O Turismo de Portugal antecipou um recorde de receitas de 27 mil milhões de euros este ano. O desempenho do Algarve ficará em linha?Estamos a crescer em todos os indicadores relativamente a 2023 e temos a expetativa de terminar o ano com um resultado superior. No acumulado de janeiro a setembro crescemos, em média, 2,5% em hóspedes e dormidas. Já os proveitos subiram 8%..Qual foi o papel do golfe nesses resultados?Se no ano passado atingimos um recorde de 1,4 milhões de voltas jogadas, neste momento registamos um crescimento 5,7% . Reforçamos o nosso peso e somos, atualmente, responsáveis por 67% de toda a atividade que é jogada no país..O presidente do Conselho Nacional da Indústria do Golfe advertiu, recentemente, para os impactos da seca e alertou para o eventual encerramento de campos. É este o cenário no Algarve? Não. Já conseguimos demonstrar que os campos de golfe pesam apenas 6% na água que é consumida na região e têm sido precursores no investimento em melhorias da eficiência hídrica. Ao contrário do que foi vaticinado, não vemos campos de golfe a fechar, mas sim a ser requalificados. Esses investimentos estão a acontecer, como é o exemplo do Amendoeira Golf ou do grupo Arrow em Vilamoura, que está a requalificar os campos elevando a qualidade da oferta tornando-os mais eficientes do ponto de vista da gestão hídrica. Temos um plano de eficiência hídrica e, até 2026, queremos ter metade dos nossos campos totalmente regados com águas residuais tratadas e é nesse sentido que os campos estão a investir. Os campos de golfe têm sido um exemplo na região perante os desafios dos últimos anos.Como explica o crescimento do mercado interno numa altura em que o Algarve bateu um recorde de preços – em agosto registou um rendimento médio por quarto ocupado superior a 200 euros?O Algarve continua a ter oferta para todas as carteiras e o alojamento local (AL) tem uma preponderância muito grande com mais de 44 mil registos. Não tenho dúvidas de que muitos portugueses encontram uma resposta precisamente nesta tipologia da oferta..São os estrangeiros que alavancam a hotelaria mais cara enquanto o mercado interno opta pelo AL?A capacidade de dispor mais dinheiro para o lazer poderá ser, de facto, mais forte por parte dos turistas estrangeiros, mas também temos turistas nacionais com capacidade para ficar nos nossos hotéis de cinco estrelas. .Os preços mais baixos dos principais destinos concorrentes não são uma ameaça?Não nos preocupa porque continuamos com um bom desempenho em todos os indicadores e porque acreditamos que a nossa oferta passa, obviamente, por uma valorização ao nível do preço. Os aumentos verificados do ano passado para este foram normais, considerando as subidas dos custos de produção e a maior valorização por parte dos recursos humanos..Olhar para o Algarve como um destino caro não é um problema?Enquanto o desempenho da atividade se mantiver, não é. É sinal que temos capacidade de atrair clientes com maior capacidade financeira para gastar em lazer e isso reflete-se nas dormidas, nos hóspedes e nos proveitos. É importante, depois, que estes proveitos tenham impacto ao nível da economia do território e sejam sentidos pelas comunidades locais e pelos trabalhadores..E já têm esse impacto?Creio que sim, mas é importante que se continue a refletir ainda mais. Através do nosso Observatório de Turismo Sustentável costumamos fazer inquéritos aos residentes sobre as suas perceções e concluímos que há uma satisfação por parte dos residentes sobre o impacto do turismo na região. Temos, inclusive, uma franja que entende que há margem para crescer. O Algarve não tem overtourism..Na parte dos desafios, o que vos dizem os residentes? A questão da habitação continua a ser um problema?Sim e tentamos gerir da melhor forma possível. Estamos a trabalhar com os municípios e com as associações do setor para encontrar soluções para um problema que não tem uma solução de um dia para o outro. É preciso impulsionar os investimentos por parte dos municípios para a construção de nova habitação, nomeadamente através das casas de função. Já apresentámos propostas concretas no sentido de serem definidos terrenos que possam ser cedidos para a construção destas casas para albergar os nossos trabalhadores com exclusividade de uso, ou seja, durante 30, 40 ou 50 anos, e que não possam ter outro fim. Infelizmente, não posso dizer que tenhamos tido grandes respostas até ao momento por parte dos municípios..A mobilidade é outra das dores de cabeça…A região tem vários investimentos estruturais que continua à espera de ver concretizados. Tenho até o sentimento de alguma inveja ao ver investimentos noutras regiões do país, no Algarve é sempre tudo mais difícil de acontecer. Temos uma única autoestrada, e com portagens, que liga a região de uma ponta à outra e, mesmo assim, não completamente o que resultou numa série de dificuldades em termos de mobilidade. Podemos partir para a questão da ferrovia e para outras áreas de investimento. Se em Lisboa estão à espera de um aeroporto há 50 anos, no Algarve aguardamos um hospital central há 20 anos. Considero que isto tem a ver com o facto de o Algarve não ser devidamente reconhecido pelo seu contributo para a economia nacional. Somos responsáveis por cerca de 40% dos proveitos gerados pelo turismo, mas depois não vemos esse reconhecimento materializado nestes investimentos estruturais fundamentais..Tem sido um dos críticos à dotação atribuída às entidades regionais de turismo (ERT), que