O briefing diário está marcado para as 09.45, como habitualmente. Manuel Magina da Silva, o diretor nacional da PSP, chega, à civil, num passo apressado. Nessa manhã já tinha estado em antena na Rádio Renascença a explicar todo o incansável trabalho que os seus polícias têm vindo a fazer na prevenção da covid-19. Lança-nos um esquivo bom-dia e entra na sala onde já o esperam dirigentes de várias unidades daquela força de segurança..Estamos numa das divisões do Centro de Comando e Controlo Estratégico (CCCE), no coração do quartel-general da PSP, em Lisboa, uma espécie de big brother que acompanha, em tempo real, todas as situações de suspeita de crime que vão sendo registadas nos comandos de todo o país. Funciona 24 horas por dia e está ligado com os centros de operações de GNR, Polícia Judiciária (PJ), Proteção Civil e INEM..As "portas" abertas pela primeira vez à comunicação social, garante a PSP, levam-nos aos bastidores desta polícia, numa visita guiada pelo superintendente Luís Elias, diretor do Departamento de Operações, um oficial da nova geração licenciada no Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna, doutorado na Universidade Nova..Todas as manhãs, com a presença do diretor nacional e dos três diretores nacionais adjuntos, é feita uma ligação em direto com os 22 comandos da PSP, incluindo Açores e Madeira, em que cada responsável faz uma breve síntese dos principais acontecimentos das últimas 24 horas. A sala está meio vazia, apenas com cerca de metade dos lugares ocupados, devido às medidas de contingência contra a propagação do novo coronavírus. Todos usam máscaras ou viseiras..Em tom resoluto, Magina da Silva ordena que se dê início ao briefing e o oficial responsável vai fazendo a ligação aos comandos. Detenções, acidentes, crimes vão sendo debitados a velocidade cruzeiro e há uma referência especial para os "distúrbios" relacionados com um grupo de refugiados na Rua Andrade Corvo, que, relata o oficial, foram depois encaminhados para instalações da Marinha..Uma sala top secret com "ocorrências" em tempo real.Não nos é autorizado a permanecer mais tempo naquela reunião e passamos para aquele que é o epicentro deste Centro de Comando e Controlo Estratégico - a sala de situação. Trata-se de uma zona classificada como "área de segurança 1", onde só é permitida a entrada a pessoal com credenciais de segurança a partir de confidencial (há ainda o nível de secreto e muito secreto)..Uma das paredes está totalmente coberta por um ecrã gigante, dividido em várias áreas de interesse. Dum lado vai correndo a lista de "ocorrências" - a terminologia policial para incidentes, acidentes e crimes. A partir do momento em que a PSP é informada sobre alguma destas situações e são destacados meios para o terreno, é feito um registo nos terminais informáticos, em qualquer ponto do país, que surgem, em tempo real, neste quadro dinâmico e em permanente atualização..É aqui que são feitas as "fitas de tempo" de todas as situações que exigiram a presença da PSP e, em especial, dos eventos mais sensíveis ou incidentes mais graves..Cada caso é "pontuado" com bolinhas verdes, amarelas e vermelhas, de acordo com o grau de gravidade. Violência doméstica, ameaça de bomba, manifestações, desordem, vandalismo, remoção de cadáver, furtos, roubos, detenções, acidentes de viação, são alguns dos registos que vamos observando - e que parecem, à primeira vista, preocupantes..Mas a avaliação da PSP tem em conta a gestão de meios e a resolução das ditas "ocorrências" e, naquele momento (sexta-feira passada), a maioria tinha à sua frente uma bolinha verde. Algumas, poucas, estavam destacadas a amarelo..Era o caso de um homem que tinha tentado entrar num comboio, em São João do Estoril, sem máscara. Um clique naquele registo e abre-se a "fita de tempo": horas, meios no local, agentes envolvidos e desfecho, neste caso o indivíduo acabou por abandonar o local..Os drones em direto.Sempre que são acionados os drones da PSP, como já aconteceu em alguns locais durante o estado de emergência, as imagens são também projetadas em direto neste ecrã gigante.."Os drones com câmaras acopladas são uma ferramenta fundamental na tomada de decisão. Permitem uma visualização em direto e ampla dos acontecimentos e antecipar possíveis incidentes", frisa Luís Elias. Durante o estado de emergência foram utilizados "para prevenção de aglomerações de pessoas e para a monitorização dos fluxos viários", acrescenta o superintendente. Durante o estado de calamidade até àquele dia ainda não tinham sido necessários..Luís Elias mencionou ainda que "a PSP tem procedimentos muito exigentes quanto à proteção de dados e respeito pelos direitos, liberdades e garantias", existindo "protocolos rigorosos no que respeita à utilização de drones que implicam a identificação do local, data de início e de fim da operação, das coordenadas, da altura mínima do sobrevoo e do fim específico a que se destinam, com vista a solicitar autorização formal ao Ministério da Administração Interna (MAI)". Adiantou ainda que e "após autorização do MAI, a PSP comunica sempre previamente estas operações com veículos aéreos não tripulados à Autoridade Aeronáutica Nacional (Força Aérea) e à ANAC"..Na pista do transporte de explosivos.Noutra ponta do quadro eletrónico há um mapa de Portugal, onde estão assinalados vários pontos iluminados e em movimento..Trata-se de um novo sistema que monitoriza e acompanha, em tempo real, todos os transportes de explosivos, para efeitos comerciais e industriais, que estão a ser feitos no país. São monitorizados no CCCE por polícias do departamento de armas e explosivos da PSP..Um clique