Putin recebe apoio de Xi Jinping face à NATO e devolve o favor dizendo que Taiwan é China
Enquanto vários países ocidentais optaram pelo bloqueio diplomático aos Jogos Olímpicos de Inverno em Pequim, preocupados com as violações dos direitos humanos por parte da China, o presidente russo, Vladimir Putin, fez questão de estar presente e de, pela primeira vez em mais de dois anos, reunir pessoalmente com o homólogo chinês, Xi Jinping. Um encontro para mostrar que os laços entre os dois países estão fortes quando há um inimigo comum, os EUA, com Pequim a apoiar Moscovo no seu confronto com a NATO em torno da Ucrânia e Putin a devolver o apoio no que diz respeito a Taiwan.
"As partes opõem-se a uma maior expansão da NATO e apelam à Aliança do Atlântico Norte para que abandone a sua abordagem ideológica que data da Guerra Fria", dizia a declaração conjunta divulgada após a reunião, pedindo o respeito pela "soberania, segurança e os interesses de outros países". Putin e Xi Jinping expressaram preocupação pelo "avanço dos planos norte-americanos de desenvolver um sistema de defesa antimísseis global e destacar os seus elementos em várias regiões do mundo, combinado com a capacidade de construir armas não nucleares de alta precisão para desarmar ataques e outros objetivos estratégicos".
No mesmo texto, "o lado russo reafirma o seu apoio ao princípio da China Única, confirma que Taiwan é parte inalienável da China e opõem-se a qualquer forma de independência de Taiwan". Os dois países também se expressaram a sua oposição à aliança AUKUS, que envolve Austrália, Reino Unido e EUA (três dos países que boicotaram os Jogos de Pequim não enviando representantes políticos), defendendo que esta aumenta significativamente o perigo de uma corrida às armas na região.
"Alguns atores que representam uma minoria à escala internacional continuam a defender abordagens unilaterais para responder a questões internacionais e recorrer à força", lê-se ainda no documento conjunto, sem especificar de quem falam. "Eles interferem nos assuntos internos de outros países, infringindo os seus direitos legítimos e interesses, e incitam contradições, diferenças e confronto, dessa forma dificultando o desenvolvimento e o progresso da humanidade, contra a oposição da comunidade internacional", acrescenta.
Os dois presidentes não falaram apenas de política internacional, tendo a visita sido aproveitada também para reforçar os laços comerciais - que já chegam aos 140 mil milhões de dólares, mas ainda têm espaço para melhorar. Foi assinado um acordo de fornecimento de gás e de petróleo russo à China, no valor de 117,5 mil milhões de dólares, que permite aos russos diversificar os seus clientes e não estar dependentes dos europeus. Estes temem que, em caso de conflito por causa da Ucrânia, a Rússia possa fechar as torneiras.
Os EUA e os aliados da NATO acusam Moscovo de destacar cem mil militares para junto da fronteira da Ucrânia, em antecipação a uma invasão. Algo que Moscovo nega, exigindo que a Aliança feche as portas a novos membros a Leste - entre os quais a própria Ucrânia - e ofereça garantias de segurança. Os EUA já anunciaram por sua vez que vão reforçar com três mil militares o continente no Leste da Europa.
Ontem, os russos responderam também à acusação, feita na véspera pelos EUA, de que estariam a preparar uma operação de "falsa bandeira" de forma a justificar a invasão. O porta-voz do Pentágono, John Kirby, disse que tinha "informação de que os russos estão provavelmente a querer fabricar um pretexto para a invasão", sem dar provas. Kirby falou de um vídeo falso que seria "bastante gráfico", com atores a fazer de "pessoas enlutadas" e "mostraria grande destruição" que os russos diriam ter sido provocada pelos ucranianos.
"A natureza ilusória de tais invenções, e há mais e mais delas todos os dias, é óbvia", disse em resposta o chefe da diplomacia, Sergei Lavrov. "Recomendo que não acreditem em ninguém, e especialmente no Departamento de Estado, no que diz respeito a estes temas", afirmou por seu lado o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov.
Para fazer face à possível invasão, o exército ucraniano está hoje mais bem preparado do que há oito anos, quando os russos anexaram a Crimeia. Na última década o orçamento de defesa triplicou, chegando a cerca de 4,2 mil milhões de dólares em 2021, tendo sido feitas reformas para lidar com a corrupção e melhorar a cadeia de comando, segundo a agência AFP. Além disso, só os EUA providenciaram 2,5 mil milhões de dólares em ajuda militar desde 2014 e os soldados têm recebido treino da NATO.
Houve ainda uma aposta em trocar as velhas armas soviéticas por material moderno, incluindo mísseis antitanque dos EUA e do Reino Unido e drones da Turquia. Há ainda a promessa de juntar mais cem mil homens e mulheres às Forças Armadas, num contingente total de 360 mil soldados em três anos.
susana.f.salvador@dn.pt