Recentemente, o presidente de França, Emmanuel Macron, referiu que, com a saída do Reino Unido, a Polónia podia estar mais presente na liderança da União Europeia [UE]. Isto é um grande desafio para a Polónia? Concordo com essa opinião..Quando olhamos para a Polónia neste momento, e voltando à questão da saída do Reino Unido, percebemos que é um dos cinco grandes países em termos de população e de território. É possível ambicionar também uma Polónia que seja, um dia, a quinta grande potência económica, com toda a taxa de crescimento que tem tido? Esse é o nosso objetivo a atingir dentro da União Europeia, quanto ao desenvolvimento económico e quanto ao nível de vida da população. Se mantivermos o nosso atual crescimento, que é à volta dos 5% por ano, e que é superior ao das economias da UE, conseguimos atingir o nível da UE. Mas o papel da Polónia não vem só do tamanho, de ser um país grande, mas também do conceito que representa. A Polónia representa uma visão da UE presente na Europa Central e de Leste, representa os interesses desses países, uma Europa construída em cima de regras económicas saudáveis, uma Europa que se desenvolve, uma Europa aberta para os países vizinhos, para a colaboração transatlântica e para as relações com os Estados Unidos. Assim, imagino que o presidente Macron viu que se existir um entendimento, um acordo entre a França, a Polónia, que no fundo, representa outro grupo de países, e a Alemanha, poderemos ver, estipular, qual será o rumo de desenvolvimento da UE..Isso significa que estes anos mais recentes, em que tem havido grandes críticas à Polónia por parte dos restantes países da UE, podem ser ultrapassados, ou seja, imagina ser possível um compromisso entre os valores que a Polónia defende e os valores que uma parte substancial da UE exige à Polónia que cumpra? O conflito recente pode ser ultrapassado com novos compromissos? Está a falar de que tipo de críticas?.Das críticas que têm sido feitas sobre a Polónia estar a afastar-se dos valores europeus e a pôr em causa o Estado de direito, nomeadamente pela questão dos juízes e das mudanças na justiça. Essas críticas já existem há algum tempo e nós já estamos a resolvê-las com a Comissão Europeia e, também, com o Tribunal de Justiça. Tivemos de parar ou revogar algumas questões-alterações por causa dos pareceres do tribunal. Mas nós acreditamos que temos direito de reformar o sistema judicial que tem de ser eficaz para a sociedade e tem de respeitar o direito. É importante para o Estado de direito; isso também é importante para a população, para a sociedade. Essa foi também uma das bases do governo durante a campanha eleitoral e temos de cumprir o que prometemos. Eu analisei bem o que estamos a introduzir e todas essas soluções já existem noutros países da UE. O que é importante é que isso não é nenhum obstáculo nas nossas relações com os outros países, por exemplo com a Alemanha ou, nomeadamente, com a França, como vimos durante a visita do presidente Macron..Uma outra crítica que se fez nos últimos anos à Polónia e a alguns países, nomeadamente do Pacto de Visegrado, é também a recusa de aceitar as quotas de imigrantes, deixando que países como a Grécia, a Itália ou a Espanha enfrentem o problema quase sozinhos. Há também algumas novidades na atitude da Polónia em relação à questão da imigração? Sim, estamos a ver as novidades no que se refere à atitude, à perspetiva, da UE que começa a ver que aquilo sobre que estava a questionar a Polónia - não convidar com tanta facilidade os imigrantes - talvez seja uma boa ideia para não criar mecanismos que sejam depois um convite para mais e mais imigrantes. Nós estamos muito contentes com uma decisão que diz que, nessa questão das quotas, não há quotas obrigatórias para imigrantes e refugiados serem aceites. No entanto, nós estamos envolvidos em todo esse problema, achamos que é importante ajudar no Médio Oriente, em África ou na proteção das fronteiras. Nós temos vários programas de ajuda, quer na Síria, quer no Líbano, quer noutros países. Na Polónia temos a sede da agência europeia FRONTEX e temos de a desenvolver; ela tem como objetivo a proteção das fronteiras. Também participamos na Operação Sophia no mar Mediterrâneo; também estamos contentes por ter sido referido e visto que a Polónia é o país que aceita maior número de imigrantes de fora da UE. A maioria vem dos países da antiga União Soviética, a maior parte da Ucrânia, e temos mais de um milhão dessas pessoas; muitos vêm também das regiões onde