Jimmy Lai: o magnata dos media de Hong Kong que Pequim abomina
A sua detenção nesta segunda-feira, ao abrigo da nova lei de segurança nacional que Pequim impôs a Hong Kong, não é uma surpresa para quem segue de perto a política na região, incluindo o próprio magnata, que disse saber que seria um dos alvos.
"Estou preparado para a prisão", disse o homem de 71 anos à AFP nos escritórios da Next Digital, o maior e mais agressivo dos grupos de media pró-democracia, numa entrevista duas semanas antes de a lei entrar em vigor, a 30 de junho.
"Se chegar, terei a oportunidade de ler livros que não li. A única coisa que posso fazer é ser positivo", acrescentou.
Para muitos residentes do território semiautónomo, ele é um herói pouco provável - um agressivo dono de tabloides, que subiu às suas próprias custas, e que é o único magnata disposto a criticar Pequim.
Mas nos media estatais chineses ele é um "traidor", o principal responsável por detrás dos enormes protestos pró-democracia do ano passado e o líder do "gangue dos quatro" que conspira com as potências estrangeiras para prejudicar a pátria-mãe.
Como muitos dos magnatas de Hong Kong, Lai veio da pobreza. Nasceu na China continental, na província de Cantão, dentro de uma família rica que perdeu toda a fortuna quando os comunistas chegaram ao poder, em 1949.
Contrabandeado para Hong Kong quando tinha 12 anos, trabalhou nas fábricas, aprendeu sozinho o inglês e eventualmente fundou o bem-sucedido império de roupas Giordano.
Mas o seu percurso divergiu dos seus contemporâneos em 1989, quando a China enviou tanques para esmagar os protestos pró-democracia na Praça de Tiananmen, em Pequim.
Fundou o seu primeiro jornal pouco depois e escrevia colunas regularmente a criticar os líderes chineses. As autoridades começaram então a fechar as suas lojas de roupa na China continental, por isso Lai desfez-se do negócio e pôs o seu dinheiro no império de media e nos tabloides.
Esta não é a primeira vez que Lai é detido. Junto com dezenas de ativistas pró-independência, ele enfrenta diferentes acusações por ter participado nos protestos do ano passado e por desafiar a Polícia ao participar numa vigília por Tiananmen, a 4 de junho, que tinha sido proibida.
Antes da nova lei de segurança nacional ter sido aprovada, os media estatais chineses acusavam-no várias vezes de conluio com potências estrangeiras, nomeadamente depois de se ter encontrado no ano passado com o secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, e com o vice-presidente dos EUA, Mike Pence.
"O que quer que escrevamos, o que quer que digamos, pode ser subversão, pode ser sedição", previu.
Os dois principais títulos do seu grupo de media - o jornal Apple Daily e a revista Digial Next - apoiam abertamente os protestos pró-democracia numa cidade onde os concorrentes ou apoiam Pequim ou tratam o tema com muito mais cuidado.
As duas publicações há anos que quase não têm publicidade, já que as marcas não querem atrair a ira de Pequim, com Lai a cobrir as perdas com o seu próprio dinheiro.
Mas são populares, oferecendo uma mistura de notícias de celebridades, escândalos sexuais e investigação genuína, como uma série recente sobre como as casas de alguns responsáveis da Polícia violavam as licenças de construção.
Questionado sobre o porquê de arriscar tanto a sua riqueza como a sua liberdade ao criticar Pequim e ao apoiar o movimento pró-democracia, respondeu: "Sou um causador de problemas. Cheguei aqui sem nada, a liberdade desde local deu-me tudo. Talvez seja altura de pagar por essa liberdade lutando por ela."