Escolas fechadas. Pais têm de explicar aos filhos que "não estão de férias"
"Não há manual de instruções" para os tempos que vivemos. "É uma situação nova para todos, enquanto trabalhadores e estudantes, enquanto pais e filhos", que a partir de segunda-feira deverão passar mais tempo em casa, tal como recomendado pelas autoridades de saúde. É José Morgado, psicólogo e especialista em educação infantil, quem o diz. A chegada do novo coronavírus a Portugal já fez mais de 110 infetados, obrigando o governo a fechar escolas, instituições de ensino superior e outros estabelecimentos públicos e privados.
O isolamento social é a palavra-chave para o período de mitigação que agora arranca e obriga, na opinião do especialista, "a uma aprendizagem para as pessoas confinadas ao mesmo espaço, facilitando até algum stress". Os pais perguntam o que devem fazer com os filhos; o ensino, como responder aos seus alunos.
Saber estar em casa será o primeiro desafio. Por esta altura, várias são as empresas que estão a pedir aos seus funcionários para trabalhar a partir das suas residências, muitos deles acompanhando os filhos, que continuarão em período letivo, ainda que também à distância - até 9 de abril. Em casa, os pais devem saber que "há equilíbrios a estabelecer": encontrar o meio-termo entre o tempo para a escola e para o lazer.
Antes de tudo, indica José Morgado, "é importante explicar porque é que isto está a acontecer". "Por natureza, os miúdos querem saber. O problema é a resposta que damos, e aqui o truque é não responder além daquilo que foi perguntado", diz o especialista. Feita a apresentação, os encarregados de educação "devem garantir um tempo para trabalho de natureza escolar - à escolha do miúdo, se quer fazer de manhã ou à tarde". José Morgado lembra "que isto não são férias", ecoando o lembrete já apontado pelo ministro da Educação, que na quinta-feira pedia aos alunos para se resguardarem socialmente. "E aqui entram os pais, que devem ter uma responsabilidade cívica de fazer que os seus filhos se recordem" disso mesmo, sublinha.
Por outro lado, "não devem nem apoiar o excesso nem promover estratégias proibicionistas que acabem por criar mal-estar nos miúdos que já estão completamente fora da sua rotina". "É importante também criar momentos de lazer em que a aprendizagem entra: ver documentários e procurar coisas interessantes no YouTube." Nesta semana, as empresas Porto Editora e LeYa decidiram dar acesso gratuito às suas plataformas de ensino virtual e há até operadoras de telecomunicações que anunciaram dar mais dez gigabytes a todos os utilizadores. Mas o psicólogo José Morgado considera que a escola também deve ter um papel de apoio às famílias, além dos seus alunos, de forma "a aconselhá-los sobre como devem gerir o tempo das crianças e dos jovens".
Por esta altura, os alunos do 1.º ciclo ao ensino secundário estariam na reta final da avaliação do segundo período, no caso das escolas que optaram pelo calendário clássico - em maioria. Para trás, ficam alguns testes para completar aquela que seria a nota final destes estudantes. Por ordem do Ministério da Educação, todas as escolas devem garantir que a avaliação sumativa do 2.º período seja "efetuada no período normal, com base nos elementos disponíveis nesse momento (incluindo os ainda a recolher) e no carácter contínuo da avaliação". O presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares, Manuel António Pereira, admite que "poderá haver problemas" nas avaliações e na lecionação de conteúdos, mas garante que "as escolas estão preparadas". Com o seu encerramento, a única solução passa por recorrer a aulas de recuperação, que decorrerão além do horário normal estabelecido para cada turma, e ir estimulando o estudo à distância durante a interrupção letiva.
Nesta equação, "vale lembrar que esta hipótese prevê a necessidade de ter computadores em casa e nem todos os alunos têm", lembra Filinto Lima, dirigente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas. Por isso, a não ser que a escola disponibilize ferramentas de trabalho aos alunos, não será uma opção viável para todos os estabelecimentos escolares. Sobre este tema, a tutela garante que "está em preparação um conjunto de orientações para coadjuvar o trabalho pedagógico das escolas durante a suspensão das atividades letivas presenciais" e que "permanecerá em contacto regular com as escolas".
Um problema que se estende ao ensino superior e representará "um desafio ainda maior" para os institutos politécnicos (tradicionalmente mais práticos) e os cursos da área da saúde. Quem o diz é Pedro Dominguinhos, presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos. Ainda que elogie "a capacidade de resposta imediata dos docentes" para contribuir com soluções para os seus alunos, "poderá haver aqui situações às quais não será possível responder", admite. Entre elas, o caso destes alunos que não têm ferramentas para trabalhar a partir de casa e que, "agravando o cenário", dependem do ensino prático. "Não nego que será um desafio e que provavelmente implicará a extensão do calendário letivo", à semelhança do que já tinha admitido ao DN a Universidade do Porto.
