Mundo está contra a ideia de Trump para criar a “Riviera do Médio Oriente” na Faixa de Gaza

Assumir a “propriedade” da Faixa de Gaza (sem pôr de lado a hipótese de enviar militares norte-americanos para lá), deslocar os palestinianos para outros sírios e transformar o enclave na “Riviera do Médio Oriente”. Este é o plano do presidente dos EUA, Donald Trump, que defende que não merece a pena continuar a fazer o mesmo que se fez até agora e esperar que a História não se repita. O problema é que a solução que encontrou viola as leis internacionais e ninguém (com exceção de alguns republicanos e da extrema-direita israelita) aprova. Então porque é que Trump a propôs?O plano foi apresentado numa conferência de imprensa com o chefe do governo israelita, Benjamin Netanyahu - primeiro líder internacional recebido na Casa Branca neste segundo mandato. Mas não é totalmente novo. Trump, que fez fortuna no setor imobiliário, pode ter-se inspirado no genro (e antigo conselheiro) Jared Kushner. Numa conferência em Harvard, há um ano, este disse que a costa do enclave palestiniano “poderia ser muito valiosa” e que o melhor era “tirar as pessoas e depois limpar tudo”. Esta ideia vai ao encontro do que a extrema-direita israelita sempre defendeu, com o ex-ministro da Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, a alegar que esta é “a única solução” para a Faixa de Gaza e que esta é a “estratégia para o ‘dia depois’” da guerra com o Hamas. Netanyahu não endossou explicitamente o plano de Trump, elogiando apenas a forma como o presidente dos EUA é capaz de “pensar fora da caixa” e dizendo que “merece a pena prestar atenção” à proposta. .Netanyahu diz que não há necessidade de enviar tropas americanas para Gaza. Rubio desafia países que criticam Trump a apresentarem soluções .Mas esta ideia pode desviar as atenções do facto de o primeiro-ministro não ter um plano para o futuro do enclave, numa altura em que começam as negociações para a segunda fase do cessar-fogo com o Hamas. A primeira fase termina no fim do mês e prevê a libertação de mais 20 reféns, oito deles o Hamas já admitiu estarem mortos. Na próxima fase, Israel quer que o grupo terrorista liberte os restantes reféns sequestrados no ataque de 7 de outubro de 2023 em que morreram 1200 pessoas. Mas este diz que não o fará sem o fim oficial do conflito, que já terá matado mais de 47 mil pessoas em Gaza, e a saída dos militares israelitas. O Hamas apelidou a proposta de Trump de “ridícula e absurda”, mas indicou que continua comprometido com as negociações - que têm os EUA, além do Qatar e do Egito como mediadores. Mas, em declarações à agência Reuters, um dos responsáveis do grupo, Sami Abu Zuhri, avisou que “qualquer ideia deste género é capaz de incendiar a região”. Para o mundo árabe, que rejeita o plano, as palavras do presidente norte-americano são o equivalente a uma limpeza étnica. Para os palestinianos, o plano reacende os receios de uma nova Nakba. Em 1948, cerca de 750 mil foram expulsos ou obrigados a fugir durante a guerra em torno da criação do Estado de Israel. “Não permitiremos que os direitos do nosso povo, pelos quais lutamos há décadas e realizámos grandes sacrifícios, sejam violados”, avisou o presidente da Autoridade Palestiniana, Mahmud Abbas, que tem o controlo na Cisjordânia ocupada. Questionado sobre a anexação deste território,Trump prometeu uma tomada de posição nas próximas quatro semanas - prevendo-se mais um revés para os palestinianos. Quanto à proposta de Gaza, é preciso olhar para a praticabilidade do projeto, começando pelo facto de o presidente dos EUA não ter autoridade para assumir o controlo daquele território. Caso opte por uma invasão, com o envio de militares para o enclave, estará em conflito com a lei internacional e com o que disse no passado, quando defendeu a retirada dos EUA da região. O Direito Internacional também proíbe qualquer deslocação forçada de pessoas ou a sua expulsão de um território ocupado - que é o que a Faixa de Gaza é, segundo a ONU. Trump não está a defender usar a força (não o disse explicitamente), apenas encoraja os palestinianos a sair do território que, após 15 meses de guerra, está quase em ruínas. O problema é que nenhum país os quer receber. Condenação internacional.Netanyahu lembrou como a capacidade de Trump “pensar fora da caixa” foi o que ajudou, por exemplo, à assinatura dos Acordos de Abrãao que permitiram a normalização das relações de Israel com vários países árabes - como os Emirados Árabes Unidos ou o Bahrein. O próximo na lista era a