A Austrália tem sofrido uma série de incidentes antissemitas contra sinagogas, edifícios e carros desde o início da guerra de Israel em Gaza, em retaliação pelo ataque do Hamas de 7 outubro de 2023, todos eles sem vítimas mortais. Este domingo, 14 de dezembro, um ataque a tiro na Praia de Bondi, em Sidney, durante uma celebração do primeiro dia da festa judaica Hanukkah, matou pelo menos 16 pessoas, não sendo claro se entre elas conta um dos dois atiradores, tornando-se o pior ataque contra judeus fora de Israel nos últimos dois anos. O vice-primeiro-ministro da Austrália, Richard Marles, classificou o ataque como um “momento negro para a nossa nação”, enquanto o chefe do governo, Anthony Albanese, sublinhou que “um ataque contra os judeus australianos é um ataque contra todos os australianos”, acrescentando que “não há lugar para este ódio, violência e terrorismo na nossa nação. Deixem-me ser claro: vamos erradicá-los”.Promessa que poderá não convencer a comunidade judaica australiana. “Estou horrorizada e devastada com o sucedido, mas não surpreendida”, declarou Lynda Ben-Menashe, presidente do Conselho Nacional de Mulheres Judias da Austrália, ao jornal Times of Israel. “Nos últimos dois anos, o antissemitismo tem aumentado de mês para mês, e o governo não tem dado ouvidos aos nossos apelos. Quando não há consequências visíveis para o incitamento ao ódio, a violência acontece sempre.”Também o primeiro-ministro israelita, falando horas depois do ataque, recordou ter enviado uma carta em agosto ao homólogo australiano, acusando Camberra de alimentar “este fogo antissemita”. Benjamin Netanyahu, citando a missiva, afirmou que as políticas levadas a cabo por Albanese - com destaque para o reconhecimento do Estado palestiniano - incentivam “o ódio aos judeus que agora assola as suas ruas. O antissemitismo é um cancro. Espalha-se quando os líderes se calam. É preciso substituir a fraqueza pela ação”.Foi precisamente em agosto que Albanese acusou o Irão de estar por trás de dois ataques incendiários antissemitas na Austrália, anunciando que Camberra tinha expulsado o embaixador de Teerão e que iria incluir a Guarda Revolucionária na lista de organizações terroristas.Num ataque indireto ao governo australiano, Netanyahu disse este domingo também que Telavive continuará “a denunciar aqueles que não denunciam, mas incentivam. Continuaremos a exigir-lhes que façam o que é exigido aos líderes das nações livres. Não desistiremos, não baixaremos a cabeça, continuaremos a lutar como os nossos antepassados lutaram”. O líder israelita classificou ainda como “terrível” e “um assassinato a sangue frio” o ataque na Praia de Bondi. “Infelizmente, o número de vítimas aumenta a cada minuto. Vimos a profundidade do mal”.As duras palavras de Netanyahu encontraram eco no líder da diplomacia israelita, através de um telefonema feito pela sua homóloga australiana, Penny Wong, tendo Gideon Sa’ar acrescentado ainda que “a segurança da comunidade judaica na Austrália só será alcançada através de uma mudança real na atmosfera pública.”A enviada especial do governo para o combate ao antissemitismo na Austrália apelou a uma reação nacional semelhante à do massacre de Port Arthur, em 1996, numa referência ao incidente em que 35 pessoas foram mortas num ataque a tiro nesta zona turística da Tasmânia. De recordar que o incidente deste domingo na Praia de Bondi é o pior massacre a tiro desde Port Arthur, que levou à criação de leis rigorosas de controlo de armas.“Este momento exige a mesma ação. As palavras já não bastam. Um ataque a uma celebração judaica pacífica é um ataque ao nosso caráter nacional e ao nosso modo de vida. A Austrália deve defender ambos”, disse Jillian Segal. “Para os australianos comuns, este momento exige clareza. O que antes parecia distante ou desconfortável já não pode ser ignorado. Provocações vindas das escadarias da Ópera de Sidney, sinagogas incendiadas e agora massacres numa celebração formam um padrão claro. Esta não é a Austrália que conhecemos e não pode ser a Austrália que aceitamos.”Pelo menos 16 pessoas morreram e cerca de 40 ficaram feridas quando homens armados, alegadamente dois, abriram fogo contra uma celebração de Hanukkah na Praia de Bondi, ataque que as autoridades australianas descrevem como terrorista. Um dos atiradores também morreu. Foram encontrados vários “dispositivos suspeitos” após o tiroteio.Um homem que correu para o local para deter um dos atiradores foi identificado por um familiar ao canal Seven News como sendo Ahmed al Ahmed, de 43 anos e dono de uma frutaria, que acabou por sofrer dois ferimentos de bala, um no braço e outro na mão, mas está a recuperar bem no hospital. Num primeiro momento, Netanyahu descreveu este homem como sendo um judeu protagonista de “heroísmo judaico”, mas depois de conhecida a sua indentidade, o líder israelita corrigiu-se dizendo que “testemunhámos a ação de um homem corajoso, que se revelou um homem muçulmano corajoso, e saúdo-o, que impediu um destes terroristas de matar judeus inocentes”.Alex Kleytman, sobrevivente do Holocausto e natural da Ucrânia, foi identificado como outra das vítimas. “Estávamos de pé e, de repente, ouvimos um ‘bum bum’ e todos caíram. Nesse momento, ele estava atrás de mim e, a certa altura, decidiu aproximar-se. Ele impulsionou-se para cima porque queria estar perto de mim”, contou ao diário The Australian a sua mulher, Larisa.O rabino Eli Schlanger, que também perdeu a vida ontem, havia escrito uma carta ao primeiro-ministro australiano, pedindo-lhe apoio para Israel. “Como rabino em Sidney imploro-lhe que não traia o povo judeu e nem o próprio Deus”, escreveu Schlanger a Albanese. “Os judeus foram arrancados da sua terra vezes sem conta por líderes que são agora recordados com desprezo nas páginas da História. O senhor tem a oportunidade de ficar do lado da verdade e da justiça”, referia a missiva, segundo a estação israelita Channel 12.