"Estamos a contar que o negócio melhore bastante. A loja [no cais do Seixalinho, de onde parte o catamarã para o Cais do Sodré] está um bocadinho afastada do Montijo e, com o novo aeroporto, espero que isto comece a ter mais gente." A expectativa é expressa por Maria Freire, 40 anos, funcionária da Flor do Cais, comércio de flores e plantas e que na vitrina ostenta o slogan: "Montijo, a capital da Flor". "É verdade, é a capital da flor por causa das estufas, a Madeira tem muitas flores mas não tem produção. A nossa empresa é a Florineve - Produção e Comercialização de Flores - e fornece três floristas no Funchal, todas as semanas mandamos flores para lá", explica a mulher. A empresa para a qual trabalha funciona há 25 anos e é apenas uma entre muitas que partilham a ideia de que o novo aeroporto poderá trazer mais negócio para quem opera nesta cidade da margem sul do Tejo..Modernizar a cidade.O projeto de construção no novo aeroporto, cujo acordo entre o Estado e a ANA é assinado nesta terça-feira, prevê o alargamento da pista de aterragem da Base Aérea n.º 6, bem como a construção de infraestruturas e de acessos às vias rápidas, nomeadamente à Ponte Vasco da Gama, mantendo-se parte do tráfego militar. Será também lançada uma nova ligação fluvial entre o terminal de passageiros e Lisboa. O novo aeroporto, em conjugação com o da Portela, permitirá que o número de passageiros a chegar por ano a Lisboa possa subir até aos 50 milhões..Números que entusiasmam os comerciantes locais, embora queiram ter mais certezas quanto às futuras instalações, com início das obras de construção anunciadas para este ano. "O acordo vai ser assinado mas ainda falta o estudo do impacto ambientei", alerta Antónia Caldeira, 52 anos, subdiretora do Tryp Montijo Parque Hotel. O final de março é a data prevista para a conclusão dessa avaliação..O Tryp é o único hotel na cidade, que tem mais dois motéis e três residenciais, e, segundo a autarquia, espera seis novas unidades hoteleiras. Logo que foi confirmada a escolha do local para o novo aeroporto, os proprietários da unidade do Montijo, com mais de 20 anos, decidiram aumentar a atual oferta de 84 quartos para 134. Os 50 quartos serão construídos no terreno ao lado do edifício atual. "Ainda não sabemos quando vamos arrancar com as obras, estamos na expectativa de ver o início da construção do novo aeroporto para avançar", explica Antónia..A unidade hoteleira registou uma taxa de ocupação de 89% em 2018, o que é reflexo do aumento da procura turística na capital. "O turismo que temos é o que vem para Lisboa e que se desloca para o Montijo devido à compensação monetária." Basta dizer que a diária de 60/70 euros é sensivelmente metade do que cobra a mesma cadeia, também de quatro estrelas, junto ao Aeroporto Humberto Delgado..Os clientes chegam e partem do Montijo em autocarros, para dormir depois das excursões: chineses, japoneses e coreanos ficam uma ou duas noites; os franceses, duas a três; e os espanhóis, seis noites. Esperam aumentar a ocupação e, talvez, os preços. O maior problema para a hotelaria será o recrutamento de mão-de-obra qualificada, uma vez que a subdiretora do Tryp diz haver escassez no concelho..Positivas são, também, as expectativas de Johnny Diamond, que com a mulher, Maria Elisa, as filhas Mónica e Ângela, a sogra, Margarida, e a sobrinha Ana abriu O Barriga Cheia em 2012. Um restaurante de grelhados de carne na Rua do Diário de Notícias, no centro de Samouco (Alcochete), que só tem almoços. Servem entre 80 e cem refeições por dia, de segunda a sábado..Barulho.Não se queixam de falta de clientes e, para já, não pensam em ampliar as instalações, que são pequenas. Estimam que os novos clientes irão compensar os que trabalham na base aérea e que poderão de mudar de local. Acreditam que o novo aeroporto trará melhorias à freguesia, nomeadamente a nível dos transportes, das infraestruturas, dos cuidados de saúde e da segurança..E até o barulho com o aumento do tráfego aéreo é desvalorizado pela família Diamond. Calculam que os aviões vão aterrar do lado oposto à vila do Samouco..Os quilómetros da Base Aérea do Montijo ocupam terrenos dos concelhos de Montijo e Alcochete - a atual entrada é pelo Samouco - e vão até ao rio Tejo. Tem instalações, pista de aterragem, parques de estacionamento, pinheiros e, já do lado de fora, estufas, estaleiros, também habitações em terrenos que irão receber obras para novas infraestruturas que vão servir o aeroporto.."Quem tem algum terreno pode lucrar. Eu tenho um terreno, mas não sei. Quando foi da construção da Ponte Vasco da Gama, os meus pais foram expropriados e receberam dinheiro, mas agora o dinheiro não rende nada no banco", queixa-se Rui Vespeira, 58 anos, reformado. Mora perto da base aérea e não dá carta-branca à nova estrutura: "Pode ser bom, pode ser mau, mas muito bom não deve ser. Agora, são alguns aviões, mas com um aeroporto comercial vão aterrar de noite e de dia.".Fátima Figueiras, 48 anos, não gosta de aviões e muito menos do barulho. "Não gosto, é um sofrimento. E também tenho medo de uma coisa, o estuário do Tejo fica perto, há aves de muitas espécies. Já viu se há algum acidente por causa das aves?".E nem a perspetiva da estrutura trazer emprego a faz conciliar com a ideia de ter mais aviões a aterrar e a descolar onde reside. "Eu, com a minha idade, quem me quer?" Resta dizer que trabalha numa unidade de cortiça no norte, em Lourosa, porque encerrou a unidade de Alcochete. "Trabalho na fábrica desde os meus 17 anos, quando fechou estive um ano no desemprego e, depois, o patrão chamou-me a mim e a outros dois colegas." Agora, vem ao Samouco todos os 15 dias..Maurício Daroeira, 49 anos, foi camionista, comercial e é pescador desde 2007, ano em que o pai passou o negócio aos filhos. Não as vejo muito satisfeitas, quem tem comércio ou terrenos para vender é capaz de estar satisfeito, para o resto das pessoas não trará grandes melhorias", diz. No seu caso, pensa que não tem benefícios, mas também não tem prejuízos, nem tem medo do impacto negativo na pesca. "Pesco no rio, se houvesse problemas já haveria com a base aérea. Sinceramente, para mim, acho que não vai mudar nada."