O especialista em relações internacionais Álvaro Vasconcelos considera que na Ucrânia se trava "uma guerra contra a democracia que faz parte de um movimento de autocratização" e defende uma União Europeia mais democrática como alternativa.."A guerra na Ucrânia é uma guerra contra a democracia que faz parte de um movimento de autocratização que se está a passar no mundo. A tendência é de que haja mais ditaduras, ao contrário do que aconteceu com o 25 de Abril [de 1974], em que houve uma vaga democrática, a que se seguiu a democratização da Espanha, Grécia, América Latina, Europa Central e de Leste", disse, em entrevista à Lusa..O investigador do Centro de Estudos Interdisciplinares (CEIS20) da Universidade de Coimbra participa hoje na abertura do Festival Bienal das Alternativas Europeias Transeuropa, que se realiza até segunda-feira, no Porto e em Valongo, uma iniciativa europeia com conferências, debates, oficinas, exposições e performances sobre o tema "descolonizar, descarbonizar, democratizar"..Segundo o diretor-fundador do Instituto de Estudos Estratégicos e Internacionais (IEEI) de Lisboa, "uma União Europeia mais democrática seria uma alternativa necessária e imprescindível a esta vaga autocrática".."Para a enfrentarmos, precisamos de reforçar as nossas democracias nacionais, e que correspondem às aspirações dos cidadãos, mas também precisamos de responder a nível da UE", prosseguiu..O caminho, defende, "é uma União que tenha estruturas supranacionais democráticas e em que os cidadãos europeus tenham uma voz na política europeia, sejam capazes de influenciar as decisões de forma direta, e não indireta, apenas através dos Estados-membro"..Sobre a resistência a um aprofundamento da União, face ao crescimento das forças eurocéticas, Álvaro Vasconcelos acredita que "muitos europeus já perceberam que a União Europeia corre riscos graves" e perceberam a sua relevância "depois da pandemia [de covid-19] e da guerra na Ucrânia"..Há, no entanto, um fator essencial, que se desenrola já no próximo domingo -- "as eleições francesas vão ser muito importantes e decisivas deste ponto de vista, porque, se [Marine] Le Pen ganhar, tudo isto que conversamos perde o sentido".."Se ela perder as eleições, acho que se vai aprofundar a reflexão sobre o futuro da União Europeia e sobre a necessidade de dar um salto mais plural e democrático", vinca..O especialista, coordenador do livro "Utopias Europeias: o Poder da Imaginação e os Imperativos do Futuro", esclarece: "utopia é um horizonte, indica-nos um caminho -- não é algo que vamos, necessariamente, concretizar, mas precisamos de dar passos nesse sentido"..Sobre a crise de refugiados criada pela guerra na Ucrânia, Álvaro Vasconcelos afirma que "a hospitalidade é um imperativo ético, é um imperativo universal", para além de ser "uma obrigação jurídica, porque os Estados assinaram convenções de refugiados e as pessoas que fogem à guerra, à perseguição, que podem ser vítimas por causa da sua situação política específica, têm direito ao refúgio"..Álvaro Vasconcelos é investigador do CEIS20 da Universidade de Coimbra e coordenador do Forum Demos. Dirigiu o Instituto de Estudos de Segurança da União Europeia/EUISS, entre 2007 e 2012, e o Instituto de Estudos Estratégicos Internacionais de Lisboa, desde a sua fundação, em 1980, até 2007..A Rússia lançou em 24 de fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que já matou mais de dois mil civis, segundo dados da ONU, que alerta para a probabilidade de o número real ser muito maior..A ofensiva militar causou já a fuga de mais de 12 milhões de pessoas, mais de 5 milhões das quais para fora do país, de acordo com os mais recentes dados da ONU -- a pior crise de refugiados na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).