Carlos Antunes, diretor da TAP nas Américas
Carlos Antunes, diretor da TAP nas AméricasFOTO: DR

Carlos Antunes: “Guerra comercial obrigou a TAP a baixar preços no Brasil”

Diretor da TAP para as Américas relativiza os prejuízos do 1º trimestre, impactados pela concorrência no Brasil. Até ao final do plano de reestruturação não haverá novas rotas para o país, garante.
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As contas dos primeiros três meses do ano foram negativas para a TAP que registou prejuízos de 108 milhões de euros, num tombo de 20% face ao mesmo período de 2024. A forte concorrência num dos principais mercados da companhia aérea pressionaram a transportadora portuguesa a reduzir as tarifas nas rotas do Brasil o que impactou as receitas desta geografia em 6%. “Quando a concorrência aumenta a capacidade mais do que nós existe uma guerra comercial e, naturalmente, de preços que somos obrigados a acompanhar. Se há mais concorrentes no mercado e que baixam o preço, nós temos de seguir”, explica ao DN o diretor da TAP para as Américas.

Carlos Antunes relativiza os resultados no vermelho e relembra que o arranque do ano “é sempre o período mais complicado para qualquer companhia aérea” devido ao nível de custos que impacta as tesourarias.

A competição feroz entre os vários players que operam neste país da América do Sul levou a que as viagens na TAP entre janeiro e março fossem mais baratas, admite o responsável, embora sem balizar o decréscimo. “Não temos esses números, não foi uma percentagem fixa. Tudo isto é muito dinâmico, fazemos milhares de ajustes de preços todos os dias, os nossos sistemas veem os preços da concorrência e ajustam”, refere. O calendário da Páscoa este ano foi outro dos fatores que pesou na performance da transportadora de bandeira.

Sem a procura deste período refletida nas contas do primeiro trimestre, a empresa liderada por Luís Rodrigues reagiu com descontos. “Logo a seguir à Páscoa lançámos uma campanha de preços promocionais. Fazemos isso com bastante frequência, é uma forma de estimular preços mais baratos e depois vamos ajustando a capacidade e vamos vendo como é que as campanhas se saíram”, aponta.

Além dos constrangimentos referidos, também a capacidade oferecida pela TAP nas rotas do Brasil influenciou os indicadores do trimestre. No intervalo em análise, o número médio diário de assentos avançou timidamente, com uma evolução de apenas 2% que compara com os 18% dos seus concorrentes.

“Praticamente não aumentámos a nossa capacidade. No primeiro trimestre de 2024 tínhamos a rota de Porto Alegre com seis frequências semanais e este ano só a lançámos em abril. Apesar de contarmos com as novas ligações de Florianópolis [inaugurada em setembro de 2024] e de de Manaus [retomada em novembro de 2024], temos menos frequências”, observa.

O diretor da TAP no Brasil explica ainda que a capacidade dos aviões das novas rotas também é menor. Enquanto que a ligação a Porto Alegre é feita com um A330-900 neo, que transporta até 298 passageiros, em Florianópolis é operado um Airbus A330-200, com capacidade para 269 passageiros. “Pensando bem, ainda são 30 passageiros de diferença na ida e na volta por cada voo. Já em Manaus [A321 neo, 154 passageiros],dividimos a capacidade com Belém, não temos a capacidade de um avião inteiro”, elucida.

Otimismo para o verão

A guerra de preços deverá estender-se ao longo dos próximos meses, mas o cenário não preocupa o responsável da TAP, que lidera a pasta do mercado brasileiro há cinco anos.

“Temos de trabalhar com as nossas ferramentas e com os nossos diferenciais. Temos de ser muito competitivos e precisamos de assegurar que continuamos a ser uma das companhias aéreas preferidas dos brasileiros para viajarem para a Europa”, defende.

Já sobre a operação de verão, mostra-se otimista. “Apesar de não termos este aumento consistente de capacidade no Brasil em relação ao ano passado e de estarmos a notar que o mercado está a vender bilhetes mais baratos, o nosso objetivo é chegarmos aos mesmos números de 2024”, antecipa.

Investimento no Brasil travado até ao final do plano de reestruturação

Depois de retomar a ligação entre Lisboa e Porto Alegre, em abril, o plano de investimentos da TAP no Brasil está fechado até ao final de 2025. Carlos Antunes rejeita a possibilidade de abrir uma 14ª rota nos próximos meses e assegura que o foco está na solidificação da operação, relembrando que a TAP se encontra ainda sob as ordens de Bruxelas até final do ano. “Não temos mais aeronaves que possamos utilizar, temos 99 aviões que é o nosso limite máximo. Ainda estamos a cumprir o plano de recuperação da Comissão Europeia (CE)”, frisa.

A restrição do número de aviões a operar, um dos remédios impostos pela CE no âmbito do plano de reestruturação aprovado em 2021, e que visou uma injeção do Estado de 3,2 mil milhões de euros, tem sido um dos desafios da empresa. “Temos trabalhado nos últimos anos de forma muito competente para transformar algumas das aeronaves menores em maiores. Se temos um número de aviões finito vamos trocá-los por outros maiores e é por isso que temos crescido tanto nos Estados Unidos e no Brasil. Não podemos, naturalmente, trocá-los todos sob o risco de ficarmos sem aviões pequenos para fazer a operação intraeuropeia”, esclarece.

