A situação causa profundo incómodo na PSP. Em julho de 2017, a Direção Nacional desta força de segurança pediu ao Ministério da Administração Interna para avançar com um "projeto-piloto" de utilização de pequenas câmaras de filmar - que se prendem no ombro dos agentes - nos patrulhamentos da divisão da Amadora..Dois anos depois, a autorização ainda não chegou e o equipamento está a "ganhar pó" nos armazéns da PSP, atrasando este projeto inovador. Questionado diversas vezes pelo DN no último mês, o gabinete do ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, não dá explicações. Em janeiro deste ano tinha dito que estava "em fase de conclusão"..As internacionalmente designadas body cameras, a que a PSP chama de câmaras policiais de porte individual (CPPI), são usadas em vários países do mundo e consideradas uma ferramenta essencial na prevenção de abusos das autoridades e da própria corrupção, bem como na proteção dos polícias contra falsos testemunhos de suspeitos..Em Portugal, a Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI), que fiscaliza a legalidade da ação policial, também as recomendou numa recente auditoria (Cartografia do Risco), noticiada pelo DN..Esta iniciativa da PSP surgiu no rescaldo da acusação do Ministério Público (MP) contra 18 polícias da esquadra de Alfragide, julgados por crimes de sequestro, tortura, agressões e falsidade de testemunho, motivados por ódio racial, contra seis jovens negros da Cova da Moura - apenas oito acabaram por ser condenados..Filmar a verdade.Numa resposta escrita ao DN, a PSP recorda que "em julho de 2017, atendendo a que existia recetividade por parte de uma empresa fornecedora de câmaras policiais de porte individual (CPPI) em disponibilizar alguns equipamentos para a realização de testes, foi solicitada autorização à tutela a fim de poder realizar-se um projeto-piloto de utilização deste equipamento na Divisão Policial da Amadora, do Comando Metropolitano de Lisboa, durante seis meses".."Este projeto surgiu da necessidade do apuramento da verdade material nas ocorrências onde são intervenientes elementos policiais e onde exista a necessidade do uso da força, já que estas originam, recorrentemente, narrativas diversas que colocam em causa a atuação policial e contestam os factos narrados nos autos de notícia, o que, para além de lançar a dúvida no espírito de quem tem de apurar a verdade, tem impactos negativos na opinião pública, na imagem institucional da PSP e no respeito pela autoridade e seus agentes", sublinha fonte oficial da PSP..Nestes momentos, assinala a mesma fonte autorizada em resposta escrita ao DN, "a existência de imagens e sons recolhidos durante a intervenção policial seria crucial para o apuramento da verdade e para a tomada de decisões informadas e consentâneas com a realidade dos factos"..Os responsáveis desta força de segurança consideram que, "face a este fenómeno e, com a finalidade de apurar a verdade, defender os direitos humanos, responsabilizar os agentes policiais pelas suas ações e proteger os agentes de autoridade e as organizações de falsas declarações, diversas instituições a nível mundial têm equipado o seu efetivo com as CPPI"..Redução de 93% de queixas.Um estudo da Universidade de Cambridge sobre a utilização deste equipamento pelas Polícias do Reino Unido e dos Estados Unidos concluiu que se registou uma redução de 93% de queixas contra os agentes da autoridade que utilizavam as câmaras, reduzindo os conflitos entre o público e as forças de segurança. Os investigadores concluíram que, quando as pessoas sabem que estão a ser filmadas, alteram o seu comportamento e que as câmaras encorajam boas práticas, quer nos polícias quer no público..A tecnologia, que recolhe imagem e som, não permite que os seus utilizadores apaguem ou alterem os registos. A PSP elenca seis exemplos em que as body cams se têm "revelado extremamente úteis":.1 - Reduzir e retorquir queixas falsas aduzidas por cidadãos;.2 - Reduzir as taxas de utilização excessiva da força;.3 - Reduzir a probabilidade de atos ilícitos dos cidadãos durante a interação com o agente;.4 - Reforçar a conduta profissional através da responsabilização;.5 - Corroborar os relatos e a sequência de eventos;.6 - Criar provas irrefutáveis e passíveis de utilização em sede judicial (a PSP diz que "foram desencadeados os procedimentos tidos como adequados e necessários para a elaboração das respetivas comunicações para envio às autoridades judiciais, administrativas e desportivas competentes").