existem ações militares e de guerra, como o Donbas..Apesar destes choques recentes entre a Polónia e a União Europeia, o sentimento europeísta continua muito forte na população polaca? Eu não chamaria choques a isso. A população polaca é a população mais pró-europeia de todas - mais de 80% dos polacos estão a favor da integração na UE e sentem-se satisfeitos por pertencer à Europa. Nós temos um espírito pró-europeu, somos dos mais pró-europeus e estamos satisfeitos por estarmos na UE e também contribuímos muito para o desenvolvimento da Europa. Graças ao nosso tão grande desenvolvimento económico, a Polónia está a contribuir bem para o desenvolvimento da UE e está a chegar ao nível dos outros países..De qualquer forma, não está nos planos próximos do governo da Polónia voltar ao processo de integração no euro. A Polónia, para já, vai manter a sua moeda? Sim, temos a nossa moeda e achamos que foi muito positivo mantê-la, pois graças a isso conseguimos evitar a crise europeia. Certos especialistas da economia acham que deveria haver ainda mais desenvolvimento para chegarmos a uma média da UE, para fazer sentido entrarmos na moeda única europeia. Por outras palavras, sim, é o nosso objetivo no futuro, no entanto, neste momento, segundo os critérios e segundo os objetivos atuais, isso não seria possível..Falando agora um pouco da NATO - a Polónia é um dos países mais empenhados na NATO, é um dos países que cumprem a fasquia dos 2% do PIB em termos de despesas militares. A Polónia está preocupada com as divisões que existem neste momento na aliança atlântica? Por exemplo, falámos há pouco do presidente Macron e ele, há uns meses, chegou a fazer uma crítica muito forte dizendo que a NATO estava em morte cerebral. O futuro da NATO é muito importante para a Polónia? Sim, nós somos membros da NATO e achamos isso muito importante, devido à garantia de segurança que nos dá fazermos parte dessa aliança e, sobretudo também, os Estados Unidos fazerem parte dela. Isso é muito eficaz para afastar o possível perigo que vem mais de leste, do oriente, sobretudo por parte da Rússia. Também estamos muito satisfeitos com a modernização das forças da NATO e, também, com os encontros no País de Gales, em Varsóvia e em Bruxelas, onde foi tomada a decisão da presença militar como a reação para as atividades da Rússia. Temos as nossas forças também na Letónia e na Roménia, mais a leste, e temos de nos apoiar aí, de cooperar, e conseguiremos a solidariedade de outros países. Estamos de acordo com os Estados Unidos, as suas forças militares estão presentes no nosso território e, segundo o último acordo, esse número vai crescer até aos 5500. Também estamos contentes com a presença dos militares portugueses no policiamento aéreo do nosso território..Quando se vê as preocupações da Polónia em relação a uma ameaça da Rússia, a dúvida que há em Portugal é se a Polónia sente essa ameaça por causa da memória histórica ou se essa ameaça é mesmo real ainda hoje em dia. Não, não é só a história, são mesmo as atividades atuais da Rússia. Lembramos a agressão por parte da Rússia para com a Geórgia em 2008; a anexação da Crimeia em 2014; as atuais ações militares em Donbas. Portanto, isso continua e está presente. A Rússia está presente no conflito na Síria, na Líbia, na Venezuela, na África Central e, isso, contra os interesses internacionais ou da UE. A Rússia também tenta dividir o Ocidente com ações de desinformação que, depois, a UE tem de observar ou desmentir. Assim, nós como NATO, ou como UE, não podemos mostrar nenhuma fraqueza, nenhum ponto fraco, porque depois a Rússia vai querer aproveitar-se disso. Por outras palavras, nós apoiamos a independência da Ucrânia e esperamos, ou exigimos, que a Rússia volte para o caminho de respeitar o direito internacional..O último choque que houve entre a Polónia e a Rússia foi devido à recente cerimónia da celebração dos 75 anos da libertação de Auschwitz, em que a Polónia decidiu não estar presente em Jerusalém. Qual é a sensibilidade da Polónia em tudo o que tem que ver com a Segunda Guerra Mundial e a questão de Auschwitz? Sei que a diplomacia polaca é muito ativa sempre que alguém, em vez de dizer ou escrever um campo de concentração nazi alemão na Polónia ocupada para se referir a Auschwitz diz um campo de concentração polaco, e imediatamente as embaixadas exigem a justa correção. Este choque que houve agora com a Rússia tem muito que ver com o que foi a Segunda Guerra Mundial na Polónia? É verdade que a Rússia atacou dessa