Quando o presidente norte-americano, Donald Trump, se reuniu no final de outubro com o homólogo chinês, Xi Jinping, na Coreia do Sul, a conversa não foi só sobre a guerra comercial entre Washington e Pequim ou sobre tarifas. O republicano falou também do caso de Jimmy Lai, magnata dos media de Hong Kong, dizendo que faria tudo para o "salvar" e sugerindo que a sua libertação seria boa para as relações entre os dois países e a imagem da China no mundo.Esta segunda-feira (15 de dezembro), após mais de 1800 dias preso na solitária e 156 dias de julgamento, o ativista de 78 anos, com diabetes e outros problemas de saúde, conhece finalmente o veredito. Arrisca a prisão perpétua num processo que se tornou emblemático da repressão aos direitos humanos desencadeada pelas draconianas leis de segurança nacional introduzidas por Pequim em 2020 para esmagar o movimento de protesto pró-democracia na região administrativa especial.Mas quem é Jimmy Lai e o que está em causa? O magnata dos media, que nasceu em Cantão em 1947, fugiu para Hong Kong quando tinha apenas 12 anos, escondido num barco de pesca. Ainda criança começou a trabalhar na indústria têxtil para sobreviver, acabando por subir até se tornar gerente. Com apenas 28 anos, comprou a sua própria fábrica e em 1981 fundou a sua marca de roupas, Giordano.Depois do massacre da praça de Tiananmen, em 1989, tornou-se num ativista pró-democracia e virou-se para o setor dos media, acabando por fundar pouco antes da passagem de Hong Kong para as mãos chinesas, em 1997, o jornal Apple Daily, que nunca poupou críticas às autoridades de Pequim.Ao abrigo da ideia de "um país, dois sistemas", a justiça de Hong Kong continuou a ser baseada no sistema inglês (os britânicos estiveram mais de 150 anos no território), o que garantia a Jimmy Lai uma maior proteção do que se estivesse na China continental. Mas, em 2019, o governo apresentou uma proposta de lei que permitiria a extradição de suspeitos para, entre outros locais, a China, temendo-se que isso fosse pôr em causa a autonomia de Hong Kong. Isso desencadeou os maiores protestos que o território tinha visto.O Apple Daily rapidamente se colocou ao lado dos manifestantes, que foram reprimidos violentamente pela polícia. A proposta de lei da extradição acabou por cair. Mas, em resposta aos protestos, o Governo chinês impôs em 2020 uma nova lei de segurança nacional sobre Hong Kong, que criminalizou os crimes de sedição (remontava aos tempos coloniais e não era aplicado há décadas), subversão, terrorismo e conluio com forças estrangeiras, com uma interpretação tão lata que na prática criminaliza a liberdade de expressão e de protesto, levando à detenção de dezenas de dissidentes.Jimmy Lai e os filhos foram presos em agosto de 2020, depois de a polícia fazer buscas à empresa detentora do jornal, a Next Digital, por suspeitas de fraude e conluio com forças estrangeiras (um dos novos crimes). Na altura, pagou uma fiança e ficou em liberdade, apenas para voltar a ser detido em dezembro desse mesmo ano, após ser acusado formalmente de fraude. Em 2021, acabaria condenado em duas ocasiões a 14 meses de prisão por reunião não autorizada, em eventos que remontavam a agosto e outubro de 2019, com o Apple Daily a publicar a última edição a 24 de junho de 2021 e a fechar o site.Lai, que tem passaporte britânico, é acusado de usar o jornal como plataforma para conspirar com outros seis ex-executivos para produzir publicações sediciosas entre abril de 2019 e junho de 2021 (um total de 161 artigos, incluindo 33 de opinião escritos pelo próprio Lai) e de conluio com forças estrangeiras entre julho de 2020 e junho de 2021. É também acusado de trabalhar em conjunto com ex-funcionários do Apple Daily, políticos estrangeiros e ativistas para convidar países como os EUA, o Reino Unido ou o Japão a impor sanções, bloqueios e outras medidas hostis contra Hong Kong e a China, através do grupo “Stand With Hong Kong, Fight For Freedom” (que se pode traduzir por "apoiem Hong Kong, lutem pela liberdade).Ao longo do julgamento, que durou 156 dias, a acusação alegou ter "provas esmagadoras" de que Lai era o "cérebro" por detrás da operação. Todos os acusados, à exceção do magnata dos media, declararam-se culpados, com cinco a tornarem-se testemunhas da acusação. Lai disse em tribunal (e testemunhou durante 52 dias) que nunca pediu aos EUA que se envolvesse em atos hostis contra a China. "Estava preocupado com a liberdade e os direitos humanos em Hong Kong", disse. E que seria "suicida" pedir que fossem aplicadas sanções depois de a lei de segurança nacional entrar em vigor.Na sexta-feira (12 de dezembro), o tribunal de West Kowloon anunciou que o veredito será conhecido esta segunda-feira, numa audiência a partir das 10h00 locais (02h00 em Lisboa). Caso seja declarado culpado, conhecerá numa data posterior qual será a pena de prisão (arrisca a perpétua). Em pelo menos duas ocasiões durante o julgamento, Lai descreveu-se como "preso político", sendo criticado pelos juízes.Amplamente visto como um teste à independência judicial de Hong Kong, o veredicto será proferido por três juízes - Esther Toh, Alex Lee e Susana D'Almada Remedios - que foram escolhidos a dedo pelo líder pró-Pequim de Hong Kong para julgar casos relativos à lei de segurança nacional.A organização não-governamental Repórteres Sem Fronteiras manifestou a sua indignação pelo anúncio "de última hora" do veredito iminente, condenando um julgamento "arbitrário e ilegal" e apelando ao Reino Unido e aos EUA para que pressionem a China. "Este veredito determinará não só o destino de Jimmy Lai, mas também o futuro da liberdade de imprensa" em Hong Kong, alegaram.A família (os filhos vivem no exílio nos EUA) e os advogados de Lai afirmam que a sua saúde está a deteriorar-se após mais de 1800 dias em regime de solitária, e que sofre de diabetes, hipertensão arterial e palpitações cardíacas que requerem medicação.As autoridades de Hong Kong alegam que Lai está sujeito às mesas condições de detenção que "os outros presos" e que os serviços médicos na prisão são "abrangentes"..Jimmy Lai: o magnata dos media de Hong Kong que Pequim abomina