Embora não seja necessário que mais alguém o verbalize, convém não escamotear o óbvio: o PSD foi o claro vencedor das eleições autárquicas de 12 de Outubro. A solo ou com recurso a coligações de centro-direita, os sociais-democratas não só passaram a liderar os cinco concelhos mais populosos do país - a autarquia com mais habitantes governada pelo PS é Loures e sobre esse particular já inúmeros tratados foram escritos – como também foram quem recolheu a preferência dos portugueses no maior número de câmara municipais.Graças ao resultado obtido há duas semanas, o melhor em autárquicas desde 2009, Luís Montenegro conseguiu devolver ao partido a liderança da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), que há 12 anos estava sob controlo do PS. Perante esse facto e face à crueza dos números – o PSD, sozinho, com a ajuda da IL, do CDS, do PAN ou de outras forças quase inexistentes, alcançou 136 chefias locais -, Miguel Relvas, no habitual espaço de comentário na CNN, aventou dois nomes para a presidência da ANMP.O antigo ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares referiu-se a essas duas hipóteses como personalidades com peso político, que conhecem por dentro a máquina do Estado e que já tiveram responsabilidades no país e ainda invocou que ambas estavam a iniciar o seu último mandato à frente dos respectivos executivos camarários. Aludia a Pedro Santana Lopes (que vai iniciar o segundo quadriénio consecutivo na Figueira da Foz, tendo, se assim entender e se o povo validar através do voto, um terceiro pela frente) e a Isaltino Morais, esse sim, prestes a iniciar o derradeiro mandato em Oeiras.O argumentário de Miguel Relvas pareceu-me bastante razoável, sobretudo na parte em que considerou, como eu e tantos outros temos escrito a propósito de matérias centrais para o futuro do país, que a vitória tem de servir para alguma coisa – e não para perpetuar o poder pelo poder, algo em que o actual PSD parece viciado.Há reformas que, de facto, carecem de escala e de líderes, nacionais ou locais, que tenham estatura política e uma visão menos paroquial da Administração Pública e do território. No fundo, o poder autárquico, as comunidades intermunicipais e as áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto precisam de menos vícios, menos quintinhas, menos boys e menos despesas absurdas. Exigem, em vez disso, mais planeamento, menos funcionários partidários, mais visão de médio e longo prazo e, acima de tudo, mais racionalidade e transparência na gestão da coisa pública, isto é, daquilo que provém do suor de cada um de nós.Justamente por estas razões, e não inorando o trabalho muito meritório que já realizou em Oeiras e desconhecendo se o próprio está disponível para assumir tais funções, é pouco avisado que o PSD incorra no erro de propor ou apoiar qualquer candidatura ao Conselho Directivo da ANMP que tenha Isaltino Morais como cabeça-de-lista.Outrora o autarca-modelo dos sociais-democratas e hoje aclamado pela miudagem do TikTOk e por muitos activistas que se sentam nas redacções dos jornais e das televisões, Isaltino Morais representa uma forma de estar na política que, embora os oeirenses premeiem, está longe de ser saudável. Entre as obras faraónicas, tão propagandísticas quanto inúteis, as nebulosas relações com Moçambique com empresas municipais à mistura, a defesa do seu bom nome usando recursos camarários para esse efeito, as adjudicações que continuam sob escrutínio da justiça ou os indecorosos contratos da Câmara de Oeiras com uma empresa da filha mais velha, há demasiado fumo mediático para, no mínimo, não haver umas faíscas de imoralidade política.Em matéria de ética no exercício de cargos públicos, Luís Montenegro tem tido razões (e responsabilidades) de sobra para se preocupar e para elevar a fasquia que estabelece para si mesmo. Com a liderança da ANMP à sua mercê, terá uma pequena oportunidade para não pôr mais lenha na sua própria fogueira. Consultor de comunicação