forma. Não é um ataque para a Polónia, mas nós vimos que Putin tentou interpretar a história, não é bem uma discordância com a Polónia, mas sim com a verdade histórica. Ele quer mostrar a história de outra forma, não fala sobre o pacto Ribbentrop-Molotov, evita o facto de a Rússia, juntamente com a Alemanha, ter atacado a Polónia e isso ter sido o início da Segunda Guerra Mundial. Tenta encontrar a ligação de alguns anos antes ter havido alguns acontecimentos entre a Polónia e a Alemanha e essas coisas não têm nada que ver com os factos reais, mas Putin não teve sucesso com isto, porque na arena internacional a sua versão da história não foi aceite. O Holocausto é, com certeza, um assunto muito importante para nós, porque durante a Segunda Guerra Mundial morreram seis milhões de polacos, dos quais três milhões eram judeus. Essas celebrações são sempre importantes, têm o seu lugar em Auschwitz e neste ano também assim foi. Elas têm uma natureza apolítica para realçar a importância das pessoas que sobreviveram e mostrar isso às futuras gerações. Neste ano houve uma celebração mais política em Yad Vashem que foi organizada de forma privada por um oligarca russo, onde Putin tinha um lugar muito importante. Foi uma politização e nós não apoiamos esse tipo de politização desses acontecimentos e, por isso, o nosso presidente não esteve presente. Depois, o Yad Vashem pediu desculpa porque alguns dos materiais mostrados nessa celebração não tinham que ver com a verdade histórica e apoiavam a versão russa da história. Por exemplo, foi mostrado um vídeo nessa celebração, onde as fronteiras entre os países não estavam corretas. Nós aceitámos as desculpas de Yad Vashem porque percebemos que essas questões históricas não deveriam ser utilizadas para criar mais desentendimentos hoje em dia. Uma coisa que eu queria aqui sublinhar é que nós aqui estamos a defender a verdade histórica, não é um conflito entre a Polónia e outros, é uma verdade histórica que todos devíamos defender..Na Polónia, caso de sucesso económico pós-comunista, há uma comunidade portuguesa numerosa; também há investimentos portugueses na Polónia na área da grande distribuição e dos bancos. A relação entre a Polónia e Portugal é mais forte do que faria supor a distância geográfica? Sim, nós estamos muito satisfeitos também com esses investimentos que, no nosso país, são muito dinâmicos. É também muito dinâmico o intercâmbio comercial, já sabemos que atinge um valor de dois mil milhões por ano, o que significa que duplicou em sete anos. Também são muito importantes os contactos entre as nossas sociedades, as nossas populações, e os portugueses têm muito boa fama na Polónia. Todos os anos temos mais de 1500 estudantes de Erasmus aqui e 500 investigadores científicos; mais de mil estudantes portugueses estudam na Polónia; 300 mil turistas polacos vêm a Portugal todos os anos e de Portugal para a Polónia vão 30 mil. São números grandes. Portanto, as sociedades conhecem-se. Nós também apreciamos a cultura portuguesa e a língua é ensinada em várias universidades polacas. Também são importantes os nossos contactos e os que nós defendemos na UE - ainda há poucos dias tivemos aqui a cimeira em Beja -, pois temos interesses comuns. Queremos juntos a política de coesão, queremos a política agrícola, queremos também que a UE cresça com os países balcânicos; os contactos transatlânticos também são importantes. Portanto, esses interesses comuns dão uma boa perspetiva de colaboração..Portugal, que é um aliado tradicional do Reino Unido e que tem lá uma grande comunidade, esteve sempre muito preocupado com o impacto do Brexit. A Polónia, que também é um aliado tradicional do Reino Unido, tem lá também uma grande comunidade de cidadãos polacos. Houve algum problema ou as coisas também estão a resolver-se positivamente do ponto de vista da Polónia? É outra área de interesses em comum que temos. Para ambos os países é muito importante a relação com o Reino Unido, também devido às duas comunidades de imigrantes. Nós temos mais de um milhão de polacos que vivem no Reino Unido. Queremos que os seus direitos sejam respeitados e também queremos que as relações futuras sejam bem negociadas e com bons acordos. Portanto, juntos vamos tentar. Falei com o ministro Santos Silva e os dois países juntos vão tentar que essa questão seja regularizada da melhor forma para ambos..Ou seja, os dois países podem ter uma posição muito próxima na questão da negociação com o Reino Unido depois do Brexit? Sem dúvida.