PS responsabiliza Moedas por abate de jacarandás. Câmara diz que PS aprovou o projeto sem apresentar soluções
O relatório de passagem de pasta entre o anterior presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina (PS), e o atual, Carlos Moedas (PSD), ao qual o DN teve acesso, revela que o autarca socialista alertou para um "risco de incumprimento do artigo 16.º do Regulamento do Plano Diretor Municipal e por conseguinte à sua violação" caso o município insista em aceder às intenções do promotor do projeto urbanístico na avenida 5 de Outubro, para construir um estacionamento e, para o concretizar, remover 45 jacarandás daquela zona. Ou seja, 25 abatidos e 20 transplantados.
O DN contactou o gabinete de Carlos Moedas sobre esta leitura do caso, que a rejeitou com uma palavra: "Falso."
"O projeto aprovado no anterior mandato só podia ter uma consequência: A destruição dos jacarandás no local como é reconhecido pelo anterior vereador do urbanismo", explicou a fonte, aludindo, para o efeito, às declarações do vereador socialista Pedro Anastácio, que numa reunião na Câmara reconheceu que "houve um erro de medição" por parte do promotor do projeto e que Carlos Moedas "fez bem" ao procurar mitigá-lo.
Contactado pelo DN, Pedro Anastácio explicou que, "relativamente a esse erro, que é identificado inclusivamente na pasta de transição", é também "identificada uma solução para esse erro de medição do promotor que passava por abater jacarandás e que foi recusada na altura pelo município", sob a gestão socialista de Fernando Medina.
"O que eu digo que fez bem é no sentido de existir um erro e é positivo que se tenha procurado resolver, estabelecendo um caminho para uma solução. Agora, a solução final a que chegou Carlos Moedas, responsabiliza Carlos Moedas e apenas Carlos Moedas", acusa o autarca do PS.
Por parte do gabinete de Carlos Moedas, antes de um contra-ataque surgiu uma justificação: "O que este Executivo tentou fazer foi, perante aquele cenário, procurar encontrar a melhor solução que pudesse mitigar em concreto o abate dos jacarandás."
No que diz respeito ao alerta dado pelo PS na pasta de transição, a mesma fonte do Executivo municipal reconhece que os socialistas "alertaram, mas não deram nenhuma solução e aprovaram um projeto que era incompatível com a preservação dos jacarandás".
"Estamos a dar condições de sobrevivência aos jacarandás adultos"
O DN falou com Catarina Freitas, a atual diretora municipal do Ambiente, Estrutura Verde, Clima e Energia da Câmara de Lisboa, que tem trabalhado para que o projeto avance e para "tentar minorar" o impacto da remoção das árvores.
Catarina Freitas começa por lembrar que foi a câmara que propôs a construção daquele estacionamento, até porque, "isto não saiu da cabeça do promotor". Depois de quase dois anos de discussão, já sob a gestão de Carlos Moedas, Catarina Freitas garante que conseguiu fazer "recuar a parcela, portanto, recuar um bocadinho o estacionamento e com isso salvar um dos dois alinhamentos de jacarandás".
Para além disso, justifica, tentaram que o eixo central fosse também um contínuo verde.
Resumindo, explica a diretora municipal do Ambiente, dos 75 jacarandás que estão naquela avenida, 45 vão ser removidos, mas 30 vão manter-se.
"Esses jacarandás [os 30 que vão manter-se], do ponto de vista do alinhamento arbóreo de toda a avenida, são muito importantes, porque são exemplares adultos e eles vão intercalar com exemplares mais jovens. Portanto no fundo a nossa preocupação eram duas coisas: criar este contínuo dos jacarandás, não interromper com árvores mais jovens. Por isso é que era tão tão importante manter alguns adultos neste troço da 5 de Outubro e, por outro lado, dar até mais condições para eles sobreviverem."
Questionada sobre o que tanto a Quercus como o PAN defendem quanto às árvores que vão ser transplantadas (20 jacarandás entre os 45), alegando que não sobreviverão, Catarina Freitas diz ter "absoluta confiança na análise técnica que os serviços da câmara estão a fazer. E que é uma análise técnica séria, robusta e que não procurou nunca escamotear absolutamente nada", assegura.
Quantos aos restantes 25 jacarandás que vão ser removidos, o destino é o abate, por falta de viabilidade, aferida pelos serviços camarários, porque poderiam não resistir ao transplante.
"A situação mais fácil que a Câmara tinha era dizer assim: 'caros, 45 para sair, vão ser 45 transplantes'. Já viu como isso tinha reduzido aqui a conflitualidade do tema", questiona Catarina Freitas, de forma retórica.
E, mesmo que os transplantes fossem feitos às 45 árvores, estas poderiam não morrer logo, argumenta.
"Se calhar poderiam morrer daqui a 2 ou 4 ou 5 anos. Aliás, nos transplantes que nós fizemos é difícil estabelecer uma relação causa-efeito, uma relação de nexo, por assim dizer. Por exemplo, nós já fizemos transplantes de árvores que infelizmente não sobreviveram passado cinco anos. E aí aqui nós temos que perguntar se o problema é do transplante ou foi outra praga. Ou foi um problema fitossanitário."
"Portanto, eu acho que temos que ter aqui também alguma cautela e alguma ponderação no estabelecimento dessas relações de nexo", propõe Catarina Freitas.
Esclarecimentos adiados para a próxima quarta-feira
Agendada para esta sexta-feira, a sessão de esclarecimento em torno do projeto urbanístico previsto para Entrecampos, foi adiada para a próxima quarta-feira, dia 2 de abril, "tendo em conta o número de pessoas inscritas e as muitas que ficaram sem conseguir ter acesso devido à limitação de lugares da sala", divulgou a Câmara.
"Foi decidido o adiamento e concentração numa única sessão técnica de esclarecimento que irá decorrer no Fórum Lisboa, na avenida de Roma 14, próxima quarta-feira, dia 2 de abril, às 18h30", completou.
A par desta informação, o gabinete do presidente da Câmara explicou que esta sexta-feira foi iniciada a "plantação de novos jacarandás na Avenida 5 de Outubro e nas zonas limítrofes", com 10 novos jacarandás já plantados cinco previsto para esta sábado. Uma publicação na rede social X corrobora esta informação da Câmara de Lisboa.
No total, o gabinete de Carlos Moedas "reafirma que, dos 75 jacarandás que iriam ser removidos daquele local, o atual Executivo conseguiu salvar 50", estando ainda prometida "a plantação de mais 200 em diversos locais da cidade de Lisboa".
Esta quinta-feira, o PAN avançou com uma providência cautelar com o objetivo de travar as obras que entretanto tinham começado e que a Câmara justificara como sendo de "preparação do terreno" para que pudessem ser transplantados os primeiros cinco de 20 jacarandás que estão previsto sofrer este procedimento.
No documento, o partido liderado por Inês de Sousa Real argumenta que "a substituição destas árvores por eventuais novos exemplares não mitiga o impacto imediato da remoção e abate, uma vez que os benefícios ambientais fornecidos por árvores maduras, tais como sombreamento, redução de temperatura urbana e sequestro de carbono, são insubstituíveis a curto prazo".
Aludindo ainda a uma petição pública – com o título Não ao abate dos jacarandás da Av. 5 de Outubro –, que conta com mais de 51 800 assinaturas, o PAN, no procedimento cautelar contra a Câmara, reitera que “os jacarandás, com mais de 50 anos, fazem parte da história e identidade da Avenida 5 de Outubro, oferecendo um espetáculo natural único em Lisboa e contribuindo significativamente para a redução da poluição atmosférica e o bem-estar dos cidadãos”.