Olga Li criticou Putin. Agora arrisca dois anos de prisão
O vídeo tem quase seis minutos e mais de 400 mil visualizações no YouTube desde que foi publicado no início de março. Olga Li, deputada no Parlamento de Kursk, denuncia a alegada corrupção na região, mas não se fica por aí. Com um fato azul e um pin com a bandeira russa na lapela, olha diretamente para a câmara e acusa o presidente Vladimir Putin de não cumprir a sua função "como garante dos direitos e das liberdades da população" e de presidir "à ruína do sistema financeiro" com a sua política externa. Resultado: está a ser investigada por crime de ódio e arrisca dois anos de prisão.
"A abertura de um processo judicial contra mim é simplesmente absurda", disse Li, mãe solteira de 29 anos, em declarações à Newsweek. Com os seus vídeos de denúncia de corrupção em Kursk, região situada 500 km a sul da capital russa, Li esperava que Moscovo quisesse investigar as suspeitas. "Em vez disso, aconteceu o contrário", explicou. "Aqueles que roubam o povo russo não são responsabilizados, mas os que informam as pessoas são."
O vídeo catapultou para a fama a diretora e fundadora do jornal Narodni Zhurnalist (Jornalista do Povo), que se publica mensalmente desde dezembro de 2006. Li nasceu em 1986 em Abay, no Cazaquistão, mas a mãe mudou-se ainda nos anos 1990 para Kursk à procura de melhores condições de vida. Segundo o correspondente em Moscovo do jornal La Vanguardia, foi durante os anos na universidade, quando conciliava os estudos à distância com o trabalho nas limpezas, que resolveu aliar-se ao empresário Konstantin Berezin para fundar o jornal.
Em 2011, entrou para a política, apresentando-se como independente dentro das listas do Partido Comunista, sendo eleita deputada regional. Mas ambiciona mais e está atualmente em negociações com o partido da oposição Yabloko para levar a sua campanha anticorrupção a nível nacional, esperando poder concorrer às legislativas do final do ano. O seu advogado, Román Lizlov, citado pelo correspondente em Moscovo do ABC, está convencido de que os processos contra Li "pretendem acabar com ela politicamente e impedir que possa chegar a deputada da Duma".
Críticas antigas
Li tem sido crítica das autoridades locais, nomeadamente do vice-presidente do Parlamento regional, Viktor Karamyshev, do partido Rússia Unida de Putin - foi ele o primeiro a anunciar a acusação de crime de ódio. Segundo a Newsweek, também tem atacado os procuradores de Kursk, muitos dos quais estarão a ser investigados pelos seus jornalistas por suspeita de corrupção num negócio de reparação de estradas. Mas só quando as críticas se voltaram para o presidente é que os processos surgiram.
No primeiro, apresentado em finais de março, é acusada de difamação por um juiz de Kursk pela publicação de um artigo no ano passado. No segundo, que deu entrada no início de abril, é acusada de "incitação ao ódio" por causa das críticas contra Putin. Segundo um estudo linguístico pedido pelos procuradores, o vídeo tem "declarações com intenção de degradar a dignidade" de representantes governamentais.
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Segundo a deputada e jornalista, a política externa do Kremlin, com a anexação da Crimeia e guerras como a da Ucrânia e da Síria, "afundaram o sistema financeiro" da Rússia e "levaram à destruição do Estado de direito". Por causa das sanções ocidentais, "o nível de vida da população não para de descer e os medicamentos para curar muitas doenças desapareceram das farmácias", falando que a situação está a provocar "o genocídio" da população russa" (de acordo com a tradução do correspondente do ABC. No vídeo, Li acrescenta, dirigindo-se diretamente a Putin: "A Constituição não se respeita e você não cumpre a sua função como garante dos direitos e das liberdades da população."
Questionada pela Newsweek sobre se não tinha receio, a deputada disse que está constantemente a receber ameaças. "Enviam-me fotos do assassinado Boris Nemtsov nas redes sociais", explicou, referindo-se ao opositor que foi morto no ano passado junto ao Kremlin. "A minha filha mais velha tem 4 anos e a minha mais nova tem 2. Sim, tenho medo. Mas quero viver numa Rússia diferente, onde os direitos humanos não são algo só no papel."