Ainda a discussão ia no adro e já o debate era lançado pela ministra da Saúde: se as escolas forem obrigadas a encerrar, garantem refeições aos alunos que dependam estritamente da alimentação que ali fazem? Na quarta-feira, no Parlamento, Marta Temido lembrou que a decisão em Portugal dependeria desta discussão.
O Ministério da Educação comunicou nesta sexta-feira que o problema não ficaria sem solução: "O fornecimento de refeições escolares aos alunos com escalão A da ASE [ação social escolar] deve ser garantido, devendo cada escola, em conjunto com as autarquias e os prestadores de serviço, encontrar a forma mais eficaz e segura de assegurar a refeição."
Portugal está em estado de alerta até 9 de abril. Escolas, lares, discotecas vão fechar, a lotação dos restaurante e dos centros comerciais serão limitadas e muitos trabalhadores ficam a trabalhar a partir de casa. As autoridades de saúde reafirmam: é importante evitar ao máximo atividades desnecessárias, manter a distância social, cumprir as boas práticas de higiene (lavar as mãos, tossir ou espirrar para o cotovelo) e em caso de manifestação de sintomas (febre, tosse, dificuldade respiratória, fadiga) ligue para a linha SNS 24 (808 24 24 24).
Embora a Constituição Portuguesa não preveja esta figura, o artigo 34.º da nova Lei de Bases da Saúde contempla a possibilidade de serem decretadas medidas de isolamento e o Plano Nacional de Contingência admite o "isolamento coercivo" em "situações extremas" de recusa. Em quarentena devem ficar os doentes com covid-19, quem esteve em contacto com casos confirmados e pessoas que viajaram para países onde exista transmissão atida na comunidade (no caso da Europa: Itália, Suíça, Espanha, Alemanha, França).
Estes cidadãos não devem sair de casa nem receber visitas. Se precisarem de comida devem encomendar nos supermercados online ou pedir a alguém que deixe à sua porta. Nesta situação, o ideal é que se mantenha o mais afastado possível das outras pessoas que vivem na casa, desinfete bem todas as divisões, superfícies ou objetos que utilize e mantenha a habitação o mais arejada possível. Quem desrespeitar a indicação de quarentena pode incorrer num crime de propagação da doença, com uma pena de prisão que chega a cinco anos, de acordo com o Código Penal.
Em isolamento social profilático voluntário devem ficar todas as pessoas que possam ter estado em contacto com alguém que esteve num meio onde o novo coronavírus foi detetado. Por exemplo, o pai de um aluno que tenha um colega de escola infetado. Esta situação também requer a permanência no domicílio com restrições de visitas e atenção redobrada às medidas de higiene.
O Plano Nacional de Preparação e Resposta à doença menciona que a duração deste isolamento deve ser de 14 dias, podendo variar à medida que exista mais informação sobre o período de incubação e da contagiosidade do vírus. Para os funcionários públicos, o isolamento não implica perda de retribuição salarial, apenas o pagamento do subsídio de alimentação, anunciou, nesta sexta-feira, a ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública. Já os trabalhadores por conta de outrem que tenham de ficar em casa a acompanhar os filhos até aos 12 anos recebem 66% da remuneração-base (33% a cargo do empregador, 33% a cargo da Segurança Social).
Conhecendo ou não alguém que tenha ou possa ter covid-19, evitar a propagação da pandemia é um trabalho que diz respeito a todos. A ministra da Saúde, Marta Temido, tem pedido a todos os portugueses que evitem as atividades que não sejam fundamentais. A maioria dos eventos desportivos, culturais e conferências foram cancelados e os espaços públicos limitados, como cafés, restaurantes, centros comerciais. Também as viagens estão desaconselhadas, principalmente para os países com o maior número de casos, como a China, a Itália, o Irão ou a Coreia do Sul.
No dia-a-dia, evite o contacto próximo com as outras pessoas, mantendo-se no mínimo a um metro de distância, respeite as medidas de etiqueta respiratória (quando espirrar ou tossir tape o nariz e a boca com o cotovelo ou com um lenço de papel e deite-o no lixo de imediato), lave frequentemente as mãos com água e sabão ou com uma solução à base de álcool (durante 20 segundos), não toque na cara e evite partilhar objetos pessoais.
O uso de máscara, em Portugal, não está recomendado a não ser para os suspeitos de infeção e para os profissionais de saúde que tratem destes doentes. Caso comece a manifestar sintomas de infeção (febre, tosse, dificuldades respiratórias, fadiga), contacte as autoridades de saúde através da linha SNS24 (808 24 24 24), em vez de se dirigir diretamente aos serviços de saúde, evitando assim a propagação da pandemia. Mantenha-se informado sobre novas indicações através da comunicação social e dos canais oficiais da Direção-Geral da Saúde, do portal do Serviço Nacional de Saúde, do governo e da Organização Mundial da Saúde.