Brasil é o epicentro da pandemia na América Latina. Países vizinhos estão preocupados
Brasil soma 125 218 casos confirmados e 8536 mortes devido ao covid-19
O Brasil é o epicentro da pandemia de COVID-19 na América Latina e os seus vizinhos mostram-se preocupados com a evolução da crise no maior país da América do Sul, onde o presidente Jair Bolsonaro se opõe publicamente às medidas restritivas para conter o avanço da doença.
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O país, que soma 125 218 casos de COVID-19 e 8536 mortes desde o início da pandemia, faz fronteira com dez países: Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname, França (através da Guiana Francesa), Peru, Bolívia, Argentina, Paraguai e Uruguai.
Para se ter uma ideia da magnitude da crise no Brasil, os países fronteiriços somam, juntos, 72 mil casos confirmados de infeção por coronavírus. Muitos especialistas consideram que o total de contagiados no Brasil poderá ser 15 vezes superior ao informado pelas autoridades brasileiras, pois só são feitos testes de deteção em pacientes graves.
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Por isto, à espera de que o pico da pandemia chegue nos próximos dias em diferentes pontos da América Latina, vários países observam com preocupação o seu vizinho, enquanto Bolsonaro desvaloriza a gravidade da pandemia e incentiva a população a desrespeitar as medidas de distanciamento social impostas por governadores e prefeitos para tentar contê-la.
Na Argentina, que mantém uma quarentena nacional desde 20 de março, o presidente Alberto Fernández expressou várias vezes a sua inquietação devido ao avanço da epidemia no Brasil e a atitude de Bolsonaro.
"Obviamente que é um risco muito grande (...) Aqui estão a entrar camiões do Brasil a transportar cargas de São Paulo, que é um dos locais mais infetados" do país, declarou Fernández nesta quarta-feira à Rádio con Vos.
Há algumas semanas, durante entrevista ao portal El Cohete a la Luna, Fernández já havia lamentado que, no Brasil, principal parceiro comercial da Argentina, "ninguém" estivesse "a responder ao problema do coronavírus com seriedade".
"Um risco muito grande"
No Paraguai, parceiro do Brasil no Mercosul com Argentina e Uruguai, o governo recusou-se a abrir gradualmente a fronteira com o Brasil, como queriam os comerciantes da fronteiriça Ciudad del Este.
O presidente Mario Abdo Benítez ordenou, pelo contrário, redobrar o controlo militar nas principais passagens fronteiriças para evitar a entrada de doentes com COVID-19 no país.
"A velocidade de propagação do coronavírus no Brasil representa um risco muito grande a qualquer eventual abertura", reforçou o ministro de Saúde paraguaio, Julio Mazzoleni, durante uma conferência de imprensa.
Na terça-feira, o Uruguai anunciou um aumento do controlo sanitário na fronteira com o Brasil ao ver com "preocupação" a existência de casos de coronavírus em cidades fronteiriças do país, informou o secretário da Presidência, Álvaro Delgado.
Embora o Uruguai tenha proibido a entrada de estrangeiros para conter a pandemia, ficaram isentos residentes de cidades que fazem fronteira com o Brasil, que frequentemente moram de um lado e trabalham do outro.
O presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou, que visitou nesta quarta-feira o departamento (estado) de Cerro Largo, limítrofe com o Brasil, anunciou que o seu governo está a tentar desenhar uma política de saúde conjunta com o Executivo de Bolsonaro para evitar contágios em massa na fronteira.
Temor na Amazónia
Na Colômbia, o governo de Iván Duque não demonstrou preocupação com o Brasil, mas a situação no país vizinho gera alarme nos estados amazónicos.
Embora Bogotá tenha decretado o encerramento das fronteiras terrestres a 16 de março, estas são "muito porosas, há muitas partes por onde se pode passar", advertiu à AFP Daniel Oliveira, administrador do departamento (estado) do Amazonas.
Neste departamento, situado na fronteira com o Brasil, há 30 casos de coronavírus por 10 mil habitantes, a pior cifra do país, à frente de Bogotá, com quatro casos pelo mesmo número de pessoas.
Em Letícia, capital da província, dos dez primeiros casos detetados, cinco foram importados do país vizinho.
A região amazónica colombiana, despovoada e pobre, é especialmente vulnerável. 58 por cento da sua população é indígena e está em "risco de extinção" devido à pandemia, alertou a Organização Nacional Indígena da Colômbia (ONIC).
"Aqui não há água potável, o sistema de saúde é muito precário (...) Se o vírus se espalhar nos territórios, as mortes seriam inimagináveis", advertiu Arley Cañas, membro do povo Inga, na reserva Uitiboc.
Na Venezuela, o governo de Nicolás Maduro tem multiplicado as críticas a Bolsonaro e qualificado de "grande ameaça" para o seu país a proximidade do Brasil devido à "estupidez" de Bolsonaro.
"A irresponsabilidade dele levou milhares de brasileiros a contagiarem-se. Levou à morte de milhares", disse Maduro sobre Bolsonaro, um dos seus adversários na região e que já o qualificou várias vezes de "ditador".
Segundo a imprensa local, o governador do estado fronteiriço de Bolívar, Justo Noguera, avaliou que no começo do mês, 1600 venezuelanos tinham voltado ao país através das passagens fronteiriças com o Brasil durante a emergência provocada pelo novo coronavírus.