Como em 2022, os principais candidatos à presidência do Brasil, quarta maior democracia do mundo e segunda das Américas, no dia 4 de outubro de 2026 são Lula da Silva e Bolsonaro. Mas o Bolsonaro de agora chama-se Flávio, um jovem senador, e não Jair, o ex-presidente inelegível por oito anos e a cumprir pena de prisão de 27 anos por golpe de Estado e outros crimes. Nesse detalhe, não tão detalhe assim, o cenário atual lembra 2018, quando era Lula o detido. Ou seja, a polarização continua a ser a nota dominante no país e abre poucas brechas, até ver, para uma terceira via.Lula, com 80 anos acabados de completar e que fará 81 dois dias depois da eventual segunda volta, marcada para 25 de outubro, prometeu, logo após ser eleito em 2022, que não se recandidataria. No entanto, em 2024, mudou o discurso: “Se for necessário eu ser candidato para evitar que os trogloditas que governaram este país voltem ao poder, eu me candidatarei, não podemos voltar a ser governados por um fascista negacionista”.Presidente por três vezes, um recorde na democracia brasileira, Lula aumentará, claro, essa marca pessoal, caso seja reeleito no ano que está a chegar. Ex-metalúrgico e ex-sindicalista, o fundador e militante do Partido dos Trabalhadores (PT) concorre pela sétima vez - perdeu as três primeiras, uma para Collor de Mello, em 1989, e duas para Fernando Henrique Cardoso, em 1993 e 1997, e venceu as três seguintes, em 2002, 2006 e 2022, respetivamente a José Serra, Geraldo Alckmin, curiosamente seu atual vice, e Jair Bolsonaro, pai do, à partida, maior rival em 2026. “É com grande responsabilidade que confirmo a decisão da maior liderança política e moral do Brasil, Jair Messias Bolsonaro, de me conferir a missão de dar continuidade ao nosso projeto de nação”, declarou Flávio, empresário, advogado e senador de 44 anos pelo Partido Liberal (PL), no início deste mês, ao anunciar uma pré-candidatura que deixou a direita brasileira, da mais radical à mais moderada, em suspenso..Dados como eventuais herdeiros do espólio eleitoral de Jair, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, líder da ala feminina do PL, e o irmão Eduardo Bolsonaro, deputado federal pelo mesmo PL, apressaram-se a apoiar Flávio nas redes sociais. E Valdemar Costa Neto, o líder do partido de todos, disse “se o capitão [Jair Bolsonaro] decidiu, está decidido”.Mas a iniciativa da família que lidera a extrema-direita do Brasil incomodou a direita mais tradicional, nomeadamente partidos como o União Brasil, o Progressistas ou o Republicanos que tentam há mais de um ano convencer Tarcísio de Freitas, que pertence ao último daqueles par- tidos, a concorrer. Tarcísio, ministro da Infraestrutura de Bolsonaro com fama de moderado e de técnico, hoje bem avaliado governador de São Paulo, o estado mais populoso, mais rico e mais influente do Brasil, é visto como a alternativa mais forte a Lula por esses e outros partidos por eventualmente conseguir captar o voto de centro. “Não será a polarização que construirá o futuro mas a capacidade de unir forças em torno de um projeto sério”, escreveu Antônio Rueda, presidente do União Brasil. “Se eu tivesse que escolher pessoalmente um candidato, seria o senador Flávio, pela minha relação próxima com ele, mas a política não se faz com amizades, faz-se com viabilidade, sondagens, ouvindo aliados, não é só uma decisão do PL, é muito importante para nós incluirmos o campo político de centro e de direita porque se não, não vamos ganhar a eleição”, acrescentou Ciro Nogueira, presidente do Progressistas. Marcos Pereira, presidente do Republicanos, de Tarcísio, ainda não se pronunciou mas faltou a encontro com Flávio. O próprio Tarcísio disse que “Flávio junta-se a outros grandes nomes da oposição a partir de agora”. Como está apenas no primeiro mandato em São Paulo e pode tentar a recandidatura a mais quatro anos de governo, o favorito da direita não radical deve ser trunfo desse grupo apenas em 2030. Entretanto, outros nomes desse campo já são pré-candidatos. Romeu Zema, governador de Minas Gerais que admitiu ao DN que “os filhos de Bolsonaro desagregam”, e Ronaldo Caiado, governador de Goiás que, noutra entrevista ao DN, afirmou “não precisar da benção” do ex-presidente para avançar. Ratinho Junior, governador do Paraná, é outro nome falado nesse campo. Flávio, apesar de ter enviado sinais contraditórios ao dizer, num dia, que desistir tinha um preço, uma amnistia ao pai votada no Congresso com o apoio da direita moderada, e, noutro, que a candidatura era “irreversível” e não estava “à venda”, pontuou bem nas primeiras sondagens com o seu nome incluído. Num cenário de primeira volta proposto pelo instituto Genial/Quaest, Lula somou 41%, Flávio, 23% e Tarcísio, 10%. No mais, já se declararam candidatos Rui Costa Pimenta, pelo Partido da Causa Operária, de extrema-esquerda, Renan Santos, que liderou manifestações contra Dilma Rousseff, pelo Missão, partido liberal de direita, e Aldo Rebelo, ex-ministro de Lula e Dilma, pelo Democracia Cristã, de centro-direita. .P&RVoto por urna eletrónica e obrigatório.Quem vai a votos em 2026?Além do presidente e vice-presidente, cujos candidatos se estão a definir aos poucos, os brasileiros vão eleger os governadores dos 26 estados e do Distrito Federal, os 513 deputados, 54 (dois terços) dos 81 senadores, uma vez que os demais 27 (um terço) estão a meio dos mandatos de oito anos, e 1059 deputados estaduais. Em 2022, perto de 30 mil cidadãos concorreram a esses cargos. Não há a figura do candidato independente, todos devem estar vinculados a um partido político.Quando são as eleições?A 4 de outubro. Caso sejam necessárias segundas voltas para a presidência e para os governos estaduais, a votação ocorre dia 25 do mesmo mês. A tomada de posse será apenas em janeiro de 2027.A abstenção é considerada um problema?Não tanto como em Portugal, por exemplo, porque o voto, autorizado a todos os maiores de 16 anos, é obrigatório (quem não votar pode ter problemas a obter crédito bancário entre outros constrangimentos legais).Como é o sistema de votação?Por urna eletrónica. Cada candidato é identificado por um número. Como numa caixa multibanco, o eleitor clica no número do candidato a presidente, senador, deputado federal e estadual da sua preferência. A apuração dos votos é muito rápida e altamente confiável, apesar de Bolsonaro e apoiantes terem levantado suspeitas em 2022.Por quantos votos ganhou Lula a Bolsonaro em 2022?Por 2,139,645 votos, o que parece muito mas num país com 158 milhões de eleitores representou só 1,8% de margem, a menor diferença (50,9 a 49,1) da democracia brasileira..Direita moderada ameaça deixar Flávio Bolsonaro a falar sozinho