Rússia ataca várias cidades da Ucrânia na véspera da Cimeira da NATO
A Rússia atingiu várias cidades da Ucrânia com uma barragem de mísseis, matando pelo menos 36 pessoas, deixando 137 feridos e danificando gravemente um hospital pediátrico em Kiev, num ataque ocorrido na véspera do início da Cimeira da NATO, marcada para Washington, e condenado como um ataque cruel contra civis. De acordo com o presidente ucraniano, as forças russas dispararam ontem mais de 40 mísseis contra pelo menos cinco cidades, principalmente no sul e leste do país, bem como a capital.
Pouco depois de os sobreviventes do ataque saírem do bunker da cave do hospital pediátrico de Okhmatdyt, o maior da Ucrânia, uma multidão juntou-se para formar uma corrente humana e remover os escombros pedaço por pedaço. Moradores, equipas de resgate, militares e médicos com as batas cobertas de sangue ajudaram a limpar os destroços do hospital, após relatos de que pessoas estariam presas sob os escombros. Um outro ataque deixou quatro mortos numa maternidade num outro distrito de Kiev. “As enfermeiras disseram para descermos para a cave. Passado um bocado, ouvimos um barulho alto e o teto da cave desabou um pouco”, contou no local Natalia Svidler, que estava a acompanhar o filho de 2 anos. “Ficámos muito assustados, começámos a gritar e a correr”, disse ainda à AFP.
Segundo as autoridades ucranianas, o hospital pediátrico foi atingido por um míssil de cruzeiro russo, alegando ainda que este continha componentes produzidos em países da NATO. A Rússia, no entanto, alegou que os extensos danos dos mísseis em Kiev foram na verdade causados por um míssil de defesa aérea ucraniano, garantindo ainda que as suas forças atingiram os “alvos pretendidos” - indústria de defesa e instalações militares.
As notícias dos ataques coincidiram com a chegada de Volodymyr Zelensky à Polónia para assinar um acordo de segurança com o primeiro-ministro Donald Tusk, tendo os dois líderes realizado um minuto de silêncio pelas vítimas.
Este acordo bilateral permite às forças ucranianas intercetar mísseis e drones lançados a partir da Rússia contra a Polónia, mas que também inclui, entre outras medidas, a criação de uma “Legião Ucraniana”, que será composta por pessoal das forças da Ucrânia que será formado na Polónia.
A partir de Varsóvia, o líder ucraniano apelou aos Aliados para darem “uma resposta mais forte ao golpe que a Rússia desferiu mais uma vez na nossa população, nas nossas terras e nos nossos filhos”. O Conselho de Segurança reúne-se hoje para discutir o ataque da Rússia, reunião solicitada pela França e Equador, que foram imediatamente secundados pelo Reino Unido e Estados Unidos.
A ONU condenou a onda de ataques dizendo que era “inescrupuloso que crianças fossem mortas e feridas nesta guerra”, enquanto Josep Borrell, o líder da diplomacia da União Europeia, criticou a Rússia por atacar “cruelmente” civis.
Mais defesa aérea
Entre hoje e quinta-feira realiza-se em Washington mais uma Cimeira da NATO durante a qual será discutida a situação do conflito na Ucrânia e o apoio dos Aliados. Os líderes dos 32 Estados-membros deverão reafirmar que Kiev um dia se tornará membro e prometer continuar a armar as suas tropas, mas não darão a Zelensky o que ele mais deseja: um convite para que o seu país se junte à Aliança num futuro próximo, muito devido à objeção de pesos-pesados como Estados Unidos e Alemanha. Mas, num esforço para oferecer encorajamento à Ucrânia, diplomatas da NATO dizem que estão a debater qualificar o impulso de adesão de Kiev como “irreversível” na declaração final da cimeira.
Neste encontro, a NATO pretende também colocar o apoio ocidental a Kiev numa base mais firme, sendo que parte disso será garantido com a Aliança a assumir a coordenação das entregas de armas dos Estados Unidos, uma forma de ajudar a garantir que elas aconteçam caso Donald Trump regresse à Casa Branca.
Os Aliados também se comprometeram a continuar a fornecer apoio a Kiev aproximadamente ao mesmo ritmo - 40 mil milhões de euros por ano - desde a invasão russa. No entanto, esta promessa não é juridicamente vinculativa, os EUA enfraqueceram-na ao insistir que precisa de ser revista no próximo ano.
A ajuda mais importante, e concreta, que Zelensky provavelmente receberá em Washington é o compromisso de novos sistemas de defesa aérea - Kiev disse em abril que precisava desesperadamente de mais sete sistemas de mísseis Patriot para ajudar a intercetar os ataques da Rússia.
Missão de paz em Pequim
Antes de viajar para Washington, o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, esteve ontem em Pequim para se encontrar com o presidente chinês, Xi Jinping, que lhe disse que as potências mundiais devem ajudar a Rússia e a Ucrânia a reiniciar as negociações diretas.
O líder da Hungria, país que desde o início deste mês e até final do ano ocupa a presidência rotativa da União Europeia, considerou esta visita uma “missão de paz” e que se segue a visitas-surpresa do primeiro-ministro húngaro à Ucrânia e à Rússia na semana passada, esta última alvo de críticas da União Europeia, que afirmou ameaçar minar a posição do bloco sobre o conflito, enquanto o Ministério dos Negócios Estrangeiros de Kiev disse que a visita foi feita “sem qualquer acordo ou coordenação com a Ucrânia”.
A China recusou-se a condenar a invasão de Kiev pela Rússia e no ano passado publicou um documento apelando a uma “solução política” para o conflito, que os países ocidentais disseram que poderia permitir a Moscovo reter grande parte do território que conquistou na Ucrânia.
A emissora estatal chinesa CCTV citou Xi afirmando que “a comunidade internacional deveria criar condições e fornecer assistência para os dois lados retomarem o diálogo direto e as negociações”. “Somente quando todas as grandes potências exercerem energia positiva, em vez de energia negativa, é que o início de um cessar-fogo neste conflito poderá aparecer o mais rapidamente possível”, disse Xi a Orbán, segundo a CCTV.
Após o encontro, Orbán escreveu no X que a China era “uma potência fundamental na criação de condições para a paz” na guerra Rússia-Ucrânia. “É por isso que me encontrei com o presidente Xi em Pequim, apenas dois meses após a sua visita oficial a Budapeste”, prosseguiu o líder húngaro.
ana.meireles@dn.pt