Peste suína africana em Espanha pode ter tido origem em laboratório. Mais de 60 mil javalis em risco de serem abatidos
Carlos Manuel Martins/Global Imagens

Peste suína africana em Espanha pode ter tido origem em laboratório. Mais de 60 mil javalis em risco de serem abatidos

O El País avançou que o laboratório identificado pela alegada fuga do vírus da peste suína africana na Catalunha estaria a fazer experiências quando apareceu o primeiro caso. "Não representa risco para os humanos", diz DGAV de Portugal que apelou ao reforço das medidas de segurança.
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Há mais de 30 anos que a peste suína africana (PSA) não era detetada em Espanha, mas um surto registado no final de novembro, na Catalunha, fez soar os alarmes das autoridades do país vizinho, com a mobilização de militares, polícias, guardas florestais e outros profissionais para conter a propagação. Após a identificação do foco, a Catalunha pretende agora abater mais de 60 mil javalis e o Ministério da Agricultura anunciou a abertura de uma investigação para determinar a "origem do vírus". O Governo espanhol admitiu a hipótese de que o foco da PSA possa ter tido origem num laboratório.

O jornal El País avançou esta sexta-feira, 12 de dezembro, que o laboratório que terá sido identificado pela alegada fuga do vírus da peste africana na Catalunha tinha pelo menos duas experiências planeadas com o agente patogénico na mesma altura em que o primeiro javali infetado apareceu, a centenas de metros das instalações. Uma informação que consta nos documentos da Comissão Nacional de Biossegurança, a que aquele jornal espanhol teve acesso.

Recorda o diário que foi o Ministério da Agricultura que levantou a hipótese de uma fuga laboratorial a 5 de dezembro, "uma semana após a descoberta de duas carcaças de javalis infetados perto do Centro de Investigação em Saúde Animal (CReSA)". Mas o Governo nunca se referiu ao laboratório CReSA, localizado em Bellaterra, Barcelona. Trata-se de um centro onde investigadores trabalham com agentes patogénicos perigosos na procura de tratamentos e vacinas, explica o jornal, dando conta que o governo catalão é o responsável por estas instalações.

"O governo catalão nunca admitirá que o vírus da peste suína africana que infectou os javalis escapou do seu laboratório. Hoje, enfrentaria indemnizações financeiras incalculáveis”, disse a associação agrícola ASAJA de León, citada pela publicação.

Escreve o El País que a documentação analisada pelo jornal "revela uma experiência inicial, planeada para outubro e novembro, para testar um protótipo de vacina em 15 porcos, utilizando uma injeção intramuscular de uma estirpe geneticamente modificada do vírus, a Georgia/2007/01".

Foi a 28 de novembro de apareceu a primeira carcaça de um javali selvagem infetado, a centenas de metros do laboratório CReSA.

O jornal refere que no relatório preliminar da experiência, o CReSA indicou que os trabalhos seriam realizados “em instalações de nível de biossegurança 3, para eliminar qualquer possibilidade de propagação dos vírus para o ambiente”, enumerando várias medidas.

As autoridades espanholas já tinham anunciado que cinco laboratórios estavam a ser investigados, após uma possível fuga acidental que poderá estar na origem do surto de peste suína africana.

“Ordenámos (…) uma inspeção de todas as instalações, de todos os centros (de investigação) localizados na zona de risco de 20 quilómetros, que trabalham com o vírus da peste suína africana”, declarou Salvador Illa, presidente do governo regional da Catalunha (nordeste), numa conferência de imprensa.

Salvador Illa acrescentou que os 80.000 suínos das 55 explorações situadas na zona de risco estão saudáveis e “podem ser disponibilizados para consumo humano seguindo os protocolos”, para “poderem ser comercializados no mercado espanhol com toda a segurança” e “de forma gradual”, precisou

Inofensiva para os seres humanos, a peste suína africana é uma doença viral hemorrágica com uma taxa de mortalidade próxima de 100% em suínos e javalis.

Segundo um comunicado do Ministério da Agricultura de Espanha, um laboratório "de referência" da União Europeia (UE) analisou o genoma do vírus que infetou javalis do parque natural de Collserola, na região de Barcelona, e concluiu que é diferente de todos os "vírus que circulam atualmente nos Estados membros", mas similar a outro que circulou na Geórgia e é conhecido como "Georgia 2007".

