e em teatro de guerra reais, que opõe o Ocidente ao chamado Eixo do Mal.

A doutrina da antiga União Soviética, do tempo da Guerra Fria, que se deseja seja ainda a da Rússia, é de que a paridade dos arsenais nucleares funciona como um garante da sua não-utilização, no entendimento de que qualquer ataque teria resposta imediata, ainda antes da primeira bomba ter impactado o solo do inimigo. No entanto, a narrativa de Putin tem ganhado alguma agressividade, e o facto de ter dado palco ao regime de Kim Jong-un indicia uma intenção de escalar o conflito, internacionalizando-o, com a agravante de trazer outra potência nuclear.

Os alarmes das salas de crise da NATO devem ter disparado em uníssono. É certo que a Ucrânia não pode ser deixada militarmente desprotegida perante esta escalada, mas o espetro nuclear remete para a emergência da diplomacia, na procura da paz.

A atribuição do Nobel da Paz ao grupo Nihon Hidankyo é justamente a chamada para a via pacífica. Uma advertência para os riscos insustentáveis de uma nova era de insegurança nuclear, que nos é veiculada pelo testemunho das cicatrizes dos sobreviventes das duas únicas bombas atómicas lançadas em contexto de guerra.

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