Confrontada com o avistamento de drones junto ao aeroporto de Munique no início do mês, a Alemanha decidiu declarar guerra aos veículos aéreos não tripulados, que as autoridades suspeitam poder estar ao serviço da Rússia, e autorizar a polícia a abater os aparelhos que violem o espaço aéreo alemão. O problema, lembrou ao Politico o presidente da Comissão de Defesa do Parlamento alemão, o conservador Thomas Röwekamp, é que os agentes federais “não têm a capacidade técnica para o fazer”. E que o exército está impedido pela Constituição de agir nestes casos. As forças armadas alemãs, a Bundeswehr, só podem pegar em armas em território nacional em caso de invasão em massa. Até agora, a Alemanha foi alvo de algumas incursões de drones, que se suspeita estarem a ser usados na guerra híbrida da Rússia contra alguns países europeus, mas não se registou qualquer incidente de grande dimensão. Ora a Constituição alemã, adotada na sequência da Segunda Guerra Mundial foi pensada para evitar interferências das forças armadas em território nacional e limitar o seu papel na segurança interna. Uma reação aos tempos nazis, como recorda, também ao Politico, Kathrin Groh, professora de Direito Público na Universidade da Bundeswehr em Munique, que lembrou que tanto nos tempos da Alemanha imperial como na República de Weimar, que antecedeu a II Guerra, o exército alemão “era frequentemente usado de forma implacável, geralmente para atacar os social-democratas e os governos de esquerda”. O que explica que os autores da Constituição tenham procurado evitar que a História se repetisse, criando regras claras ainda em vigor. Na quarta-feira passada, o Parlamento alemão aprovou legislação que permite aos agentes da polícia federal disparar e abater drones em caso de ameaça grave ou dano sério. Outras técnicas ao seu dispor passam pelo recurso a lasers ou sinais de interferência para cortar as ligações de controlo e navegação. “Os incidentes com drones ameaçam a nossa segurança”, admitiu o chanceler Friedrich Merz no X. E garantiu que: “Não permitiremos isso. Estamos a reforçar os poderes da polícia federal para que os drones possam ser detetados e combatidos mais rapidamente no futuro.”A nova lei surge depois de dezenas de voos terem sido desviados ou cancelados no dia 3 de outubro no aeroporto de Munique, o segundo maior da Alemanha, deixando mais de dez mil passageiros retidos, após avistamentos de drones não autorizados.Merz explicou presumir que a Rússia esteja por trás dos drones que sobrevoaram a Alemanha nessa altura, mas nenhum estava armado, encontrando-se em voos de reconhecimento.Neste momento, o exército só pode abater drones que sobrevoem bases militares. Nos outros casos, a Bundeswehr apenas pode, de acordo com a Constituição, prestar “assistência administrativa”, ou seja, ajudar a identificar os drones ou recolher mais informação. Perante os recentes avistamentos, o ministro do Interior alemão, Alexander Dobrindt, defendeu a criação de uma Unidade de Defesa e de um Centro de Defesa Nacional contra drones, que juntaria os recursos da polícia, das secretas e das forças armadas. O ministro prometeu ainda uma lei para permitir aos militares abater drones em território nacional em caso de risco de vida. Mas esta arrisca-se a ser inconstitucional, o que obrigaria o governo a mexer na Lei Fundamental alemã. Ora à frente de um executivo minoritário e num país onde os extremos, de direita e de esquerda, estão a crescer, parece pouco provável que Merz consiga os dois terços dos votos que precisaria para mudar a Constituição. Outro desafio quando se fala em abater drones é a dificuldade em distinguir entre “bons” e “maus”. É que nem todos os veículos aéreos não tripulados são perigosos. Muitos são usados para fins civis, como os que transportam medicamentos, vacinas e amostras de sangue entre hospitais - uma forma rápida e eficaz de evitar o trânsito nas estradas e acelerar o transporte.Na Alemanha, estes drones “bons” têm uma placa de matrícula digital chamada EID para facilitar a sua identificação. Uma obrigação que, por exemplo, os minidrones de uso puramente recreativo não têm. Ao Euronews, Norman Koerschulte, fundador da Morpheus Logistik, empresa de drones para fins logísticos, defendeu haver regras claras nos céus, como existem nas estradas, além de um sistema de identificação nacional, obrigatório para todos que seja “tão transparente quanto o Flightradar24”, a plataforma que monitoriza os aviões tripulados em tempo real..Rússia usa "esquadra fantasma" para lançar drones contra a Europa, acusa Zelensky.Xavier Petit: “Gostaríamos de lançar drones dos nossos submarinos. E recuperá-los”