Os sócios do Benfica decidem amanhã quem pretendem que seja o próximo presidente do clube. Filtrados os candidatos numa primeira volta que constituiu o acto eleitoral mais participado da história do futebol mundial, a escolha poderá agora recair sobre o incumbente, Rui Costa, ou sobre o homem que o desafia e tenciona ser o 35.º líder das águias, João Noronha Lopes.Para lá das promessas vãs que estas disputas costumam trazer à mistura, de uma certa frivolidade transversal aos vários concorrentes, de uma dose cavalar de amadorismo comunicacional provida pelos pretendentes ao trono e dos costumeiros ataques velados – as chamadas encomendas -, o que ficou da longa campanha e dos números saídos da primeira volta foi mais uma cabal demonstração de que o Benfica é não só o maior clube do país – ser o melhor é outra conversa para a qual a afluência às urnas ou as selfies de domingo contam pouco –, mas também o clube mais português de Portugal.Esta inferência encerra em si mesma um misto de prazer e dor. Prazer, porque, favorecendo os meus intentos – sou portista, nunca o escondi -, não tenho dúvidas de que o clube mais português de Portugal parece conformado com a mediocridade dos quatro anos com Rui Costa ao leme. Prazer, porque, apesar da demarcação cínica e tardia de Luís Filipe Vieira, o líder das águias faz-me lembrar os vassalos de José Sócrates que nunca viram nada, nunca farejaram nada, nunca perceberam nada.Prazer, porque a narrativa sonsa da assunção de responsabilidades por apenas quatro títulos no futebol (o resto, permitam-me, é paisagem), entre os quais apenas um campeonato, não passa disso mesmo: areia para os olhos dos adeptos. Prazer, porque, como é apanágio de quem se resigna, os associados sinalizaram preferir a previsibilidade do mais do mesmo ao risco de quem prometeu um caminho de ruptura. Prazer, porque, mantendo quem não foi capaz de fazer um juízo crítico aprofundado e coerente sobre o que fez e o que deixou por fazer, o Benfica estará mais longe de alcançar todo o seu potencial desportivo, financeiro e social, o que escancara as portas ao sucesso do meu FC Porto e, espero que em menor dose, também do Sporting.Atenção: não se confunda nada do que atrás referi com simpatia ou qualquer espécie de apoio a João Noronha Lopes, que teve a faca (as elites mediáticas) e o queijo (o fracasso de Rui Costa) na mão e não conseguiu galvanizar gente suficiente. Ao longo destes meses, aliás, fez o trabalho perfeito para nunca aparecer aos olhos dos benfiquistas como uma alternativa sólida, audaz e com visão de futuro. Não obstante ser melhor que o adversário de amanhã, teve uma entrada de leão na campanha e, antevejo, terá uma saída de sendeiro das urnas.Esta previsão comporta, ainda assim, uma inexorável dor. Dor, porque, tratando-se de uma das mais relevantes instituições do país e tendo havido mais de 85 mil pessoas a deslocar-se às urnas, as eleições do Benfica são, mais do que se possa imaginar, um espelho da parca exigência que tem marcado as últimas décadas em Portugal. Dor, porque o encolher de ombros face a um mal que julgamos, placidamente, ser menor, tem-nos trazido sucessivos dissabores: má governação, lideranças imorais (quando não amorais), órgãos de soberania tomados por videirinhos e cliques partidárias, necessidade de chibatadas de entidades externas, serviços depauperados, sofreguidão fiscal, escassez de oportunidades, desligamento cívico, renúncia ou emigração dos nossos melhores, destruição da nossa auto-estima colectiva e desesperança generalizada. Romper com este estado de espírito, com este marasmo não é tarefa miúda – nem para miúdos, radicais ou vendedores de banha da cobra. Viremos a página. Venha Janeiro. Venham as presidenciais.Consultor de comunicação