se mantém inalterada desde 2016. Há uma falta de reconhecimento também no Orçamento do Estado para 2025?Não posso estar satisfeito com este orçamento. Primeiro, porque as ERT têm novamente a mesma dotação ao cêntimo. Reconheço a disponibilidade por parte do secretário de Estado do Turismo e do Presidente do Turismo de Portugal (TdP) para tentar reforçar as nossas verbas através do financiamento do TdP, mas esperava um reconhecimento mais claro com base nos resultados recorde que apresentamos todos os anos. O setor conseguiu antecipar resultados que estavam previstos apenas para 2027 e isso merecia, por parte do Governo, um reconhecimento mais efetivo. No que respeita à região, e pelos exemplos que já dei, o Algarve merecia um maior reconhecimento do ponto de vista orçamental.A taxa turística tem sido criticada pelas principais associações do setor, mas no Algarve há cada vez mais municípios a aplicá-la.Sou claramente um defensor das taxas turísticas na perspetiva de que permitem uma diversificação das fontes de financiamento para dar resposta aos desafios que a atividade impõe. Neste momento, temos sete municípios a cobrar taxa turística e agrada-me ver que, na generalidade, se basearam nos regulamentos que desenhámos em colaboração com as principais associações da região. A questão chave prende-se com a aplicabilidade dessas verbas. Sou muito respeitador das legitimidades de cada entidade e temos feito um trabalho de sensibilização para que haja transparência e comunicação. É importante que as comunidades locais saibam, efetivamente, onde é que está a ser investida a taxa turística.Concorda com a posição da Associação da Hotelaria de Portugal que defende uma isenção deste imposto para o mercado interno?Não vou dizer que a defenda, mas era uma situação perfeitamente viável. Não me chocava até na perspetiva de fomentar o turismo interno. Mas, por outro lado, também entendo que a cobrança de taxa turística não é dissuasora do turismo nem será por aí que o turista nacional deixará de passar férias no Algarve..No que respeita às ligações aéreas, no próximo ano é inaugurada a primeira rota direta para os Estados Unidos. Será uma alavanca estrutural para o crescimento deste mercado?A nova rota para os Estados Unidos, que começa em maio, já está com bilhetes à venda e o feedback que temos da United Airlines é positivo, com boas vendas e preços competitivos. Este ano inaugurámos uma rota com a SATA para os Estados Unidos, via Ponta Delgada, e metade dos passageiros que vêm em cada voo são norte-americanos. Esta rota estava prevista apenas para o verão e já foi estendida para a época baixa também..Mesmo sem uma ligação direta este mercado continua a ganhar força?Precisamente. Neste momento registamos um crescimento do mercado norte-americano, face a 2023, de 15% mesmo sem termos uma rota direta. E esta aposta já se reflete no conjunto de investimentos que estão a acontecer na região motivados pelo potencial de crescimento do mercado norte-americano..Na hotelaria?Sim, entre investimentos já concretizados e outros anunciados. Temos três hotéis Hilton a ser construídos em Lagos, um novo Hard Rock previsto para Portimão e há também a aposta que a Arrow Global está a fazer em Vilamoura. Estamos a falar, em grande parte, de requalificação da oferta. Muitos destes projetos não visam construção nova e vêm reabilitar edificados já existentes..A TAP continua afastada dos planos para a região?Temos mantido conversas, mas infelizmente o resultado não é muito diferente. A privatização está em curso e era bom que se concretizasse para que a empresa tenha outra possibilidade de dar resposta às necessidades das diferentes regiões. Continuamos a encontrar oportunidades em que consideramos que a TAP poderia dar uma resposta e reforço esta ideia sempre que estou com o Luís Rodrigues [CEO]. Mesmo compreendendo o contexto, não deixamos de reivindicar..Já tinha manifestado o desejo numa ligação entre Faro e o Brasil, por exemplo.Vemos com bons olhos essa ligação da TAP e cremos que teria aqui um papel muito preponderante. Não vejo outra companhia a fazer este tipo de ligação que não seja a TAP. Este mercado tem tido um crescimento considerável nos últimos anos e seria muito bom concretizarmos esta rota..Mas há também uma carência de ligações internas onde a TAP poderia dar resposta?Sim, as ligações internas da TAP de Faro para Lisboa e para o Porto são muito escassas. Se houvesse uma resposta mais efetiva poderíamos impulsionar não só o turismo interno mas também o de negócios. Uma ligação de Faro ao Funchal também faria sentido. Depois da ligação com a SATA aos Açores só nos falta uma rota para a Madeira. Esperamos que ainda durante a privatização, ou no fim, possamos ter uma resposta da TAP a estes anseios..O objetivo é reforçar essas ligações através de outras companhias, nomeadamente das low cost que já tem um peso elevado na região?É possível, sim. Mas não vou esconder o apreço e o orgulho que tenho pela TAP. É a nossa companhia de bandeira e irei debater-me para que as nossas ligações estejam garantidas pela TAP, sempre que possível. Não terei qualquer problema em trabalhar com outras companhias, mas tentarei primeiro fazê-lo com a TAP e, não conseguindo, iremos procurar outras companhias que possam garantir essas ligações. Esta ligação aos Estados Unidos poderia ter sido feita com a TAP, mas foi com a United Airlines que a conseguimos concretizar. Temos cada vez mais companhias a procurar a região e isso é muito positivo.