"A estirpe do vírus 'Goergia 2007' é um vírus de 'referência' que se utiliza com frequência em infeções experimentais em instalações de confinamento [laboratórios] para realizar estudos do vírus ou para avaliar a eficácia de vacinas", explica o ministério no mesmo comunicado.

Perante as conclusões desta análise do laboratório reconhecido pelas autoridades europeias, é possível que "a origem do vírus não esteja em animais ou produtos de origem animal provenientes de algum dos países em que há atualmente infeção", acrescentou o Ministério da Agricultura.

O Governo ordenou, assim, a abertura de uma nova investigação para avaliar a possibilidade de o vírus detetado na Catalunha ter tido origem num laboratório.

Encontrados 13 javalis mortos que estavam infetados com a peste suína africana

As autoridades da Catalunha tinham anteriormente dito que a origem do vírus poderia estar num enchido contaminado, provavelmente dentro de uma sandes abandonada nas imediações do parque natural de Collserola, uma zona onde circulam muitos camiões e onde há áreas de serviço.

Neste caso, um javali poderia ter ingerido comida infetada e assim dar origem ao foco.

Desde então, foram já encontrados 13 javalis mortos que estavam infetados com PSA, que não era detetada em Espanha desde 1994.

"Não representa risco para os humanos", diz DGAV de Portugal que apela ao reforço das medidas de segurança

O vírus da PSA não se transmite a seres humanos, mas é altamente contagioso e mortal entre javalis e suínos.

As autoridades espanholas têm no terreno centenas de militares, polícias, guardas florestais e outros profissionais em trabalhos de controlo, captura de animais e desinfeção.

Os acessos a um perímetro de vários quilómetros do parque natural foram fechados e já foram analisadas dezenas de animais, segundo as autoridades.

Espanha é o maior produtor de carne de porco da União Europeia e o terceiro maior do mundo. Exporta anualmente 8.800 milhões de euros de carne de porco.

Por causa dos casos detetados na Catalunha em javalis selvagens, foram já suspensas importações por cerca de 40 países.

A Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) de Portugal já apelou ao reforço das medidas de segurança contra a PSA após ter sido detetada na Catalunha.

"A PSA é uma doença viral grave que não representa risco para os humanos, mas provoca elevada mortalidade nos suínos e nos javalis . Sem vacina ou tratamento disponível, a sua presença tem fortes repercussões na produção, no comércio e na gestão das populações de javalis e da caça", explica a DGAV de Portugal.

Catalunha pretende abater mais de 60 mil javali

Após terem sido registados 13 casos de PSA, o governo da Catalunha pretende reduzir para metade a população de javalis selvagens.

A intenção de abater mais de 60 mil javalis - metade do total da população estimada na região - foi revelada esta semana pelo responsável pela pasta da Agricultura no governo autonómico, Òscar Ordeig, durante uma audição no parlamento regional por causa de PSA detetada no final de novembro no parque natural de Collserola.

Òscar Ordeig confirmou por outro lado, com base em novas análises de controlo concluídas na terça-feira, que a PSA não entrou em nenhuma das 55 explorações de suinicultura que existem num raio de 20 quilómetros em redor do foco identificado em javalis selvagens.

Assim, mantêm-se os 13 casos confirmados em javalis, sem que sejam conhecidas novas infeções nos últimos dias.

No entanto, na sequência deste foco de PSA, o executivo regional decidiu criar um grupo de trabalho para responder à sobrepopulação de javalis na Catalunha, que tem sido denunciada por diversos setores nos últimos anos e que é reconhecida pelas autoridades.

Segundo Òscar Ordeig, o grupo de trabalho integra diversas organizações, organismos públicos e representantes dos caçadores.

A Catalunha tem atualmente uma densidade média de 6,3 javalis por quilómetro quadrado, com uma população de animais reprodutores estimada em 125 mil exemplares.

O objetivo é passar a ter, no máximo, quatro javalis por quilómetro quadrado, segundo o executivo regional.

Será assim preciso "reduzir 50% da população", que em algumas zonas da Catalunha "disparou", disse Ordeig.

O executivo disse que a medida é necessária para diminuir vários riscos e lembrou que, por exemplo, os javalis são responsáveis por 90% dos acidentes causados por animais, são transmissores de doenças como a PSA e provocam danos significativos em terrenos agrícolas.

Peste suína africana em Espanha pode ter tido origem em laboratório. Mais de 60 mil javalis em risco de serem abatidos
Mais de 250 agentes mobilizados para conter foco de peste suína na Catalunha
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