Mundo
27 março 2020 às 22h20

Bolsonaro gasta 800 mil euros em campanha contra o isolamento social

Contrato foi assinado pelo seu secretário da comunicação, de quarentena por ter contraído coronavírus. E empresários bolsonaristas fazem "carreatas" pelo regresso ao trabalho. Em entrevista, o presidente brasileiro disse duvidar do número oficial de mortos e desabafou: "Vai haver mortes mas paciência".

João Almeida Moreira, São Paulo

O governo de Jair Bolsonaro contratou por 4,8 milhões de reais, mais de 800 mil euros, uma campanha publicitária com o mote "O Brasil Não Pode Parar". O objetivo é defender a flexibilização do isolamento social, a propósito da pandemia de coronavírus, mantendo apenas idosos e pessoas com doenças anteriores em casa, conforme defendeu o presidente em discurso oficial.

O contrato de licitação da peça de propaganda, noticiam os jornais Poder360 e Huffington Post Brasil, foi assinado por Fábio Wajngarten, secretário de comunicação da presidência, a cumprir quarentena apor ter contraído coronavírus em viagem recente aos Estados Unidos com Bolsonaro. Wajngarten, no entanto, diz em nota ser prematuro e irresponsável falar-se na campanha porque, mesmo já tendo sido divulgada pela maioria dos órgãos de comunicação, ainda não está em vigor.

O vídeo mostra imagens de diversas categorias profissionais a trabalhar e vai repetindo o slogan "o Brasil não pode parar".

O valor gasto pelo governo para a campanha, segundo contabilidade do portal UOL, daria para comprar cerca de 70 ventiladores.

Empresários apoiantes de Bolsonaro, entretanto, vêm marcando protestos pelo Brasil contra a quarentena e a favor do regresso ao trabalho. De Manaus, no norte, a Curitiba, no sul, há "carreatas" (manifestações em filas de automóvel) e "buzinaços" (buzinões), agendados pelas redes sociais de forma a pressionar políticos locais a abandonar a prática de isolamento social recomendada pela Organização Mundial de Saúde.

Na quinta-feira, já foram realizadas "carreatas" em cidades como Ipatinga, Minas Gerais, Maringá, no Paraná, e Balneário Camboriú, em Santa Catarina, com hashtags e cartazes a dizer "eu quero trabalhar", "Bolsonaro tem razão" e "vamos isolar os doentes e o resto volta para a guerra". Em Cachoeiro de Itapemirim, Espírito Santo, 300 empresários locais realizaram protestos no mesmo sentido.

Os protestos são estimulados por Bolsonaro, que partilhou vídeo nas redes sociais de uma ameaça de greve dos camionistas por não terem restaurantes abertos à beira da estrada.

Em entrevista ao programa Brasil Urgente, especializado na cobertura de crime, Bolsonaro reforçou a ideia: "O brasileiro quer trabalhar, esse negócio de confinamento aí tem que acabar, temos que voltar às nossas rotinas. Deixem os pais, os velhinhos, os avós em casa e vamos trabalhar. Algumas mortes haverá, mas acontece, paciência".

Disse também duvidar do número de mortos em São Paulo, nos Estados Unidos e em países europeus. "Fraude para uso político", acusou.

Sobre outros temas afirmou que "Mourão é muito mais tosco do que eu", a propósito de Hamilton Mourão, seu vice-presidente. E, sobre a possibilidade de fazer um golpe de estado, deixou o entrevistador incrédulo ao dizer "quem quer dar um golpe, jamais o divulgaria".

O presidente da República, em discurso oficial à nação na terça-feira à noite, defendera o fim da quarentena, exceto para idosos e grupos de risco, e a reabertura das escolas e do comércio. "Uma gripezinha", continuou, classificando o coronavírus. Nos dias seguintes, reforçou a ideia. Na tradicional live das quintas-feiras, afirmou que os brasileiros deviam ser estudados: "pulam em esgoto e não são contaminados com nada".

Até esta noite, foram contabilizadas 92 mortes com a doença no Brasil e cerca de 3000 contaminados. As autoridades do ministério da saúde apontam o próximo mês como o mais problemático.

Eduardo Cunha solto

Com suspeita de coronavírus, Eduardo Cunha, o presidente da Câmara dos Deputados decisivo para a aprovação do impeachment e queda consequete de Dilma Rousseff, em 2016, foi enviado para prisão domiciliar por suspeita de ter contraído coronavírus.

"Considerando a excecional situação de pandemia do vírus Covid-19, por se tratar o requerente de pessoa mais vulnerável ao risco de contaminação, considerando sua idade e seu frágil estado de saúde, substituo, por ora, a prisão preventiva de Eduardo Consentino da Cunha por prisão domiciliar, sob monitoração eletrônica", diz trecho da decisão judicial.

Eduardo Cunha, de 61 anos, está preso preventivamente desde outubro de 2016 acusado de corrupção e outros crimes. Cunha foi ainda pivô de um escândalo envolvendo o aliado Michel Temer, que se reuniu com um empresário para lhe pedir que mantivesse pagamentos regulares ao detido em troca do seu silêncio.