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Internacional
04 fevereiro 2022 às 00h10

Janna e Zhan: as campeãs da Amnistia Internacional na luta pela liberdade de expressão

De formas distintas, tanto a palestiniana Janna como a chinesa Zhan querem poder expressar-se livremente, sem serem um alvo, recorda a ONG.

Janna Jihad e Zhang Zhan estão separadas pela língua, mas juntas na luta pela liberdade de expressão. E é por quererem expor a verdade que são constantemente assediadas e perseguidas pelas autoridades dos seus países, e no caso da chinesa, presa, denuncia a Amnistia Internacional.

A palestiniana Janna Jihad tem 15 anos e vive na Cisjordânia. Desde os sete anos que expõe a violência das autoridades israelitas sobre o seu povo. Filmou, com o telemóvel da mãe, o tio a ser morto pelos militares israelitas, publicou o vídeo nas redes sociais e desde então não mais parou.

Aos 13 anos tornou-se numa das mais jovens "jornalistas" do mundo. "Ela acaba por, através da sua coragem e determinação, ser uma voz de resistência do povo palestiniano. Mas não deixa de ser uma criança normal, que gosta de jogar basquetebol, de dançar, de fazer os bordados tradicionais palestinianos", lembra Bruna Coelho, da Amnistia Internacional, em conversa com o DN. A principal missão de Janna é que as crianças na sua comunidade possam ter uma vida normal, não só na sua aldeia, Nabi Saleh, a 20km de Ramallah, mas também noutras dos chamados territórios ocupados.

Janna denuncia a realidade de muitas crianças palestinianas e por isso traz muita atenção não só para si, mas para tudo aquilo que representa. "O que ela mais quer é que a próxima geração de crianças não tenha que enfrentar toda esta opressão e todas estas restrições que lhe foram impostas e que moldaram o seu dia-a-dia e que limitaram muito os seus direitos", afirma Bruna Coelho.

Aos 38 anos, Zhang Zhan é uma antiga advogada chinesa e jornalista cidadã que em fevereiro de 2020 viajou até Wuhan para denunciar a forma como o governo de Pequim deteve jornalistas independentes e perseguiu familiares de pacientes com covid-19. "Pessoas como Zhang Zhan eram a única fonte de informação que não era censurada e eram talvez as únicas pessoas que partilhavam informações em primeira mão sobre a pandemia", lembra Bruna Coelho. Zhan desapareceu em maio de 2020 e mais tarde a polícia chinesa veio a revelar que tinha sido detida em Xangai, a mais de 600 km de Wuhan.

Para protestar contra a sua prisão, Zhan iniciou, em junho de 2020, uma greve de fome. Entre junho e dezembro desse ano, as autoridades chinesas algemaram os pés e mãos de Zhan e alimentaram-na à força. A grave desnutrição fez com que tivesse de ser internada em junho de 2021, mas entretanto regressou à prisão, onde está em greve de fome parcial. A família já tentou que fosse libertada devido ao seu estado de saúde, mas ainda não recebeu nenhuma resposta das autoridades chinesas.

Em situações anteriores Zhang Zhan chegou a ser detida por "provocar discussões e problemas", "perturbar a ordem social" e "incitar à subversão do poder do estado".

A Amnistia Internacional está a promover a Maratona de Cartas, um projeto que todos os anos reúne cinco casos de pessoas que são defensoras dos direitos humanos e estão em risco, e recolhe assinaturas para enviar às autoridades do país em causa. Este ano, Janna e Zhan fazem parte desta lista. A elas juntam-se a eritreia Ciham Ali, o bielorrusso Mikita Zalatarou e o guatemalteco Bernardo Caal Xol.

No caso de Janna, as assinaturas são dirigidas ao Comité Especial para os Direitos das Crianças em Israel, que ratificou a Convenção sobre os Direitos da Criança, e criou este comité para garantir a sua implementação. No entanto, e apesar de ter o dever de proteger todas as crianças, Israel apenas aplica esta convenção às crianças israelitas, não incluindo os menores palestinianos. "Aquilo que nós pedimos a Israel e a este comité é que os direitos das crianças sejam tidos em conta, que esta situação seja revertida, e que não importe se a criança é palestiniana ou israelita. Todas as crianças têm de ser protegidas, isto é um dever e para aquilo que estamos a apelar", diz Bruna Coelho.

Segundo dados da Amnistia, nos primeiros seis meses de 2021, pelo menos 73 menores foram mortas pelas autoridades israelitas nos territórios palestinianos ocupados, e todos os anos são instaurados entre 500 a 700 processos contra crianças palestinianas. Estas são levadas a tribunais militares, onde são "submetidas a julgamentos injustos".

No caso de Zhan, a Amnistia Internacional pede a sua libertação imediata e incondicional, e o mais rápido possível devido ao seu estado de saúde grave. "Quando as autoridades chinesas dizem que Zhang Zhan está detida por perturbar a ordem social ou disseminar informação que não é verdadeira, isso são coisas que não podem ser tidas em conta quando a pessoa está única e exclusivamente a exercer o seu direito à liberdade de expressão e a expor a verdade sobre a pandemia."

Os dois casos estão ligados à violação da liberdade de expressão, de formas distintas, mas que impedem que estas mulheres possam usufruir dos seus direitos humanos em pleno.