Câmara fecha parques com 146 lugares de estacionamento no bairro da Graça
Às portas do Largo da Graça um condutor para no meio da estrada e pergunta, admirado, a duas funcionárias da EMEL porque é o parque de estacionamento está entaipado. A resposta é um encolher de ombros: não sabem, só sabem que fechou. O ar atónito e contrariado do condutor tem uma justificação: previsivelmente espera-o um longo périplo pela vizinhança até conseguir estacionar.
Na última segunda-feira a EMEL encerrou o espaço de estacionamento com 69 lugares ao cimo da Rua Damasceno Monteiro, junto ao Largo da Graça, que se destinava a uso público durante o dia e aos residentes no período da noite. É o segundo no espaço de poucos meses, no mesmo local: em julho, um outro parque situado mesmo em frente, do outro lado da rua, com 77 lugares, também já tinha sido fechado. No conjunto são 146 lugares que desaparecem numa zona da cidade com crónicas dificuldades de estacionamento. Os parques serão agora totalmente desmantelados e integrados nas obras de reconversão do antigo Convento da Graça, que vai ser transformado num hotel de cinco estrelas.
No local não há qualquer informação que explique o encerramento. Ao DN, a EMEL explica que a cedência daqueles dois espaços foi feita pela Câmara Municipal de Lisboa e que, desde o início, estava previsto que esta fosse uma solução temporária: "Já estava acertado que seria provisório. Agora tivemos de sair e entregar o espaço."
Uma informação que não foi dada publicamente. Quando os dois parques foram inaugurados, em 2017 - num dos casos com a presença do presidente da câmara e da presidente da junta de freguesia - nunca foi dito que não eram definitivos. Fernando Medina destacou então o empenho da câmara na melhoria do estacionamento na freguesia de São Vicente, uma "aposta de fundo" da autarquia, numa altura em que as obras de requalificação do Largo da Graça retiraram dezenas de lugares de estacionamento, substituídos por zonas pedonais. Os dois parques foram então apresentados como solução alternativa.
Segundo a Câmara Municipal de Lisboa, os "terrenos em causa são propriedade do Estado"e "aquando da sua criação ficou assente que seriam cedidos ao município para instalação de parques de estacionamento provisórios até que fosse concretizada a concessão do Convento da Graça no âmbito do Programa REVIVE (de iniciativa do governo que lançou um concurso público para esta concessão)".
"Sendo necessário ao concessionário iniciar as obras de reabilitação do antigo convento, com adaptação a hotel, está o município obrigado a devolver os terrenos desocupados", acrescenta a autarquia, sublinhando que o concessionário tem a "obrigação contratual", assumida "no âmbito do concurso público" de concessão, de construir um "silo auto com 300 lugares", o que "resultará num acréscimo" face aos números atuais. Não é avançada qualquer data para a concretização deste novo estacionamento. O DN tentou também, desde o início da semana, contactar a presidente da Junta de Freguesia de São Vicente, Natalina Moura, que não esteve disponível.
Aparentemente, não serão criadas alternativas até à conclusão do novo estacionamento. De acordo com o caderno de encargos para a transformação do antigo Convento da Graça (monumento nacional) num hotel, o estacionamento que se situava na antiga parada do quartel da GNR (o primeiro a fechar) passará a ter uma área menor, uma perda compensada pela "construção em altura de um segundo nível", com uma "capacidade para aproximadamente 86 automóveis".
Do lado oposto (o parque que encerrou nesta semana) será da "responsabilidade do concessionário adaptar este estacionamento ao ar livre a um silo com dois pisos, igualmente para utilização pública", o que "permitirá parquear cerca de 124 automóveis". "Com esta solução, aumenta-se a capacidade de estacionamento para 210 [lugares], podendo usufruir o empreendimento turístico de 57 lugares de estacionamento privativo", lê-se no caderno de encargos - que aponta para duas centenas de parqueamentos, abaixo dos 300 referidos pela câmara.
A área em causa foi concessionada por um período de 50 anos para a instalação de um hotel de cinco estrelas, por uma renda anual de 1,79 milhões de euros, segundo avançaram em 2019 os ministérios da Economia e da Cultura. A abertura da nova unidade hoteleira estava então prevista para o final de 2022.
Em causa está um terreno com 13 400 metros quadrados. De acordo com o caderno de encargos "para a instalação do empreendimento turístico, encontra-se disponível todo o edifício do Convento da Graça, assim como os espaços interiores e exteriores que lhe são adjacentes, com exceção da Igreja da Graça, sacristia e claustro adjacente. Também o edifício a nordeste, atualmente a servir de oficinas para o exército, será parcialmente disponibilizado, sendo uma parte afeta à paróquia para servir de casas mortuárias".
Este é já o segundo grande conjunto arquitetónico destinado à função hoteleira na zona da Graça. Atualmente está já em obras um outro empreendimento, no antigo Convento das Mónicas, a poucos metros de distância do Convento da Graça, que está também a ser transformado num hotel de cinco estrelas.