Arábia Saudita, mas os ataques do Hamas de 7de Outubro e a invasão israelita da Faixa de Gaza suspenderam esse desenvolvimento. .Faixa de Gaza. Um território hiperpovoado à beira mar destruído que Trump quer transformar na "Riviera do Médio Oriente".Os sauditas reiteraram ontem que não vão estabelecer relações diplomáticas com Israel sem a criação de um Estado palestiniano, criticando ainda os planos de os retirar das suas terras. Outros países árabes rejeitaram também a proposta, incluindo o Egito - um dos que Trump acredita que pode acabar por receber os palestinianos, junto com a Jordânia.Mas as criticas não vieram só do mundo árabe, com a Rússia a defender a solução dos dois Estados como “a única possível”. E a China a reiterar que é contra “a deslocação forçada e relocalização da população de Gaza”. A tentar escapar às tarifas de Trump, os líderes europeus mantiveram ontem o silêncio nas redes sociais sobre a proposta em relação a Gaza, mas diferentes países dos 27 expressaram o seu desagrado. Espanha, que reconheceu recentemente o Estado palestiniano junto com a Noruega e a Irlanda, reiterou que “Gaza é a terra dos palestinianos de Gaza”. Já França lembrou que qualquer deslocação forçada será “uma séria violação das leis internacionais” e um ataque às aspirações legítimas dos palestinianos. A Alemanha insistiu que continua a trabalhar na solução de dois Estados, tal como Itália e o Reino Unido. .Montenegro contra "limpeza étnica"O primeiro-ministro português, Luis Montenegro, condenou “qualquer intervenção, propósito ou intenção de haver uma limpeza étnica” na Faixa de Gaza, mas rejeitou retirar “conclusões precipitadas” das declarações do presidente dos EUA. E insistiu, no debate quinzenal, que a posição de Portugal é a solução dos dois Estados. Já o ministro da Defesa, Nuno Melo, disse que “não lhe compete comentar” a política interna norte-americana, recebendo críticas do Bloco de Esquerda e do Livre..O que disse Trump“Os EUA vão assumir o controlo da Faixa de Gaza e faremos ali um grande trabalho. Vamos ser donos e responsáveis por desmantelar todas as bombas perigosas não-detonadas e outras armas no local, nivelá-lo e livrarmo-nos dos edifícios destruídos, criar desenvolvimento económico que proporcionará um número ilimitado de empregos e casas para as pessoas na área. Faremos um trabalho a sério. Algo diferente. Simplesmente não dá para voltar ao que era. Se voltar, vai ser igual ao que tem sido há 100 anos.” ."Vejo uma posição de propriedade, a longo prazo, e vejo que isso traz uma grande estabilidade para aquela parte do Médio Oriente, e talvez para todo o Médio Oriente e todos com quem falei. Esta não foi uma decisão tomada de ânimo leve: todos com quem falei adoram a ideia de os EUA possuírem aquele pedaço de terra.”"A única razão pela qual os palestinianos querem regressar a Gaza é porque não têm alternativa (...). Queremos dar uma oportunidade de vida às pessoas... porque a Faixa de Gaza tem sido um inferno para as pessoas que lá vivem.”“Faremos o que for necessário. Se for necessário, faremos isso [enviar tropas para a Faixa de Gaza]. Vamos assumir essa parte. Vamos desenvolvê-la, criar milhares e milhares de empregos, e será algo de que todo o Médio Oriente se poderá orgulhar muito”,“Devermos ir a outros países de interesse com corações humanitários, e há muitos deles que querem fazer isso e construir vários domínios que acabarão por ser ocupados pelos 1,8 milhões de palestinianos que vivem em Gaza. Isto poderia ser pago por países vizinhos de grande riqueza. (...) Podem ser vários sítios ou pode ser um único sítio grande.”“E apesar de dizerem que não, tenho a sensação de que o rei da Jordânia e o Egito abrirão os seus corações e nos darão o tipo de terra que precisamos para o fazer, e as pessoas poderão viver em harmonia e paz.”“Isto não significa nada sobre dois estados, um estado ou qualquer outro estado. Nunca tiveram uma oportunidade de vida porque a Faixa de Gaza tem sido um inferno para as pessoas que lá vivem.”“Acho que o potencial da Faixa de Gaza é inacreditável. E penso que o mundo inteiro, representantes de todo o mundo estarão lá e viverão lá, os palestinianos também. Os palestinianos viverão lá. Simplesmente não podemos deixar que a história continue a repetir-se. Temos a oportunidade de fazer algo que pode ser fenomenal (...) A Riviera do Médio Oriente poderia ser algo tão magnífico.”

Mundo está contra a ideia de Trump para criar a “Riviera do Médio Oriente” na Faixa de Gaza

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