em qualquer daqueles pontos e surge no ecrã toda a informação relacionada com esse transporte de explosivos: empresa, motorista, origem, destino e características da carga. Há cerca de 30 a 40 transportes diários desta natureza. "Têm um GPS ligado em permanência, e se houver algum desvio na rota ou paragem não prevista, toca aqui um alarme", explica o comissário David Pereira, que chefia o CCCE..A este Centro de Controlo chegam também os alarmes dos táxis ou das farmácias que estão associados aos programas Táxi Seguro e Farmácia Segura, respetivamente..Há ainda televisores ligados a canais de notícias. "Acabam por ser também as nossas câmaras. A mediatização serve também para chamar atenção das autoridades locais. Embora a maior parte das vezes a informação nos chegue primeiro, acaba por ser também um complemento para a nossa avaliação", diz este responsável..Páscoa e 1.º de Maio, dias a fervilhar.Também esta sala tem vários lugares vazios. "Uma das medidas que tomámos cedo, no âmbito dos planos de contingência, foi a de criar um sistema em espelho para que as nossas equipas ficassem divididas para garantir a capacidade operacional, caso houvesse algum caso de contágio pelo novo coronavírus", sublinha o mesmo oficial responsável. A PSP tem, até esta semana, 52 polícias infetados e 171 em isolamento, tendo 114 já recuperado da covid-19..Nesta sala de situação estão normalmente presentes, como estavam nesse dia, representantes do departamento de armas e explosivos, das operações e da investigação criminal. Fazem turnos de 12 horas seguidas e vão rodando com a restante equipa.."Nos casos mais complexos temos todas as valências ativas para apoiar as decisões e todo um sistema de informações policiais para pesquisar suspeitos e cruzar dados dos crimes (o Sistema Estratégico de Informações, SEI, uma poderosa base de dados criminais da PSP). É um trabalho em rede, de coordenação entre todos os que estão aqui e quem está no terreno", assinala o comissário..Há dias em que aquele centro fervilha de ação, como foi no fim de semana da Páscoa - no início do estado de emergência -, com milhares de pessoas a tentar sair das cidades e a deparar-se com as operações stop da PSP. Todas estas intervenções eram captadas e acompanhadas a partir do CCCE..Outro momento alto de atividade que a PSP reconhece é o 1.º de Maio, em que a CGTP organizou manifestações em 21 cidades do país. Luís Elias, que é doutorado em Ciência Política, não tem problemas em preservar a PSP da polémica e das críticas associadas a esta data: "A PSP aplica a lei, não discute política. A CGTP cumpriu integralmente o que ficou previamente definido nas reuniões que foram realizadas entre nós e os dirigentes sindicais responsáveis." E não há outros comentários..Luís Elias é um operacional com a doutrina bem estudada. Explica que na PSP estão instituídos "três níveis de comando e controlo: estratégico, operacional e tático" e que o CCCE (nível estratégico) está no seu full power quando o diretor nacional determina que todos estejam ativados, como pode acontecer em "grandes eventos ou incidentes tático-policiais graves". Nestes casos, quando se trata de ocorrências mais complexas ou de risco mais elevado, é envolvido o comando territorial competente (nível operacional) e é instalado um "posto de comando tático" junto à ocorrência. "Todos os comandos metropolitanos, regionais e distritais da PSP têm um Centro de Comando e Controlo de nível tático", afirma..O superintendente refere que "numa situação em que seja acionado o nível estratégico, integram também o CCCE o departamento de informações policiais, o departamento de sistemas de informação e comunicações e o departamento de segurança privada, entre outros"..Trabalho exaustivo e invisível.A pandemia veio acrescentar novas preocupações e novas "ocorrências" à lista que vai piscando no quadro eletrónico ligado 24 horas por dia. Além das ações de prevenção e fiscalização, são os agentes das divisões de investigação criminal que fazem a monitorização dos infetados com a covid-19. "Vão às moradas e verificam se estão mesmo em casa ou localizam-nos. É um trabalho exaustivo, invisível, de extrema importância", afirma Luís Elias..Durante o estado de emergência, a PSP deteve 266 pessoas por crime de desobediência, das quais 87 eram cidadãos sujeitos a medida de confinamento - uma média de seis detenções por dia.A PSP deu uma atenção especial aos crimes de violência doméstica e deteve 73 suspeitos durante este período, a maioria em flagrante delito. Uma média de duas detenções por dia por crimes de violência doméstica. Foram realizadas 3472 operações de prevenção e sensibilizadas a ir para casa mais de meio milhão de pessoas (524 442), das quais 98 100 idosos. Houve 17 361 ações de fiscalização em estabelecimentos..Já no estado de calamidade, desde 3 de maio até esta quarta-feira, 13 de maio, a PSP deteve 18 suspeitos por violência doméstica..Nestes dez dias foram ainda detidas dez pessoas infetadas sujeitas a confinamento obrigatório. Foram realizadas 2399 ações de fiscalização de estabelecimentos, tendo sido encerrados 76..A PSP fez ainda 1570 ações de controlo em transportes públicos, levantou 40 autos de contraordenação por falta de uso obrigatório de viseiras ou máscaras, que prevê uma multa de 120 a 350 euros. Elaborou ainda outros 43 autos de contraordenação por falta de uso desses equipamentos em espaços fechados.."Achamos que a PSP contribui para um clima de confiança e maior tranquilidade da população, com a sua estratégia de forte presença nas ruas e postura pedagógica, sem atitudes persecutórias. É fundamental", conclui o diretor de operações.