A companhia portuguesa liga, atualmente, Lisboa e o Porto a 13 cidades do Brasil, num total de 15 rotas diretas. Na Portela a transportadora oferece voos para São Paulo, Rio de Janeiro, Belém, Belo Horizonte, Brasília, Fortaleza, Natal, Maceió, Porto Alegre, Recife, Salvador, Florianópolis e Manaus. Já a Norte, o Porto está conectado a São Paulo e ao Rio de Janeiro.

Curitiba e João Pessoa de fora dos planos, bem como Funchal e Algarve

O apetite dos vários estados do Brasil pela TAP tem sido crescente, com diversas entidades governamentais a apelar ao investimento da companhia. “Toda a gente quer voos da TAP pelo impacto socioeconómico positivo que gera e entendemos isso. Contudo, para nós tem de fazer sentido em aspetos como rentabilidade”, alerta. O DN falou com Carlos Antunes à margem da inauguração do Vila Galé Collection Ouro Preto, em Minas Gerais. Durante a conferência de imprensa de apresentação do investimento do segundo maior grupo hoteleiro português, Romeu Zema, o governador deste estado brasileiro, reiterou o pedido de mais ligação à TAP para o aeroporto de Belo Horizonte, sustentando que os aviões estão já lotados.

Ao DN, Carlos Antunes refreia as expetativas e descarta a hipótese de um incremento de frequências. “Já existem seis ligações semanais, não faz sentido. Até podemos aumentar as ligações, mas tem de haver procura”, responde, garantindo que a ocupação atual destes voos ainda está longe do limite. “As pessoas veem muita gente no avião e acham que os voos estão lotados, não estão. Há uma regra básica que diz que quando temos uma rota com 90% dos voos a uma capacidade acima de 90% estamos a precisar desesperadamente de novas frequências e não é o caso”, assegura.

O diretor da TAP contradiz ainda o presidente da Embratur, a Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo, que afirmou ao DN, na semana passada, estar em negociações com a TAP para a abertura de uma nova rota em João Pessoa, na Paraíba. Marcelo Freixo assumiu ainda o desejo de a companhia alargar as ligações na região Nordeste. “Já temos uma malha extremamente qualificada no Nordeste com muitos voos e uma grande capacidade. Se quisermos trazer passageiros de João Pessoa temos parceiros como a Azul, a Latam e a Gol para estes voos domésticos. É como em Portugal: as pessoas do Norte apanham um voo doméstico para Lisboa ou vão de transportes”, justifica Carlos Antunes.

O gestor salienta a relação de proximidade entre a TAP e a Embratur, bem como as restantes entidades do país que têm trabalhado em conjunto com a transportadora, mas vinca a prioridade de, para já, “maturar as atuais rotas”. O diretor da TAP neste mercado nega também que estejam a ser encetadas conversações para uma rota em Curitiba, a capital do estado do Paraná. “Curitiba é uma cidade espetacular com potencial enorme de procura e de negócios. É a sede de grandes empresas e é um estado muito bem posicionado no Brasil, mas não conseguimos voar para o aeroporto de Curitiba porque a pista é demasiado curta”, lamenta.

Olhando para o mapa nacional, Carlos Antunes rejeita ainda a hipótese de desenhar ligações com o Brasil a partir de outros aeroportos, nomeadamente do Funchal - um desejo manifestado ao DN pelo Secretário Regional do Turismo e Cultura da Madeira, Eduardo Jesus. “Do ponto de vista do mercado, não vemos procura que justifique voos diretos com a Madeira ou com os Açores”, diz. A ânsia de receber uma ligação direta ao Brasil é partilhada a Sul pelo presidente da Região de Turismo do Algarve, André Gomes. A resposta da TAP, mantém-se. “Dizer a um brasileiro para ir para a praia no Algarve não faz sentido e o Algarve está apenas a 200 quilómetros de Lisboa”, acrescenta.

Portugal já não é o principal destino dos brasileiros que voam na TAP

No ano passado, a TAP transportou um recorde de dois milhões de passageiros entre o Brasil e Portugal. Do total de viajantes que partem do outro lado do Atlântico num avião da companhia portuguesa apenas 40% ficam no país - uma fatia, através do programa Stopover que permite fazer uma paragem em Portugal antes de prosseguir para o destino final.

O diretor da TAP nas Américas acredita que este cenário é uma oportunidade para o país “Portugal já não é o principal destino dos brasileiros, nem o preferido, mas ainda somos a companhia aérea europeia que mais passageiros transporta para toda a Europa”, destaca.

Apontando para a pequena dimensão do país, o responsável explica que o modelo de hub beneficia a TAP nos 50 destinos na Europa onde opera. “A Europa é o que nos sustenta. Temos 102 voos por semana no Brasil, a partir de 13 cidades. Se contássemos só com Portugal, não sustentaríamos isto tudo”, afiança.

Apesar de a maioria dos passageiros serem transportados para outros destinos, é a economia nacional que ganha, atesta. “A TAP é o maior exportador de serviços de Portugal e representa cerca de 1,8% do PIB português. Todos os passageiros que estão a viajar através de Lisboa para ir para Madrid, Frankfurt ou Roma, por exemplo, estão a enviar divisas para Portugal porque compram serviços à companhia aérea portuguesa e não à companhia aérea italiana ou brasileira”, conclui.

*A jornalista viajou para o Brasil a convite da Vila Galé e da TAP

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