Presidente, Parlamento e governo: quem substitui quem?
Marcelo Rebelo de Sousa vai passar as próximas duas semanas em isolamento voluntário, mas mantendo-se no desempenho das suas funções. "Tendo ouvido as autoridades de saúde, o Presidente da República, apesar de não apresentar qualquer sintoma virótico, decidiu cancelar toda a sua atividade pública, que compreendia várias presenças com número elevado de portugueses, assim como a própria ida a Belém, durante as próximas duas semanas", anunciou a Presidência da República no último domingo, acrescentando que o Chefe do Estado será "monitorizado durante esse período em casa". "Entende o Presidente da República que deve dar exemplo reforçado de prevenção, sem embargo de continuar a trabalhar na sua residência particular", sublinhava ainda a mesma nota. Nesta segunda-feira, a Presidência deu conta de que o teste efetuado ao Presidente deu negativo, mas que Marcelo Rebelo de Sousa continuará a trabalhar em casa até perfazer as duas semanas de isolamento.
Mas e se não fosse assim? O que fariam as várias instituições políticas portuguesas em caso de impedimento temporário dos mais altos titulares de órgãos do Estado?
No caso do Presidente da República, este cenário é regulado pela Constituição, que estabelece que durante o impedimento temporário do Chefe do Estado "assumirá as funções o presidente da Assembleia da República ou, no impedimento deste, o seu substituto" (que seria um vice-presidente).
A Constituição acrescenta que, durante o impedimento temporário, o Presidente da República "mantém os direitos e as regalias inerentes à sua função".
Já o Presidente da República interino não assume em pleno as funções presidenciais - não pode dissolver a Assembleia da República, não pode nomear novos membros para o Conselho de Estado ou para o Conselho Superior da Magistratura, não pode convocar referendos. E, para a generalidade dos restantes atos - mesmo para promulgar leis, por exemplo -, tem de ouvir primeiro o Conselho de Estado.
Já o presidente da Assembleia da República, segunda figura na hierarquia do Estado, logo a seguir ao Presidente, é substituído nas suas faltas ou impedimentos por um dos vice-presidentes do Parlamento. De acordo com o regimento da Assembleia, em "caso de doença, impedimento oficial de duração superior a sete dias ou ausência no estrangeiro", o presidente da Assembleia é substituído pelo vice-presidente pertencente ao mesmo grupo parlamentar (no caso, seria Edite Estrela) ou outro que o líder do Parlamento designar. Nesta legislatura são vice-presidentes o social-democrata Fernando Negrão, José Manuel Pureza (pelo Bloco de Esquerda) e António Filipe (PCP).
Na Assembleia da República está já em vigor o plano de contingência contra o covid-19, que prevê a criação de um "gabinete de gestão", que fica responsável pelos procedimentos a adotar perante eventuais casos que venham a surgir. Entre as medidas postas em cima da mesa conta-se a suspensão de visitas guiadas ao Palácio de São Bento, a suspensão da entrada de grupos de visitantes ou a imposição do trabalho à distância aos funcionários parlamentares.
Já quanto a medidas referentes aos deputados ou ao funcionamento dos trabalhos parlamentares, essa decisão terá sempre de passar pelo presidente da Assembleia da República, que pode - por iniciativa própria ou por proposta do gabinete de gestão e após ouvida a Conferência de Líderes - determinar a "definição de medidas adicionais". Que podem reportar-se ao "funcionamento do plenário, comissões parlamentares" ou a deslocações oficiais dos deputados.
De acordo com a Constituição, não havendo vice-primeiro-ministro (e não há), o líder do executivo é substituído, na sua ausência ou impedimento, pelo ministro que indicar ao Presidente da República ou, na falta de tal indicação, pelo ministro que for designado pelo Chefe do Estado.
Já a lei orgânica do governo estabelece que o líder do executivo é substituído, nas suas ausências e impedimentos, pelo ministro que se segue na hierarquia, numa ordem pré-designada, a começar pelos quatro ministros do Estado - o da Economia, Pedro Siza Vieira; o dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva; a ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva; e Mário Centeno, ministro das Finanças.
Se todos estes ministros estivessem impedidos, por alguma razão, seguir-se-iam o ministro da Defesa, da Administração Interna e da Justiça.
Mas esta não é uma hierarquia rígida, dado que a lei dá ao primeiro-ministro a prerrogativa de escolher qualquer membro do executivo, bastando a comunicação ao Presidente da República para efetivar a substituição temporária.
Quanto ao Conselho de Ministros, que semanalmente junta todo o executivo, não há por agora indicações de qualquer mudança na agenda, de acordo com o gabinete da ministra da Presidência.